MPLA. António Venâncio avançará para impugnação do Congresso

Por Ramiro Aleixo

A juíza conselheira presidente do Tribunal Constitucional, Laurinda Prazeres Monteiro Cardoso, indeferiu ontem (quarta-feira 8), o requerimento de providência cautelar apresentado pelo militante do MPLA, António Francisco Venâncio, para que esse partido seja obrigado a recomeçar todo o processo orgânico relacionado com o seu VIII Congresso, iniciado hoje, sustentando a sua decisão “nos termos do nº3 in fine do artigo 4574 do Código do Processo Civil, aplicável em virtude do artigo 2º da Lei do Processo Constitucional”.

Numa primeira reacção e abordado por este site, António Venâncio declarou que a sua assessoria jurídica está já a preparar a interpretação para dar entrada de um pedido de impugnação do Congresso, que obrigará o MPLA a repetir tudo de novo, o que, a acontecer, não só será um grande revês, mas também resultará em prejuízos enormes tendo em conta tudo o que se está a fazer.

António Venâncio foi perentório e afirmou que “neste momento João Lourenço não é candidato à presidência do MPLA”.

Esta decisão da juíza presidente do Tribunal Constitucional está a levantar acesa polêmica em diferentes círculos da sociedade, dos partidos políticos da oposição e da classe jurídica, particularmente da ligada a academia, quando comparada ao caso que, no mês de Novembro, por via do Acórdão 700/2021, o Tribunal Constitucional, naquele que foi o primeiro teste de fogo da recém-nomeada juíza, levou à anulação do XIII Congresso da UNITA interposto por um grupo de militantes por via da AGQ-Sociedade de Advogados, RL, bem como noutro apresentado ainda durante o conclave do maior partido da oposição e pelo mesmo escritório. 

Quer num caso quer noutro, a análise das providências cautelares permite concluir que foram requeridas com os mesmos fundamentos legais e obedecendo a mesma forma legal. Contudo, no caso de António Venâncio, de acordo com outro jurista contactado pelo site Kesongo, ela foi até mais fundamentada legalmente e sustentada com factos mais graves que a requerida pelos militantes da UNITA. A diferença, de acordo com a nossa fonte, está no facto de que a juíza presidente é membro do seu Bureau Político do MPLA, com mandato suspenso face o exercício do cargo, o que não retira a sua ligação ou afectividade.

Para outras fontes contactadas ligadas ao judiciário, o indeferimento liminar sustentado com “fundamentos supérfluos”, porque não encontram suporte legal nos artigos citados, no caso da UNITA, foi admitido porque já não há vício de forma e o objectivo pretendido (e alcançado) era inviabilizar a realização do XIII Congresso desta força política e, consequentemente, impedir a reeleição de Adalberto Costa Júnior no cargo de presidente da UNITA. O projecto falhou, mas, no entanto, ainda se mantém de pé, até porque o escritório de advogados que intentou a acção que deu lugar ao famoso acórdão 700/2021 é o mesmo que patrocina a nova providência cautelar, apresentada por cima do Congresso realizado que, de acordo com as fontes que contactamos, não foi decretada para não serem obrigados a decretar também a providência cautelar requerida por António Venâncio. 

No requerimento enviado ao Tribunal Constitucional, António Venâncio, no caso representado pelo escritório do advogado Sérgio Raimundo & Associados, alegou que se viu impedido de apresentar e formalizar a sua candidatura ao cargo de presidente do MPLA por ausência de uma Comissão Eleitoral, bem como de recolher as assinaturas necessárias, devido a actos de intimidação de que os militantes seus apoiantes foram alvo que foram, aliás, substanciais.

António Venâncio e sua defesa, argumentaram igualmente no requerimento de pedido de providência cautelar não especificada, que se viu impossibilitado de apresentar as suas reclamações num órgão do MPLA, por ausência de uma Comissão Eleitoral, alegando, além do mais, “que foram desrespeitados o direito de eleger e de ser eleito previstos nos estatutos e no regulamento eleitoral desse partido, que determinam o direito de ser tratado de forma igual aos demais militantes.

Os argumentos esgrimidos por António Venâncio fazem referência a garantia da inviolabilidade dos seus direitos e deveres, expressos no regulamento eleitoral, e da garantia que os cargos electivos devem ser realizados sem que o eleitor sofra quaisquer pressões para votar num ou noutro candidato.

Contudo, para a juíza conselheira presidente do Tribunal Constitucional, Laurinda Prazeres Cardoso, as alegações e fundamentos supra, mormente no que respeita à natureza do processo adoptado pelo requerente, permitiram concluir que o requerente António Venâncio se “amparou de uma Providência Cautelar não Especificada (cfr. Artigo 399º do Código do Processo Civil, aplicável a título subsidiário e com as devidas adaptações nos termos do disposto no artigo 2.º da Lei n.º 3/8, de 17 de Junho, Lei do Processo Constitucional (LPC), em detrimento do Processo de Impugnação de Candidaturas, regulado nos termos do disposto do n.º 2 do artigo 29.º da Lei 22/10, de 3 de Dezembro, Lei dos Partidos Políticos, e da alínea d) do nº1 do artigo 63º da LPC”.

Para a nossa fonte, mais do que ilegal, está decisão é inconstitucional porque viola o princípio da igualdade pois, no caso dos militantes da UNITA, usando a mesma forma legal, a providência foi admitida, embora não decidida em tempo útil, e a de António Venâncio foi indeferida por se tratar de uma providência contra o partido em que a juíza conselheira presidente do Tribunal Constitucional pelo menos militou formalmente, e cujo presidente foi quem a nomeou e é parte interessada. 

Exactamente por essa razão e tendo em conta informação diversa divulgada por via das redes sociais, que deram conta que Laurinda Prazeres Monteiro Cardoso encontrava-se em gozo de férias e foi “forçada” a interrompê-las “a pedido do presidente da República, com quem manteve uma reunião de urgência que terá durado cerca de três horas”, essa decisão pode ser entendida como uma espécie de “troca de favores”, e de “violação grosseira e descarada das normas que regem, ou de como funciona este Estado democrático e de direito”.

A decisão, acrescida com a utilização excessiva e abusiva de meios e instituições públicos para publicitar e divulgar o congresso dos camaradas, mas também a “contribuição financeira” de entidades e de empresas públicas está a ser vista, igualmente, por amplos sectores da sociedade, mas também por fontes afectadas à embaixadas acreditadas em Luanda e organizações internacionais, como a confirmação do modelo de gestão em que o MPLA se apossou do Estado para manter a sua longevidade no poder.

Por baixo dessa ponte, continuará a correr muita água.

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