CARRINHO. “COM O PROGRAMA DE FOMENTO AGRÍCOLA SUBSTITUÍMOS O MILHO IMPORTADO PELO NACIONAL”

DAVID MACIEL – CEO DA CARRINHO-AGRI

A campanha passada representou cerca de 135 mil toneladas e até ao fim de 2024 poderá chegar as 367 mil.”

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O Grupo Carrinho Investimentos S.A. celebra, 31 anos de existência. Tornou-se uma das marcas de maior referência nacional e ultrapassou as fronteiras nacionais. Detentora do maior Parque Industrial privado de produção de alimentos (em Benguela, na zona do Taka) em Angola construído no pós-independência, com 17 fábricas e capacidade para processar mais de 20 bens de consumo. Está instalado numa área de 55 mil metros quadrados. Há três anos, o Grupo virou-se para o fomento da agricultura, com o objectivo de substituir a importação das principais matérias-primas de que necessita, como o milho, o feijão, o arroz, o trigo e a soja, por produção nacional. Para o efeito, criou a Carrinho-Agri, o seu braço de intervenção na zona rural, que actua já em sete províncias. Os resultados, são visíveis e animadores, porque ocupou o vazio que se fazia sentir na relação entre os produtores, a indústria transformadora e os mercados de consumo. Hoje, já não importa milho e a cada meia hora, sem qualquer exagero, vê-se nas entradas e saídas de Benguela, um camião graneleiro com a sua logomarca, ou camiões basculantes de outros intervenientes, transportando grãos para os silos do Parque Industrial.

David Maciel, engenheiro agrónomo com larga experiência internacional, apesar de jovem, é quem encabeça o projecto. E fala-nos sobre ele e o que tem sido a intervenção da Carrinho-Agri junto dos agricultores, tendo-se transformado, decorridos quase 50 anos de independência, no primeiro operador privado nacional, com intervenção directa em toda a cadeia produtiva das famílias, de pequenos e de muitos médios operadores, que sentiam grandes dificuldades em vender ou de escoar o que produzem. Um exercício que, no período colonial, era realizado sobretudo, com a intervenção de grandes e médios fazendeiros ou de comerciantes, numa relação desigual em troca do “peixe podre, panos ruins e de porrada se refilares”. O que não é o caso hoje, como escalpeliza o nosso interlocutor, na entrevista que se segue:

Quem é o David Maciel? 

Sou o administrador, o CEO da Carrinho-Agri, braço do Grupo Carrinho na área do fomento da agricultura, e como formação sou engenheiro agrónomo. Estudei e formei-me em Portugal, viajei pelo mundo, trabalhei 11 anos em Moçambique, depois sete anos na Ásia baseado nas Filipinas. Estava no Brasil antes de vir para Angola. Trabalhei sempre em projectos do fomento da agricultura em grandes empresas multinacionais, das maiores do mundo, e também em projectos de mecanização de mais alto nível. Coisas que um dia se vão enquadrar aqui em Angola. Foram sempre grandes empresas, com grandes fazendas, com milhares de agricultores e projectos baseados na sustentabilidade. 

Sou casado, a minha mulher é indiana e temos uma filha ainda pequenina. Mudamos para Angola, porque vim para ficar ao lado da minha família. Os meus pais estão aqui, reformaram-se aqui. O meu pai (falecido recentemente) foi daquelas pessoas antigas formadas em agronomia no Tchivinguiro (Huíla). Porque conheceu uma Angola diferente, extremamente produtiva, que nunca dependeu de ninguém, sempre acreditou que é possível inverter esse quadro de ‘penúria’ de produção agrícola. E sempre incutiu isso em mim. Passei a vida inteira a ouvir o meu pai a falar de Angola, que tínhamos isto, que Angola produzia tudo. Exerceu sempre influência em mim, uma marca que ficará sempre na minha cabeça: a de acreditar no potencial de Angola. 

Mas eu já vinha muitas vezes a Benguela, visitar a minha avó, os meus tios e depois, quando o meu pai se reformou e também decidiu voltar para Angola (trabalhou muitos anos em Moçambique), fiquei mais inclinado em vir. Comecei a construir a minha casa em Benguela, e pensei sempre que um dia, quando me reformasse, também viria para Angola dar o meu contributo, nos domínios do que aprendi e pratiquei lá fora. Olha a oportunidade surgiu antes e cá estou.

E chegado cá, o que viu foi um choque ou não o surpreendeu?

Foi uma surpresa sim, mas pronto! Como já vinha cá todos os anos visitar a família tinha uma ideia boa do que é que era Angola, das dificuldades e de tudo o que se atravessa. Mas, trabalhar aqui, ao entrar em contacto com as pessoas, é outra coisa. Deparamo-nos com inúmeras dificuldades que não temos lá fora. Aqui, praticamente tudo é contraprodutivo, está tudo contra quem quer fazer diferente e melhor. E, principalmente, numa empresa como a Carrinho que me fez vir para aqui, porque acreditei no projecto que me foi apresentado pela sua direcção. 

Aliás, como é que entra para a Carrinho-Agri? 

