VEGETANDO POR AÍ…
Elas até existem, mas não são respeitadas. E uma delas, é que as portas dos cofres públicos não devem ficar escancaradas. Algum alarme deve tocar em qualquer fase dos procedimentos de controlo da saída de dinheiro e de bens públicos, em vez de se ficar acomodado a aguardar por denúncias.

Referi num texto que escrevi faz mais de dois anos, que não via com bons olhos essa injecção abrupta de jovens na AGT. Sobretudo porque são filhos, sobrinhos, enteados, namoradas e amantes de gente influente. Sem qualquer concurso público, são admitidos e mesmo sem experiência de trabalho, entram já como chefes, substituem quadros séniores com décadas de experiência, boa parte também com formação académica e técnica superior. Estes, para não se aborrecerem nem aturarem ‘pirralhos’ prepotentes protegidos pelas cunhas, optaram por pedir reforma antecipada. E essas saídas reflectem-se na qualidade dos serviços prestados por essa instituição. É claro que também têm direito a emprego, mas as regras devem ser iguais para todos.
Embora o último Censo esteja por concluir, não se está distante da constatação de que 65% (ou até mais) da população angolana é constituída por jovens, que merecem e têm todo o direito de participar em todos os sectores e exercícios para alavancar a economia do país. E é nos jovens, nas suas competências e na sua entrega, que assentam os alicerces do Estado angolano. Isso é indiscutível. Mas num sector fundamental para a sobrevivência do Estado, essa transição geracional, que, repito, ninguém tem dúvida de que é necessária e fundamental, não tem sido, devidamente, acautelada e fiscalizada. Até mesmo para não ser desacreditada, ou ‘assassinada’ na praia, como ocorre, por sua culpa mas também de outrem (os tais protectores), o que é perigoso para o próprio Estado, para as famílias e para o seu futuro, porque cada jovem que se desvia e vai parar às cadeias, é investimento humano e de competência que se perde. É dor para os seus progenitores e familiares. É lesão a honra, ao bom nome de uma linhagem, mácula que perdura e até leva à morte.
Mas como o Chefe passa a mensagem de que o velho deve ser substituído, utilizando os jovens como sapata para seu próprio suporte, os oportunistas que o servem abriram as comportas para o livre e por vezes negligente acesso de tudo e de todos, sem que, nas próprias instituições, eles façam o percurso com escalas de ascensão meritória, com comprometimento. Porque é isso que agrega depois mais valor, mais competência, mais saber ao que se absorve na academia e no berço (família). Contudo, até ‘pimpolhos’ com menos de dois anos de serviço na AGT, sem experiência, recebem credenciais de livre acesso que lhes permite fazer tudo. São todos chefes de qualquer coisa.
O resultado dessa transferência descuidada, criminosa até, de responsabilidades de uma geração para outra, põe em risco a segurança e a estabilidade do próprio Estado. E acredito que esse caso que levou ao desfalque de mais de 7 mil milhões de kwanzas do Erário, a partir da AGT, é só uma amostra dos muitos outros casos que continuam a manchar a nossa governação, mas (ainda) não se tornaram públicos. Mas todos sabemos — e quem governa finge que não vê e não sabe —, que continuam os esquemas e a colocação de dificuldades repetidas em torno dos pagamentos da Dívida Pública. E que também se fala, à boca grande, da existência de um escritório de advogados em Luanda, que agiliza o desbloqueamento das barreiras, impostas por funcionários das Finanças, com o propósito de ‘mixarem’ do pagamento da dívida, embora eu já tenha recebido informação de que, no actual modelo, isso não é mais possível. Do mesmo modo, que a concertação, para os casos de grandes montantes, incluindo da dívida com entidades estrangeiras, é feita num escritório situado num prédio da Avenida da Liberdade, em Lisboa. A ser verdade, é claro que o negócio não é de arraia-miúda. Mas, deixa-me ficar por aqui, porque apesar do dinheiro sair mesmo para uns e não para outros ou para todos e haver registo, será a mim que pedirão provas. E está claro, não tenho.
No meio desta embrulhada toda, de falta de vergonha, em que se alega escassez de dinheiro até para cobertura de salários, entrou em cena Sua Excelência Ordens Superiores, que em vez de orientar para que se esprema esse ‘osso’ até ao tutano para se apurar toda a verdade, fez o inverso. Colocou rolha nos órgãos de comunicação públicos para que o caso não tenha a relevância que merece, como que a transmitir a mensagem aos jovens, para que sigam o exemplo deles (mais-velhos ladrões), que podem roubar o que é nosso e que quanto mais roubarem, maior será a protecção. E os laboratórios habituais de desinformação, até já direccionaram as antenas para o quintal do vizinho político.
