E de novo, a Odebrecht é que está a dar!

O bicho papão que nunca passou fome, tem de novo o prato cheio para fazer a festança

Em 2023, a linha de crédito que o BNDES (Banco Nacional do Brasil de Desenvolvimento) disponibilizou para Angola totalizou USD 3,2 bilhões, representando 31% do total de crédito externo concedido pelo Brasil no período. Dos diversos contratos do BNDES em Angola, 90% foram para a Odebrecht. De 2005 a 2015, os contratos do sector público totalizaram USD 6.13 bilhões e também foram concedidos à Odebrecht, pelas autoridades angolanas.

Parece óbvio que, quem assume a presidência de um bloco político e económico (apesar de estar longe de ser também social) como é a SADC (Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral), que anda pelo mundo a tentar captar investimento estrangeiro, deveria ter assento de destaque e de peso na Cimeira dos BRICS, que está a decorrer aqui mesmo ao lado, na maior potência da região, a África do Sul. Até porque, nunca tivemos papel secundário na dinâmica da região. Parece-nos que, do ponto de vista diplomático, qualquer coisa não foi devidamente aquilatado, até porque José de Lima Massano, apesar de mandatado em representação do Chefe de Estado, não é o Chefe de Estado, nem essa condição lhe permite vestir qualquer fato da SADC àquele nível. Provavelmente, outras questões pesaram mais.

Aliás, a diplomacia é de facto uma grande arma e uma ciência, complexa sim, mas onde não existem portas fechadas e tem as suas bases de sustentação no diálogo, e não se deve fazer uso da política de cadeira vazia. E a diplomacia económica, constitui uma grande boia para ajudar (repito, ajudar) na saída da crise, sobretudo para quem se tornou pedinte, ainda que de luxo. É daquelas matérias na gestão do Estado que ou aprendes e sabes usá-la, ou não aprendes e ficas isolado. Ou perdes prestígio. Nós aprendemos sim, e já fomos exímios jogadores e actores na África e no mundo. Mas, de repente, por força do trungungo, parece que ‘emburrecemos’. Não estivemos representados ao mais alto nível em França, na Cimeira promovida por Emmanuel Macron, em que participaram cerca de 100 delegações de diferentes países, dezenas de chefes de Estado e de Governo, e ainda inúmeras empresas multinacionais.  E o tema do financiamento ao desenvolvimento, que nos interessa, dominou o encontro. Também não estamos representados, ao mais alto nível, na 15ª Cimeira de chefes de Estado e de Governo dos BRICS, que decorrerá até quinta-feira, com mais de 60 líderes do Sul Global, em Sandton, África do Sul, embora se tenha manifestado o interesse de adesão, tal como mais 23 países.

Provavelmente para lá de outras eventuais razões (não acredito que o anfitrião Cyril Ramaphosa não tenha endereçado convite ao seu homólogo), a prioridade da agenda presidencial recaiu para a preparação da visita do Presidente do Brasil, Lula da Silva, que chega sexta-feira a Luanda trazendo na sua bagagem a nova versão da Odebrecht, travestida para o mercado angolano com a logomarca de NOVOMOR, numa condição de subsidiária, para não dar tanto nas vistas, tendo em conta o seu envolvimento no que de melhor e pior ocorreu em cerca de três décadas de presença em Angola. Para quem não conhece, a Odebrecht é a tal multinacional que arranjava e financiava equipas de trambiqueiros que jogaram papel fundamental em arranjos de processos eleitorais, quer aqui quer nalguns países do continente sul-americano, onde está implantada, para manter a sua influência e a prioridade nas opções de escolha como empreiteira.

Na sequência de pressão no seu próprio país, parecia que tinham tirado o ‘time Odebrecht’ do campo. Mas, afinal, os dados demonstram que afinal continuou no jogo. E com a facilitação de actores angolanos, os mesmos ou os substitutos. E é precisamente do Brasil, agora do ‘amigo’ Lula, de onde nos chega informação substancial, que dá conta que, na nova era, só para ‘petiscar’, a ‘nossa mui amiga e glutona Odebrecht’ já desfruta de um contrato de USD 1,17 bilhão, para implantação do projecto de construção de um novo ramal ferroviário com a extensão de 260 km, entre o Luena e Saurimo, para ligação ao Caminho de Ferro de Benguela. 

Mas, será no decorrer da visita de Lula da Silva a Luanda, que será colocada a cereja por cima do bolo, com a confirmação da abertura de nova linha de crédito brasileira destinada ao financiamento de empreitadas concedidas ao grupo, que na nova versão de promotora da festa e da comilança, aparece com a cara lavada, enxaguada e retocada com um creme de marca NOVOMOR , subsidiária da Odebrecht Engenharia e Construção Internacional (OECI). A linha foi discutida, com algum sigilo apesar de se tratar de actos de Estados, em encontro entre o ministro das Relações Exteriores Tete António e o vice-presidente brasileiro Geraldo Alckmin, no início do mês de Abril.

Por força de vários processos de casos de corrupção, na operação Lava-Jato, envolvendo funcionários estrangeiros em pelo menos três continentes, e em Angola particularmente, de acordo com um comunicado do Departamento de Justiça dos EUA, a Odebrecht foi condenada a pagar, em Dezembro de 2016, USD 3,5 bilhões em multas. Para o caso específico de Angola, o comunicado especifica que, entre 2006 e 2013, a Odebrech foi responsável pelo pagamento de mais de 50 milhões de dólares a governantes, para permitir a obtenção de contratos do sector público, com os quais obteve lucros de cerca de 261,7 milhões de dólares.

Mas, ainda assim, em Julho de 2022, a tal de Odebrecht ganhou um contrato simplificado, sem concurso, para a construção de um novo aeroporto internacional em Cabinda, por 21 milhões de euros. No ano anterior, em 2021, foi escolhida para realizar um contrato de 920 milhões de dólares para a construção de uma refinaria de petróleo, em Cabinda. No mesmo ano, obteve também um contrato de 547,8 milhões de dólares,para a construção do terminal petrolífero da Barra do Dande, 30 km a norte de Luanda.

Em 2023, a linha de crédito que o BNDES (Banco Nacional do Brasil de Desenvolvimento) disponibilizou para Angola totalizou USD 3,2 bilhões, representando 31% do total de crédito externo concedido pelo Brasil no período. Dos diversos contratos do BNDES em Angola, 90% foram para a Odebrecht. De 2005 a 2015, os contratos do sector público totalizaram USD 6.13 bilhões e também foram concedidos à Odebrecht, pelas autoridades angolanas.

Mas, os tentáculos da Odebrecht estendem-se também aos sectores dos diamantes e dos petróleos. Assim, tem ligações com o sector diamantífero e mineiro desde 1995, nomeadamente através da participação de 50% que detém na Sociedade de Desenvolvimento Mineiro de Angola (SDM), numa joint venture com a empresa Endiama, responsável pela prospecção, produção e comercialização de diamantes. Nos petróleos, integra a grupo de operadores do Bloco 16.

Argumentos e provas suficientes para afirmar que, se mais houver, mais o bicho papão fará a festa e encherá a pança. E de mais alguém, é claro, porque por cá também há quem beneficia da mesma gulodice! 

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