Alguém que trabalha na área da indústria, penso que já tinha referências sobre mim, foi quem terá fornecido à direcção do Grupo Carrinho, informação a meu respeito e fui incluído num processo de selecção internacional. Nessa altura, estava a trabalhar no Brasil e recebi um telefonema de uma empresa de recursos humanos, que actua na contratação de talentos. Perguntaram-me se podia ter uma conversa com alguém do Grupo Carrinho. Eu respondi que não andava a procura de emprego, mas que estava bem, não me importava de ter essa conversa, porque Angola sempre foi um tema que me agrada. Então aceitei falar com alguém da Carrinho, neste caso com o Dr. Samuel Candundo, integrante sénior do corpo de direcção do Grupo, que foi o meu primeiro contacto. Depois houve uma segunda abordagem, já com o Nelson Carrinho, CEO do Grupo, que me falou sobre o que tinha como ideia, do que ambicionava agregar à Carrinho no quadro de uma integração invertida.

O Programa de Fomento Agrícola da Carrinho tem sido um compromisso de reintegrar a agricultura familiar na economia nacional

E o que é Nelson Carrinho pretendia, de concreto, com a criação da Carrinho-Agri?

Queria concluir esse processo de integração invertida, como disse. Ou seja: na cadeia de negócio já tinham a loja, a indústria, mas faltava a produção nacional, porque a matéria-prima era toda importada. Então nasceu a ideia da criação da Carrinho-Agri, para garantir a sustentação do Parque Industrial com produção nacional. Havia uma ideia inicial, diferente, de se fazer o fomento da produção nacional com muitas fazendas grandes. Mas acabamos por fazer um misto, entre o fomento da produção em larga escala, agregando o sector familiar que tem grande influência na cadeia de produção nacional. Tenho experiência nesse domínio, porque trabalhei muitos anos com o sector familiar, com pequenos agricultores e sei que essa é a verdadeira base de contributo para a dinamização da produção agrícola, num país que se planeia desenvolver nesse domínio. E o que o CEO Nelson Carrinho pretendia era a implementação de um Programa de Fomento Agrícola, como parte do compromisso de reintegrar a agricultura familiar na economia nacional. Porque a sua contribuição representa cerca de 80% da produção total, e dessa forma, alcançar a autossuficiência em matérias-primas para a produção industrial, alinhada na visão da empresa até 2030.

E têm conseguido realizar esse projecto?

Temos sim. Na primeira campanha em que nos envolvemos seriamente, de 2022–2023, garantimos que a Carrinho não importasse um grão de milho. E até agora, desde Novembro de 2022, digamos que até 24 de Agosto de 2024, não importamos milho, graças a aposta no fomento da produção nacional. Já agregamos 160 mil produtores agrícolas no sector familiar, que através do Programa de Fomento cultivam mais de 90 mil hectares.

Como interagem com as famílias, os pequenos e médios agricultores? Como se processa essa relação? Eles entregam o que produzem e em troca recebem o quê? 

Fazemos o fomento, aquilo que é o verdadeiro trabalho de extensão rural, que há muito não se fazia em Angola, e num conceito diferente, de maior respeito e interligação com os agricultores. Em pouco mais de três anos, actuamos em 51 municípios e 175 comunas, temos bases em 17 municípios de seis províncias, designadamente Benguela, Huíla, Huambo, Bié, Cuanza Sul e Malanje. Mas estamos já a expandir a nossa presença para Cabinda e a entrar também no Cunene, passando assim para oito províncias. Actualmente apoiamos mais de 160 mil famílias e prevemos, até 2030, incluir 2 milhões de famílias no Programa de Fomento Agrícola. Denominamos essas 17 representações como sedes. Por exemplo, em Benguela, estamos no Balombo e na Ganda que funcionam como sedes. Mas depois têm intervenção no Cubal, no Dombe Grande, no Chongoroi, no Caimbambo, Balombo e Bocoio. No Huambo, estamos no município sede, no Bailundo, na Caála e no Mungo. No Bié, estamos no Andulo, em Camacupa e no Cuito. Quer isso dizer, que em cada província onde intervimos, temos várias divisões onde instalamos a nossa estrutura completa com um gestor, sendo um agrónomo com experiência no fomento; um regente agrícola que é um agrónomo recém-formado, mas com alguma experiência, nalguns casos, com passagem por outras empresas e disposto a integrar-se nesta experiência. Eles representam a nossa sustentação no futuro. Temos ainda um supervisor, que é, quase sempre, também um agrónomo. A equipa é integrada ainda pelos nossos técnicos de campo, na parte técnica. Eles são o nosso primeiro contacto com o agricultor.

Depois, claro, temos a parte informática, a parte de controlo financeiro, a parte das finanças, de auditoria, a parte administrativa, a logística, de planeamento a nível de cada uma das nossas divisões. Para além dessas equipas, a nossa estrutura inclui armazéns, silos, alguns deles alugados ao Estado e a agentes privados. Toda essa infraestrutura está montada para podermos estar junto do agricultor. Nós seleccionamos e contratamos os agricultores, agrupamos em clubes, e rubricamos contratos de produção e de compra futura.

Para além de sementes, adubos, pesticidas, a Carrinho-Agri assiste com meios, assistência técnica e acompanhamento dos produtores

O que é isso de contrato de compra futura?

