Concorrentes da Lista A manipulam e condicionam a liberdade de expressão e a visibilidade dos demais, violando a lei de imprensa, o espírito democrático, o respeito pela concorrência leal e o princípio da representatividade. Advogados não devem fazer uso do jogo do vale tudo que descredibiliza as instituições.

Estou a acompanhar com atenção redobrada, a campanha eleitoral para a presidência do Conselho Provincial da Ordem dos Advogados na Huíla. E sim, está a ser um processo interessante, com propostas que merecem ser analisadas com seriedade. Mas, mais do que isso, exige-se de todos os intervenientes uma conduta ética exemplar, porque estamos a falar de uma instituição de classe, composta por profissionais do Direito, cuja missão é zelar pela legalidade, pelos princípios democráticos e pela justiça.
É justamente por isso, que venho expressar a minha surpresa e inquietação, para não dizer indignação, perante uma situação que, para mim, configura uma das atitudes mais graves que já vi no contexto eleitoral interno de uma instituição que se quer respeitável.
Refiro-me ao facto, confirmado, de que a Lista A, candidata à presidência deste Conselho Provincial, celebrou contratos de exclusividade com duas páginas digitais, que têm tido um papel relevante no espaço da comunicação social da Huíla: o É Nós na Banda e o Portal Yetu. Páginas essas que, independentemente do seu registo formal, exercem actividade informativa pública, veiculam notícias, fazem cobertura de eventos e influenciam a percepção social de quem as segue. Portanto, ao restringir o acesso a essas plataformas apenas a uma candidatura, está-se a limitar o espaço de exposição e de comunicação dos restantes concorrentes, e isso é, sem dúvida, uma distorção da equidade do processo eleitoral.
Não se trata aqui de uma questão de gosto ou estratégia. Trata-se de princípios legais e democráticos. E, para quem ainda tenha dúvidas, convém dizer com toda a clareza: a nossa Lei de Imprensa aplica-se também aos meios digitais, incluindo páginas de Facebook e plataformas online que exerçam actividade informativa regular. Isso está consagrado no Artigo 2.º, alínea x) da Lei de imprensa.
Adicionalmente, no Artigo 3.º, alínea g), a Lei inclui expressamente os media online como parte integrante dos meios de comunicação social abrangidos pelo regime legal. Isto significa, que qualquer página que opera regularmente com conteúdos informativos está sujeita às regras que regem a actividade jornalística em Angola, incluindo os deveres de isenção, pluralismo e rigor.
Mas o mais comprometedor está no Artigo 6.º, n.º 2 da referida Lei, que prescreve o seguinte: “O exercício da liberdade de imprensa deve assegurar informação ampla e isenta, o pluralismo democrático, a não discriminação e o respeito pelo interesse público.”
Ora, o que se passa aqui é precisamente o contrário: estamos diante de uma manobra que nega o pluralismo, distorce a informação pública e viola o princípio da não discriminação de acesso. O facto de páginas de informação celebrarem contratos de exclusividade com uma candidatura, impedindo a cobertura equitativa das restantes, viola o interesse público, porque cria uma ilusão de hegemonia e sufoca o contraditório.
O Artigo 7.º da Lei, que trata dos limites da liberdade de imprensa, também é claro ao indicar que essa liberdade não cobre a produção ilícita de informação, nem a obtenção ou difusão de conteúdos por meios desleais. E acrescenta, no n.º 4, prescrevendo o seguinte: “a divulgação de qualquer tipo de conteúdos através da internet está sujeita aos limites previstos […], independentemente da origem ou localização do servidor em que o sítio ou página esteja alojado.”
Isto é, as páginas É Nós na Banda e Portal Yetu não estão fora do alcance da lei só porque funcionam no digital. Estão claramente sujeitas aos princípios e restrições legais, o que inclui o dever de imparcialidade num contexto sensível como uma eleição interna.
E aqui faço questão de reforçar: não me venham dizer que a candidatura da Lista A não sabia disso. Seria, no mínimo, insultuoso! Estão a concorrer à presidência de uma instituição de advogados, não de um clube de diversão. Conhecem bem a lei. Sabem muito bem o que significa comunicação social. E sabiam, seguramente, que ao fechar contratos de exclusividade com páginas influentes, limitaram a visibilidade dos outros, tornando a disputa eleitoral desigual, desonesta e desequilibrada.
Pergunto-me ainda: e a Comissão Eleitoral? Teve ou não acesso a esta informação? Se teve e não agiu, falhou. Se não teve, alguém a impediu de cumprir o seu papel. Ambas as hipóteses são graves. O processo eleitoral, para ser legítimo, precisa ser transparente e igualitário. E a passividade diante de práticas que comprometem a democracia interna da Ordem é cúmplice e lamentável.
Não aceito que se venha maquilhar isto como “estratégia de comunicação”. Não é estratégia, é manipulação. E o pior: é uma manipulação que contradiz os próprios valores que a Lista A diz defender. Uma candidatura que quer liderar uma Ordem de Advogados deve, acima de tudo, ser exemplo de ética e de respeito pelas regras. Se já começa assim, com contratos de exclusividade para controlar a narrativa, o que se pode esperar da sua actuação institucional futura?
Concluo com uma frase clara: isto é uma nota negativa, das mais graves possíveis. Não apenas por violar a Lei de Imprensa, mas por violar o espírito democrático, o respeito pela concorrência leal e o princípio da representatividade. A advocacia não pode permitir que o exemplo venha pela via da opacidade e da manipulação. O respeito pela profissão começa pela conduta dos seus próprios representantes.
E se essa conduta já se revela comprometida antes mesmo de se chegar ao poder, então é legítimo, e até necessário, que todos os advogados da Huíla pensem duas vezes antes de colocar o seu voto.