A CIRCULAR PELO LUBANGO

ZOOM DA TUNDAVALA

As “más línguas” que andam por aí, dizem que a verba não é prevista no OGE por causa de algum “castigo”, imposto veladamente à Província, devido a “certas ousadias”. Vá-se lá saber…

AIRES ALMEIDA

Um dos temas incontornáveis da realidade económica e social angolana é, sem dúvidas, o das estradas, não só pela importância de que elas se revestem em todos os aspectos da vida da nação, como pelo “desgaste” que tem sido a abordagem do tema, mormente pelos incontáveis episódios que vivem os automobilistas em todo o país, normalmente relacionados com o estado delas, das estradas. E o Lubango não fica de fora dessa discussão.

“As estradas são as veias por onde circula o sangue do país”, é o chavão muitas vezes utilizado para exprimir a importância das estradas, e dele se pode depreender que, tal como no corpo humano, se as veias têm obstruções, entupimentos, lesões… se não estão limpas e isentas de problemas, é evidente que o sangue não circula ou pelo menos da forma mais conveniente e, já se sabe o que acontece. O país não funciona como deve ser, está moribundo. As nossas estradas/veias estão com lesões muito profundas, cheias de buracos, crateras, rompimentos, sangrantes num corpo jazendo por falta de assistência, manutenção e conservação.

No fim do ano passado, foi notícia, e também motivo de muitos comentários e observações, a construção de uma idealizada auto-estrada, que se pretende venha a ligar a fronteira sul de Santa Clara, na Província do Cunene, até à província do Zaire, numa extensão discutível porque, da divulgada, parece não bater “a bota com a perdigota”.

Contudo, antes mesmo de se falar em auto-estradas, há muitos anos se fala, por terras do Cristo Rei, da “Circular do Lubango” que, existindo no papel, vai saindo para a realidade com uma calma assustadora. Desde que foi anunciada, com a pompa e circunstância que um projecto desta grandeza impõe, o projecto conheceu avanços e recuos, sabendo-se que, o que falta, é a bufunfa, o graveto que não está contemplado no OGE. É conhecida a preocupação do Governo da Província relativamente a este projecto, mas, ao que tudo indica, o “banho-maria” está para durar e, se calhar, para lá de 2027 ainda se falará da não conclusão da Circular do Lubango. As “más línguas” que andam por aí, dizem que a verba não é prevista no OGE por causa de algum “castigo”, imposto veladamente à Província, devido a “certas ousadias”. Vá-se lá saber… Por isso, a Circular do Lubango vai-se fazendo, muito à custa da boa vontade do empreiteiro, que não recebe um cêntimo, sabe-se lá há quanto tempo. Porém, como não bastam boas vontades, importa mesmo é que, lá, na Ingombota, onde ele deve ser resolvido, se dê a devida importância ao assunto. 

Mas, há muito mais tempo, antes mesmo da ideia da Circular do Lubango, teve início uma empreitada que visava a reabilitação, com asfaltagem, da estrada que liga o Km 16, na Estada Nacional Nº 105 (EN-105) no troço Lubango/Chibia, à Estrada Nacional Nº 280 (EN-280) que liga as cidades do Lubango e de Moçâmedes, passando pela Comuna da Huíla e terminando no recém-promovido  Município da Palanca, na confluência com a EN-280, a poucos quilómetros da Humpata. 

Esta estrada, deveria servir, antes de mais, para a circulação de veículos pesados, especialmente os de transporte de blocos de granito, oriundos da mineração existente pelas bandas da Chibia, o que desafogaria o trânsito cada vez mais caótico da cidade do Lubango, libertando-a não só desses veículos, mas fazendo também sofrer menos o asfalto das ruas da urbe. Serviria igualmente as populações da Comuna da Huíla e da região do Nene, onde a vida parou no tempo, e possibilitaria também uma melhor ligação à Missão do Jau.

A empreitada chegou mesmo a sair do papel e, chegaram a ser feitos alguns trabalhos de terraplanagem, escaqueiraram-se antigos pontecos que dariam lugar a pontes e passagens hidráulicas supostamente melhores, mas, como num passe de mágica, as obras foram interrompidas, as pontes e os pontecos ficaram por concluir, o pouco que estava terraplanado já era, a tal empresa desapareceu da circulação e ninguém sabe mais nada do assunto. Ou talvez se saiba… Mais tarde, também há muito, muito tempo, a obra foi adjudicada a outra empresa, se calhar a mais outra, não se sabe e, uma eternidade depois, a única coisa que se sabe é que se gastaram “cifrões”, que não terão sido poucos, a obra não se realizou, paralizou de vez, e o figurino é o que se vê. Em jeito de anedota até se vai dizendo que essa estrada “já foi asfaltada sete vezes”. 

A estrada que liga o Km 16 à Palanca transformou-se, por isso, e há muito, no símbolo da desgraça e do abandono a que estão votadas as populações daquelas zonas, às quais não se presta qualquer explicação, e apenas vêm a estrada a desaparecer cada vez mais porque, a cada época de chuva, as rilheiras transformam-se em ravinas, as poças de água em lagoas profundas, os buracos em crateras, a vegetação vai tomando conta do caminho, tornando possível a circulação apenas a cabras da montanha. Esta situação é tão antiga, que um habitante da região, já com barbas, quando interpelado sobre a estrada, foi muito esclarecedor ao dizer: “tio, eu pensei que isto foi sempre assim. Afinal aqui tinha estrada?” 

Esta estrada, tida como uma obra estruturante da circulação rodoviária da cidade, continua a ser uma miragem, não só para os seus habitantes que têm de conviver, todos os dias, com dezenas de camions que por ela circulam fazendo transporte de enormes calhaus de granito, apesar das supostas restrições ou proibições não “desproibidas”, estabelecidas pelos governos das Províncias da Huíla e do Namibe que ninguém cumpre, como para aquelas populações que poderiam ser servidas por ela, facilitando a sua circulação e comunicação, com o contributo evidente ao desenvolvimento económico e social de toda aquela região. 

Sabe-se da preocupação dos governantes em relação a esta estrada. Moraliza, é verdade, mas não satisfaz. É indispensável que se vejam acções concretas para que o cenário mude de figura. É tempo de haver estrada. Já agora, devido ao tempo que está a custar fazer, quando a estrada estiver feita, dispensem-se as tradicionais “inaugurices” que só dão para o regabofe.  Façam-se as obras, e será bastante que se vejam os resultados.

(É importante saber: o autor não possui nenhuma fazenda na região que pudesse ser servida pela estrada!)

INFRAESTRUTURAS RODOVIÁRIAS, TOPOGRAFIA E CARTOGRAFIA: Eixo rodoviário com 61 km de extensão que materializa um “anel” circundando a cidade de Lubango (Angola). Apresenta um perfil transversal tipo com 2×2 vias, plataforma com largura total de 19,10 m (zonas urbanizadas) ou 21,50 m (zonas não urbanizadas). As ligações com a rede viária existente englobam a construção de um nó desnivelado e as restantes de nível do tipo rotunda ou do tipo “entrada e saída na mão”. Prevista a construção de  15 obras de arte numa extensão total de aproximadamente 900 m.

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