Dizemos ao agricultor, por exemplo, o seguinte: olha, entregaremos estas sementes de melhor qualidade, os adubos, os pesticidas, indicamos os preços e perguntamos se concorda. O agricultor, ao contrário do que alguns pensam, sabe fazer contas e as vezes leva alguns dias a decidir. Não aceita a primeira. Se concordar, acertamos depois a compra (ou venda) do milho, ou do feijão, do trigo, do arroz, do algodão, da soja, do girassol a um preço que estabelecemos antes da assinatura do contrato. Depois da assinatura entregamos então os insumos que ele precisa para produzir, e fazemos o acompanhamento dando assistência técnica que pode incluir a preparação dos solos. 

Temos um técnico para cada 200 agricultores. Quer dizer que com os 152 mil agricultores com quem trabalhamos, temos 750 técnicos de campo a fazer assistência directamente. Depois temos os supervisores, os auditores, os regentes, os gestores das divisões. Temos essa estrutura toda, bem como outros departamentos de apoio, para garantir que nada falte ao agricultor e que ele recebe tudo a tempo. Também apoiamos na logística, por exemplo, com transporte desde a casa do agricultor até ao nosso armazém. Daí, os grãos são transportados para os silos, para secagem, limpeza e depois para a nossa fábrica. E é todo esse trabalho, que como se pode verificar, é complexo e exigiu um investimento alto, que garante a substituição da importação. Os resultados são fruto de muito trabalho, do empenho de uma grande equipa comprometida não só com o Grupo, mas também com Angola.

E essa relação tem funcionado bem, com a total aceitação dos produtores? 

No princípio houve um choque, alguma resistência, que consideramos normal, porque para além de isolados, não estavam habituados a trabalhar com o suporte de toda essa organização e com acompanhamento sempre muito próximo. Embora tenhamos conseguido suprir a nossa necessidade de milho importado por milho nacional, ficámos aquém no arroz, que é normal, porque o arroz e o trigo são culturas mais difíceis de implementar aqui em Angola. A soja começamos agora, mas conscientes que há ainda um desafio muito grande pela frente.

Mas os agricultores não estão habituados a pagar o que necessitam e o que recebem. Eles habituaram-se, estes anos todos, a receber os insumos de graça nas campanhas. Logo, ainda têm dificuldade de cumprir quando o assunto é pagar. Mas essa relação, em que não pagam nada, como se observou ao longo desses anos todos, não estimula o aumento da produção, nem eles aprendem as técnicas para melhorar o cultivo, aumentar a produção, porque não se sentiam obrigados nem estavam comprometidos com nada. Nesse nosso modelo não, mas, em contrapartida, podem obter mais rendimentos. Pelo menos aquilo que recebem, os insumos, têm de pagar. Se não quiserem vender-nos o que produzem, pelo menos o que recebem têm de pagar, quer seja em dinheiro, quer seja com parte da sua produção. 


Mas isso não funciona como uma imposição?

Não, de forma alguma. O agricultor tem um contrato, recebe todas as explicações, tem tempo para reflectir e depois ou cumpre ou não cumpre. Não temos como fazer pressão para ele cumprir o que acordou. O diálogo é aberto e franco, falamos com as comunidades, há intervenção das autoridades tradicionais, é transparente e tem funcionado.

A Carrinho-Agri vai começar a implementar o Crédito Agrícola de Campanha

Tendo em conta o nível de literacia dos nossos agricultores, eles sabem bem o que é um contrato e que devem respeitá-lo?

Temos muitos exemplos de sucesso. Podemos dizer que neste ano a campanha correu bem em termos de recuperação dos factores de produção. Quase 80% dos nossos agricultores aceitaram o nosso modelo. Embora não tenham entregado toda a produção, 80% dos nossos agricultores pagaram os seus insumos e querem ficar connosco, querem continuar a trabalhar no nosso modelo. Não se trata de nenhuma imposição, porque se ele quiser vender a sua produção fora dessa relação pode fazer, e continua a ser nosso agricultor, embora não lhe atribuamos o nível A, uma referência para os nossos agricultores categorizados. Temos de entender que não estamos a fazer só um trabalho de compra e venda. Somos uma empresa, auditada pela KPMG, temos de apresentar as nossas contas quer seja a nível de gestão, quer seja a nível financeiro. Então, quer dizer, compramos a quem? O agricultor tem de ter identidade. A primeira acção que realizamos é ajudar o agricultor a ter um bilhete de identidade, pois cerca de 70% não possuem documentos de identificação. Portanto, a intervenção da Carrinho, nessa relação, começa por aí. Quem mais faz isso? O mesmo acontece com o cadastramento na AGT. Não têm conta bancária para receber o dinheiro e reduzir o risco de perda, quer deles quer da Carrinho levar o dinheiro até ao campo, sem entrar com custos avultados para alugar carros apropriados de transporte de valores. É a Carrinho que concede apoio e agiliza a abertura de contas bancárias. Deixa de haver riscos para as pessoas que transportam o dinheiro, mas também a possível tentação de funcionários, que poderão enganar os agricultores. E podem fazer poupança. 

