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No fim de tudo, apenas fica em nós a imensa sensação de tristeza que nos aflige, por não sabermos explicar porque acontecem essas coisas que nos estão a acontecer.

Os últimos dias foram propícios à realização de tarefas caseiras. Na falta inesperada da internet e, por inerência, da televisão, tenho evitado tudo o que me possa perturbar. Passo os dias sem saber de política nem de futebol e isso leva-me, surpreendentemente, a um estado de espírito tranquilo e sadio. Estava eu nesta rotina, a desfazer-me de papelada velha, sem serventia, como de outras inutilidades, quando dei de caras com uma coisa antiga. A página 2 do Jornal de Angola, edição de 10 de julho de 1993.
Amarelecida pelo tempo e sob o título “A ocupação zairense”, lá estava estampada uma matéria assinada pelo consagrado escritor e cronista Arnaldo Santos, ocupando a sua então regular e muito apreciada “Crónica em cursivinho de Cid Adão”. Malhava forte e feio em Jonas Savimbi e na sua sombria aliança com Mobutu Sese Seko. Acerca do ditador zairense, Arnaldo Santos referia no seu texto: “Nos últimos estertores é que as feras são mais perigosas. Tendo perdido o apoio do povo e das classes políticas, sobra-lhe a sua imensa fortuna e um exército. Não são, naturalmente, argumentos irrisórios. E muito menos nas mãos de um homem como ele, sem escrúpulos.
Impossível não lembrar a nossa desdita. E que já tinham passado mais de trinta anos sobre estes factos, mais de três décadas que nos foram mostrando o quanto o tempo é inexorável. Mobutu e Savimbi partiram do modo que sabemos. Nesse período, falharam também, muitos dos vaticínios de mestre Arnaldo Santos e de grande parte de nós. Foi-se a crença de grande parte dos cidadãos angolanos, afinal de contas, todos nos enganamos.
Enquanto as riquezas e as tentações de Mobutu descambaram, tal como desabaram as manigâncias de outros da sua igualha, passaram a ver-se em plena engorda, as fortunas que encheram e enchem ainda bolsas sôfregas e cofres controlados por uma plêiade privilegiada.
Entretanto, e não obstante os ventos que sacodem violentamente o mundo, nós os outros, por cá, vamo-nos aguentando como podemos. Esquecendo-nos dos sonhos lindos, recordando apenas narrativas oleadas por intenções de bons auspícios. Desconfiando sempre dos notáveis mestres dessa matéria mentirosa, mormente dos académicos formados nos bastidores que suportam a gente de fora, aquela que conhece tudo do que é nosso e está por dentro das dinâmicas de desenvolvimento económico dos africanos. São mestres que, a meio das suas inalteradas tarefas, vão recomendado, “atenção, parceiros. O melhor para quem espera frutos é a paciência. É necessário aprimorar a resignação”!
Mas enquanto a espera longa se esgota todos os dias, inexplicavelmente, os frutos tardam a amadurecer e a chegar como alimento até nós. Nem para remediar, quanto mais para matar a fome do povo em geral!
E assim caminhando, cientes da certeza, cada vez mais firme, da efemeridade da vida e da realidade de todas as coisas ruins que nos acontecem, vamos olhando de esguelha para a gente que faz acontecer essas coisas sem razão de existirem, dando força a outras razões que levam a que tudo, ou quase tudo, ande assim, sem sentido, diante de estrondosas derrotas em campos que se julgavam vitoriosos. De resto e no fim de tudo, apenas fica em nós a imensa sensação de tristeza que nos aflige, por não sabermos explicar porque acontecem essas coisas que nos estão a acontecer.
Sendo tudo o que trago para hoje, apresento os melhores cumprimentos aos meus estimados leitores. Despeço-me de todos com o maior respeito e a amizade de sempre, formulando votos de saúde e paz. Meus amigos, até domingo próximo à hora do matabicho.
Fernão Ferro, Portugal, 29 de Junho de 2025
Muito obrigado pelo grande brinde todas as semanas. Paz e Bem!