Ajudamos também para que o agricultor tenha seguro agrícola, o que significa que passa a ter uma garantia para cobertura dos prejuízos quando não chove ou quando chove demais. Cerca de 100 mil dos 152 mil agricultores com quem trabalhamos, têm seguro agrícola. O resto das empresas não têm seguro agrícola. Este ano ajudou, particularmente no Dombe Grande, onde houve quebras causadas pelo excesso de chuva. Com todas essas práticas, esse agricultor fica categorizado. Se ele cumprir, se vendeu a sua produção a Carrinho, pagou a sua despesa, ganhou o seu dinheiro, para nós tem a categoria de agricultor A. Se pagou a sua despesa, mas não vendeu a sua produção toda a Carrinha, tem categoria B. Se não pagou a sua despesa toda, mas vendeu uma parte, tem a categoria C. E assim por aí adiante. Vamos começar a implementar agora o Crédito Agrícola de Campanha, e apenas o agricultor de categoria A terá acesso. São algumas das valências compensatórias.

A actividade agrícola em Angola é dificultada, fundamentalmente, pela difícil acessibilidade às zonas de produção. As estradas secundárias e terciárias são más. Vocês têm uma rede de transportes que vai buscar os produtos as zonas de concentração?

No primeiro ano, 2022-2023, que foi a primeira campanha, percebemos que Angola não tinha capacidade suficiente em termos de transportes, de logística, para fazer face às nossas necessidades, nem em termos de armazéns, nem em termos de camiões, e, logicamente, as dificuldades causadas pelo mau estado dos acessos e estradas. Tivemos de comprar 100 camiões robustos, graneleiros, para transportar os grãos até ao nosso Parque Industrial na zona da Taka, na Catumbela. Toda a gente percebeu, porque os próprios grandes fazendeiros queriam transportar a sua produção e não dispunham de meios apropriados. Então, se nós não avançássemos também com essa aposta, a produção continuaria no campo. Investimos na compra desses meios, como também num equipamento que ninguém pensava que são os meios complementares para facilitar o carregamento dos grãos para os camiões graneleiros. Não podíamos fazer isso com baldes. Seria um exercício moroso e complicado. Hoje temos uns dispositivos, os sem-fins, que mandam os grãos para cima dos camiões, reduzindo consideravelmente o tempo de carregamento. Foi necessário para conseguirmos carregar os camiões em tempo útil, reduzir o tempo de paragem, porque fazem longas viagens. 

Angola não estava preparada para uma acção desse nível, de produção, transporte e de logística completo. Há alguns investimentos no domínio agrícola, mas não nessa dimensão. Aliás, o país não está, nem sequer perto, de substituir a importação. Para que isso aconteça, será necessário maior comprometimento e, claro, investimento, que não está ao alcance do Estado.

Uma frota de 100 camiões graneleiros rasga as estradas dia e noite, carregados de grãos para abastecimento do Parque Industrial da Carrinho, na zona da Taça, Catumbela onde 24/24 funcionam 17 fábricas.

Isso representou ganhos para a Carrinho, sobretudo para sustentação do seu Parque Industrial. Em termos de números (quantidades), isso representou o quê, no caso do milho, por exemplo? 

Na campanha passada, representou cerca de 135 mil toneladas de milho, e até ao fim de 2024 poderá chegar as 367 mil toneladas. É muito. Se considerarmos que cada navio traz 30 mil, foram substituídos, à vontade, quatro navios de milho importado por produção nacional. Isto quer dizer que muitos milhares de milhões de kwanzas ficaram em Angola e no campo. Isso nunca aconteceu antes em Angola. Para além do arroz, do trigo, da soja, do feijão, que tem preços muito mais altos. Portanto, foram muitos milhões de kwanzas que ficaram no campo, no meio rural. Isso é um grande ganho para a economia e com grandes reflexos na melhoria da condição de vida das famílias no campo. É também uma forma de capacitarmos as famílias na redução da pobreza. Digam-nos, quem mais fez isso?

Quais são os preços que vocês praticam por quilo ou por tonelada? 

Temos tabelas de preços diferentes, por exemplo, para o sector familiar em que nós fazemos tudo pelo agricultor, e para a produção em larga escala. O produtor de larga escala tem um custo de produção diferente, porque tem trabalhadores, tem os seus silos, tem os seus equipamentos, isso tudo, e isso obriga à prática de um preço diferente. Para esses casos, utilizamos uma tabela equiparada aos preços do mercado internacional. Com os nossos pequenos agricultores, nós praticamos o preço do mercado nacional, um pouco acima do que por regra serve de base negocial. No ano passado, numa entrevista, o senhor Ministro da Agricultura salientava o preço que nós estávamos a pagar pelo milho. Não é que nós aumentámos o preço do milho. Praticamos apenas o preço justo.

No ano passado, no arranque da campanha, em Março/Abril, o milho era comprado nas comunas a 50/60 kwanzas. No primeiro ano em que entramos, começamos a pagar 130 kwanzas. Mas isto tem a ver com o custo de produção e com os valores do mercado. Este ano, nós estávamos a pagar o milho a 155 kwanzas. Porquê? Porque o contrato foi acordado no ano passado, em Agosto. Fechamos o contrato para a próxima campanha em Agosto, e vai ser comprada em Março do próximo ano. Estamos a dar um tiro no escuro. Estamos a arriscar a pagar um preço mais alto para o ano agrícola, tendo todos os factores condicionantes em conta: a desvalorização, o câmbio, a inflação. Quer dizer ainda, que para o ano teremos preços mais altos para pagar e mais em linha com os preços do mercado. 

O que consideramos injusto nisso, é que nós subsidiamos muito os insumos, que chegavam a sair entre seis e sete vezes mais baratos que os preços do mercado, para os nossos agricultores. Não há comparação. Enquanto um saco de ureia no mercado custava 49 mil kwanzas, entregávamos ao nosso agricultor a 20 mil (-29 mil kz). Há aqui uma diferença enorme. O preço que nós pagamos, logicamente, que não pode ser o preço que muitas pessoas de outras nacionalidades praticam, sem estarem cadastrados, registados, sem terem empresas, sem qualquer actividade de fomento, sem que o Estado tire deles qualquer arrecadação de impostos. Por isso podem oferecer preços superiores, que nós não conseguimos, porque temos outros encargos que beneficiam os produtores. E é isso que muita gente não entende. Pensam que a solução para o fomento da agricultura é chegar e pagar a produção, antes mesmo da sementeira, sem ter em conta outros factores dessa cadeia produtiva. O país não se desenvolve com essa prática desregrada.

Mas, ainda assim, não obrigamos os produtores a vender-nos a sua produção. Contam-se muitas histórias sobre isso, mas nós não obrigamos ninguém. Os agricultores, por contrato, têm sim a obrigação de pagar a sua dívida resultante dos insumos que entregamos a preços abaixo do mercado, e vender a sua produção que nós fomentamos. Mas, atendendo esses constrangimentos da informalidade do mercado e da falta de controle dos órgãos que deveriam regular e fiscalizar o funcionamento do mercado, não obrigamos. Nem temos como fazer. Acertamos apenas o pagamento dos insumos e o restante podem vender a quem quiserem. Se está mais alto no mercado e não podemos pagar, vendem. E fizemos isso no início da campanha. Sacrificamos este ano, para deixar o produtor fazer dinheiro. Não quisemos cortar as pernas ao agricultor. Pode falar com qualquer agricultor e vai dizer isso.

Mas apesar dos elogios do Ministério da Agricultura e de ter feito referência a essa relação de liberdade dos agricultores, há produtores que, com alguma insistência, acusam-vos de praticarem preços abaixo dos custos de produção, o que faz com que não consigam introduzir os seus produtos no mercado sem prejuízos…

Isso não é verdade porque, como disse, até esta campanha, os nossos preços eram por vezes 50% acima dos preços do mercado. Mas, o agricultor não deve olhar para o preço do mercado só como referência, porque o nosso preço está relacionado com a entrega dos insumos que permitem que ele obtenha melhores resultados em cada colheita. E nós explicamos isso. Só que, o agricultor angolano é igual ao agricultor de outras partes do mundo. Precisa de quem compre a sua produção, precisa de apoios, mas depois quer ganhar o máximo. Por isso é que há concertação. Mas, enquanto nos outros mercados as regras estão definidas, em Angola não e então ouvimos essas reclamações, vindas sobretudo, de quem estava habituado a tudo, inclusive a inflacionar preços, porque a escassez jogava a favor. 

Em três anos de actividade, a Carrinho-Agri constituiu uma equipa de 1 326 colaboradores, 250 dos quais são técnicos agrários, mas são 750 os que de forma directa acompanham os produtores.

Vamos entender essa ‘falsa’ questão colocada por alguns grandes produtores, como ciúme ou falta de cultura comercial na relação com o mercado, ou ainda, de desinformação sobre os vossos métodos de trabalho?

Nós estamos a responder a tudo isso com factos. No primeiro ano, investimos muito dinheiro no fomento e na implantação de toda a nossa máquina de suporte técnico e estruturas. Em três anos, constituímos uma equipa de 1 326 colaboradores. Os técnicos agrários são à volta de 250. Isto só para dar um exemplo da grandiosidade da nossa estrutura e da nossa implantação no campo. Por outro lado, os factos não mentem. As pessoas podem dizer o que quiserem, mas nós, no primeiro ano, conseguimos agregar 60 mil agricultores. Quem mais fez isso em Angola? É claro que muitos não cumpriram com as suas obrigações. Tiveram a produção, aproveitaram-se dos resultados da nossa intervenção, mas venderam fora do nosso circuito. E nós não recuperamos o investimento realizado, não tivemos o retorno desejado com a entrega dos nossos insumos. Mas, ainda assim, mantivemos a relação com muitos desses agricultores. Dissemos apenas, que podiam não pagar a dívida com os resultados dessa campanha, mas que iriam pagá-la lá mais para a frente e continuaram a trabalhar connosco sem liquidar a dívida. Percebemos que tínhamos de ser pacientes, porque eles não estavam habituados a trabalhar de forma organizada. Eles, no fundo, mesmo apesar do diálogo, ainda assim, pensavam que estavam a receber os insumos, de forma gratuita. Eles admitiram em muitas reuniões connosco.

Foram cerca de 5.2 mil milhões de kwanzas que ficaram por recuperar no ano passado, na primeira campanha, porque boa parte deles não nos pagaram. Mas não esmorecemos. Investimos mais e chegamos aos 152 mil agricultores do sector familiar, e das fazendas passamos de 18 para 31 efectivas, embora tenhamos inscrito mais de 70 fazendas. Os números não mentem, e se nós não estivéssemos a trabalhar bem, os agricultores não estariam connosco. Mas o número de aderentes triplicou. Se quiséssemos ter mais agricultores a trabalhar connosco, teríamos. Porque começam a acreditar, porque há uma entidade que garante insumos a tempo. Quem é que garante mercado? Quem é que garante a logística? Quem é que garante seguro agrícola? Quem é que garante o financiamento bancário? Quem é que vai garantir agora a mecanização? Nós estamos a garantir tudo isso aos nossos agricultores. 

O FADA está também a promover a mecanização do sector agrícola, e, nomeadamente do sector familiar. Conhecemos a nossa realidade. Podemos ter lá os meios, mas depois eles necessitam de assistência técnica e não há… 

Nesta fase, provavelmente, pode não resultar em benefícios. Tem é que haver uma boa gestão desses meios, preferencialmente privada, para o preparo das áreas de todas as práticas agrícolas mecanizadas. Os serviços devem ser prestados ao agricultor, e não colocar esses meios à disposição do agricultor. E ele deve pagar por essa prestação de serviço. Estamos numa fase ainda muito delicada, muito incipiente e o investimento deve ser equacionada com maior cautela. Sabemos que não existem oficinas para manutenção, que não há peças acessórias de reposição, que não há escolas para dar treinamento. Não há operadores para manuseio cuidado e adequado desses meios. Isso leva algum tempo. Defendo que esses meios e equipamentos devem ser entregues como financiamento à agentes privados, assegurados por alguém que consiga fazer esse trabalho com transparência, praticando preços que não constituam mais um aperto para os agricultores. 

Um país com pouco mais de 30 milhões de habitantes, enorme, com cerca de 3 milhões de pequenos agricultores, mais algumas centenas de pequenas e grandes fazendas, terras aráveis, grandes cursos de água permanente, não consegue satisfazer sequer 50% das suas necessidades alimentares. Aliás, um dos problemas gritantes de Angola é a fome. Que razões objectivas nos levam a este estado de pobreza, quando nações com menos conseguem até exportar?

Primeiro, e estou a falar a título muito pessoal, considero que aqui há uma luta muito grande de interesses. A importação, durante os anos em que se atingiu o auge da exploração e da exportação do petróleo, para muita gente dava muito dinheiro. Era um ‘ganha-pão’ muito sério. Então, nunca se olhava para a produção nacional. Havendo acesso a extrema riqueza do petróleo, dos diamantes e de certos minérios, mais fáceis de explorar, que permitem uma arrecadação mais rápida, imediata, de recursos, nunca se olhou com profundidade para a base de segurança de um país, que é a agricultura e a agropecuária. Durante esses quase 50 anos, nunca se olhou com seriedade para esses sectores. Outros países que não têm petróleo, são obrigados a fazê-lo. Ao importar, Angola conseguiu, por ramificação, fazer chegar alimentos a toda a sua população, a preços baixos com a aplicação de subsídios do Estado. Nunca foi forçada, verdadeiramente, a levar a sério a agricultura como um meio de alimentar o seu povo, para garantir a sua autossuficiência. Não é só a independência, através da sustentabilidade. 

Acredito que isso aí foi como que o cancro disso tudo. Há uma luta muito grande de interesses, e está-se a combater isso, embora não com a força que seria desejável. Só que, isso leva tempo e é necessária uma coisa que saliento sempre, que é o conhecimento. Angola é um país muito grande, tem muitas bocas para alimentar e tem um potencial muito grande. Mas ainda tem muitas carências em termos de conhecimento, e neste caso, na parte da agricultura. Nós precisamos de laboratórios, de boas universidades de agronomia, de bons institutos médios, de pessoas que queiram ficar a trabalhar aqui para contribuir para o desenvolvimento do país. Não precisamos só de quem vem para ganhar dinheiro ou que esteja cá só por dinheiro. Temos que, realmente, pensar em desenvolver o país. E isso aí é a chave para conseguimos desenvolver o país.

Neste momento, para o tamanho do país e para as nossas necessidades, não temos capacidade para conseguir fazer face a isso, em termos de conhecimento. Mesmo que estejamos agora a combater a importação e todas as máfias por trás disso tudo para garantir a produção nacional, depois vem o problema do conhecimento. Isto leva gerações, leva décadas até se ultrapassar. 

O número de famílias produtoras que tem acesso aos serviços de extensão, capacitação, insumos, sementes melhoradas e aos factores de correcção dos solos é demasiado reduzido para a necessidade que o país tem de matéria-prima para alimentar a indústria e matar a fome de milhares de cidadãos e fomentar o emprego.

Qual é a receita que aconselha para se ultrapassar esse ciclo, e em quanto tempo poderíamos atingir a autossuficiência alimentar?

A receita passa pela privatização e pelo fomento agrícola, principalmente no sector familiar; por se ter uma tabela de preços, para regular o mercado interno; por termos laboratórios que também devem ser privados, mas auditados, bem capacitados, por maior financiamento à actividade agrícola. Para mim, passa, sinceramente, pelo Estado, pelos ministérios que o compõem fazerem o papel de auditores, de supervisores, em vez de fazerem o papel activo de quem tem de produzir, de fomentar, de capacitar. Garantir que as empresas contratadas para prestar esses serviços, respondam às metas e aos objectivos por que são pagos, para fazer ou investir. Esse é o papel mais importante para mim. 

Acha que o discurso oficial está, de facto, alinhado com aquilo que é a realidade do campo? 

Penso que não, e posso apresentar o nosso exemplo. Auditamos muitos agricultores e constatamos que apenas cerca de 2 a 4% tiveram acesso aos serviços de extensão, de capacitação, de insumos, de sementes melhoradas, de adubo. Isso é muito pouco, se pretendemos dinamizar a agricultura. Assim levaremos 100, 200, 300 anos, pelo menos. Não conseguiremos atingir as metas desejáveis em 10 anos, menos ainda em cinco ou seis. Isso é uma ilusão. 

Os solos angolanos precisam de ser corrigidos. Temos um país enorme, temos água, temos insumos, mas falta fazer a correcção dos solos. O que se deve fazer? 

A nível de cada província e até de cada município, devem ser instalados laboratórios de análise de solos, da água, de doenças, de pragas, etc. Esse é o primeiro aspecto. Depois, o segundo, é que precisamos de calcário. Temos calcário em Angola e alguém tem de subsidiar o transporte e a distribuição junto dos agricultores. E não pode ser caro. Temos tudo aqui para nos salvarmos. Temos minas de calcário por todo o lado, de Norte a Sul. Temos fosfatos de Norte a Sul. Simplesmente, para fazer chegar o calcário da Huíla até Benguela, custa mais caro o transporte que o próprio calcário. Isso inviabiliza a produção do agricultor, inviabiliza qualquer tentativa de correcção dos solos. Portanto, o primeiro passo e termos bons laboratórios privados para fazer as análises necessárias em cada província ou município, capacitados e auditados. Tem de se fazer isso. As análises para o agricultor devem também ser subsidiadas por alguém, porque neste momento eles não têm capacidade para pagar praticamente nada. Não conseguirá pagar 20, 30, 40, 50 mil kwanzas para análises do seu solo e, principalmente, se tiver vários campos. Logo, tem de ser subsidiado ou apoiado por alguém. E depois, tem de haver um pagamento completo nos primeiros dois ou três anos para as correcções de solos do agricultor. Nem que esse pagamento tenha de ser feito às empresas que fomentam, para conseguirmos obter maiores rendimentos, aumento da produção e da qualidade dos nossos produtos.

Nós, Carrinho-Agri, fazemos isso. Estamos a levantar as amostras, a fazer os testes dos solos, a comprar o calcário, a entregar à porta do agricultor, a ensinar como se faz. É claro que não temos como satisfazer as necessidades de todos os agricultores, mas fazemos o possível. Porque nem o agricultor nos consegue pagar devido aos custos logísticos, nem consegue inserir no seu custo de produção, só numa campanha, o suficiente para conseguir corrigir o seu solo, se considerarmos um hectare. Portanto, ele não consegue. Isso é a primeira coisa a fazer. Há agricultores que nem necessitam de adubo. Precisam apenas de calcário.

O fomento da agricultura, com o apoio do Estado, deve ser atribuído a entes privados, nacionais ou estrangeiros que demonstrem capacidade. Para além da autossuficiência alimentar, contribuirá para fixação das populações no campo.

Angola tem diversos programas. Mas a exequibilidade destes é complicada. Ouvimos falar, por exemplo, do Planagrão e outros. Sente que, efectivamente, há alguma evolução que tenha resultado da implementação das acções inscritas nesses programas?

No meu ponto de vista, penso que não. Ainda não se vê. Isso requer um planeamento muito grande, e muitas vezes nós não ouvimos realmente o que acontece. Mas nós, que estamos inseridos nesse meio, não vemos retorno nenhum positivo desse tipo de programas, ou de qualquer outro. Não temos nenhum retorno positivo de ninguém. E é por isso que temos tão boa aceitação, porque estamos, com toda a transparência, a garantir aquilo que o agricultor necessita, como acompanhamento e formação. Penso que esses programas necessitam de seriedade, de acompanhamento e, como referi, que o Estado desempenhe o papel de supervisor. Estabelece as metas que as pessoas ou empresas vão cumprir e audita. O Estado tem de desempenhar esse papel e que neste momento, para ser sincero, não faz isso. Nem tem condições. É muito difícil porque o país é muito grande. Neste momento, ainda não tem a capacidade que outros países já têm, e não tem o tempo necessário, porque há fome. Hoje, ainda não conseguimos corrigir isso.

Acredito que a melhor coisa a fazer é entregar essa responsabilidade a entidades privadas, que possam implementar, e o Estado reservar-se ao papel de auditar, estar em cima, exigir resultados. Apostar mais em auditar e garantir a implementação, do que em executar. Mas, como disse, ainda não vejo que as coisas tomam esse rumo.

Angola é dos países cuja densidade populacional mais cresce ao ano. Em contrapartida, o que se produz para satisfação das necessidades básicas é cada vez menos e por falta de oportunidades no campo, as pessoas migram para as cidades. Se continuarmos nessa rota, o que nos espera? 

Teremos de voltar à importação, esquecer a produção nacional. Teremos de apostar, provavelmente, mais na indústria para conseguir processar aquilo que importamos para garantir, outra vez, que haja alimentos. Só que, ficaremos à mercê dos outros, das europas, das américas, das ásias, mas também, de alguns países da nossa região. Logicamente que, isso não é bom para nós, com as condições todas que temos. Mas é o que nos espera. Passaremos a ser um povo que viverá de subsídios, de doações e de apoios, em vez de um povo que pode produzir os seus próprios alimentos, exportar e pode dinamizar a sua nação. E tem todas as condições para isso. Acredito que se não alterarmos alguns paradigmas, é isso que acontecerá. Ficaremos à mercê dos outros.

E qual será o seu sentimento se isso acontecer? 

Se isso acontecer, vou-me embora. Não fico aqui muito tempo, porque gostaria de dar o meu contributo para o meu país, para ver isto a andar. E acredito que continuando o sonho do meu pai, Angola tem tudo para conseguir ser uma potência a nível africano e a nível mundial. Temos tudo para fazer acontecer. Até as próprias pessoas, acredito que temos. Mas precisamos de tempo, precisamos de capacitação e precisamos de unidade, de caminharmos todos na mesma direcção. Acho que isso é o mais importante.

Ficarei decepcionado se isso não acontecer, porque são dados os passos para que isso aconteça. Acho que as pessoas que realmente fazem isto acontecer, como a Carrinho — não puxo a brasa à minha sardinha —, fazem aquilo que é necessário. Entidades como a nossa têm de ser apoiadas, mas, infelizmente, ainda não temos o apoio que deveríamos ter. A Carrinho é uma empresa 100% angolana, reinveste tudo o que ganha em Angola, acredita no povo e podemos ver exemplos como a oferta da merenda escolar e outras acções de filantropia. Podemos perder dinheiro todos os anos no fomento, mas a implementar o nosso sistema, que um dia funcionará. Temos essa certeza. A direcção da Carrinho acredita em Angola e nos angolanos, mas precisa de apoio, para continuar com este projecto de fomento da agricultura. Porque, senão, será impossível atingir, em cinco ou sete anos, os níveis de produção que pretendemos. Talvez em 70 anos, mas já com os nossos filhos ou outras pessoas.

Há capacidade, há potencial para atingir isso o quanto antes. Só que as pessoas têm de deixar de falar mais mal, quando não conhecem as coisas, e trabalhar mais. Chega de ser do contra todas as boas iniciativas dos outros. Está na altura de as pessoas juntarem as mãos e de fazerem mais por Angola. Chega de conversa. Temos as condições para isso. Mas é triste ver sempre pessoas a deturpar o que os outros fazem, dizerem que é mentira, que se rouba, quando há factos e o trabalho atesta o contrário. Apareçam para ver o que fazemos. Não basta só falar com os agricultores porque eles também têm outros interesses, nem sempre são verdadeiros, até pelo nível de literacia no campo. Levamos muitas entidades ao campo, e ficam entusiasmadíssimas com o que veem. Explicamos o nosso projecto e as pessoas ficam animadas. Veem o que acontece, ficam entusiasmadíssimas porque constatam a verdade, que acontece trabalho sério e profundo, que muda práticas antigas e contribui para a melhoria da vida de muitas pessoas. 

As famílias camponesas, pelo seu papel na economia, não devem ser os mais pobres e menos ainda, passar fome.

Às vezes, quando vamos ao campo, encontramos comunidades inteiras a rezar por nós, a dizer que foi Deus que trouxe a Carrinho. Isso não aparece na televisão, mas eles dizem, agradecendo ao senhor, por trazer a Carrinho, fez com que alguém olhasse para eles. Isso diz que não enganamos ninguém. Sentimos, que isso dá força e alento aos próprios donos da empresa, a todos os colaboradores, de continuar a trabalhar dia após dia. Porque sentimos que ajudamos, contribuímos e que não estamos aqui a trabalhar apenas para ganhar o nosso salário. 

Já li muitos comentários de pessoas que questionam, que não sabem como os funcionários da Carrinho vestem a sua camisa todos os dias. Isso só acontece porque, realmente, honram aquilo que fazem e sentem que contribuem verdadeiramente para o engrandecimento da Nação e o contrário também é verdade. Então, têm orgulho naquilo que fazem porque sabem que trabalhar no campo é estar a contribuir para o desenvolvimento do nosso país. E isso dá um alento diferente e vontade de usar esta camisa, o que eventualmente não ocorre em muitas empresas, cujos proprietários, às vezes, estão por trás da disseminação desse tipo de informação. Para tirar proveito, fazendo pouco ou nada, e com sentido diferente.

Com intervenção no fomento agrícola, a Carrinho deixou de importar milho. Na campanha passada, representou cerca de 135 mil toneladas de milho, e até ao fim de 2024 poderá chegar as 367 mil toneladas.

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