Mas este arrombo ocorrido na AGT, é demasiado grave para ser tratado com a superficialidade pretendida. Merece sindicância, debate público e abordagem institucional (mas acabará por ficar apenas pelas redes sociais). Tal como não foi o ‘Caso Lussati’, que teve responsabilidades políticas. E se um ministro de Estado e chefe da Casa Militar do Presidente da República foi demitido (enviado para o ninho da Assembleia Nacional), a ministra das Finanças, Vera Daves, se é coerente, já devia ter apresentado a sua carta de pedido de demissão. Acto continuo ao conhecimento da intervenção policial e das detenções, devia exonerar, ou no mínimo, suspender, o PCA da AGT. Ao não tomar essa atitude, pode levar à interpretação de que está com (ou a proteger) os defraudadores, o que é passível de consequências criminais. É o que diz a lei, a ética, a moral e o que a defesa da honradez exigem, porque até prova em contrário, para nós, são todos ‘chuspetos’, o que não abona a imagem da própria e da governação, embora a prática seja a utilização de critérios diferentes, para casos semelhantes. Por exemplo, Exalgina Gambôa, no Tribunal de Contas, foi forçada a renunciar, mas Joel Leonardo, no Tribunal Supremo, continua a espalhar a sua banga. Os dois são juízes e os crimes de que são acusados, parecem siameses.
Como é lógico, com tudo isso a sociedade está cada vez mais intrigada, revoltada com o descaso e faz muitas reflexões, designadamente, sobre os perigos que a Nação corre com tanta malandragem, com esse amadorismo, imprudência, proteccionismo, compadrio, exercício selectivo da justiça, no fundo, desgovernança, consequência das incongruências do Chefe do Executivo. Mas fazer o quê, se ele próprio gosta de ser o responsável por toda a bagunça? Queiramos ou não, é ele mesmo, quem manda e em muitos actos, se coloca acima da Lei.
Por tudo isso que nos é dado a ver, ficamos com a impressão de que a festa de mais-velhos e de certos jovens com os dinheiros públicos não vai parar por aqui, por a fiscalidade ser opaca. Conheço um caso de um agente penitenciário, que abriu recentemente uma empresa de aluguer de automóveis de grande cilindrada. Qual é a sua fonte de renda? Teve acesso a empréstimo bancário? Herdou bens e recursos financeiros? Como obteve as licenças? Ninguém questiona? Foi o que ocorreu na AGT. Jovens que entram agora no funcionalismo público, filhos de pais pobres ou remediados, exibem sinais de riqueza, efectuam e pagam viagens frequentes para o estrangeiro. Com que dinheiro? É como se eu, jornalista, aparecesse a desfilar com uma Ferrari e não ter ganho a loteria. Como não jogo, é por demais evidente, que está fora de hipótese.
Contudo, não temos que ver esse caso com o radicalismo habitual, mas sim, com bom senso, como mais um aprendizado ou uma lição, concedendo abertura para os jovens, mas como com os filhos, também estabelecer limites. Os mais-velhos (incluindo os pais) cometem erros iguais ou até mais graves, por que razão se vai crucificar os jovens? As regras (ou limites) até existem, só que não são respeitada(o)s. E uma delas, é que as portas dos cofres públicos (e privados) não devem ficar escancaradas. Algum alarme deve tocar na execução dos procedimentos de controlo da saída de dinheiro e de bens públicos, em vez de se ficar acomodado a aguardar por denúncias. Por outro lado, há níveis de segurança que devem ser observados, e que programas informáticos que custam milhões de dólares, deviam integrar. Se existem e não funcionaram ou não são respeitados, então a grande falha começa aí. O que é mais grave ainda.
Sou dos que defende, que, tal como no desporto de alta competição, a integridade profissional, a ética, a moral, o bom ou o mau desempenho dos funcionários públicos a todos os níveis, deve ser aferida pela sua postura dentro e fora ‘das quatro linhas’. Como diz o dito popular português: “Quem cabritos vende e cabras não tem, de algum lado lhe vêm”. E temos agora mais um caso, que a exemplo de muitos anteriores, é resultado do desrespeito à normas e procedimentos nos actos administrativos e de gestão, que atesta proteccionismo, permissividade e promiscuidade. Como se vê, não são bons remédios para orientação dos jovens nem garantia de melhor futuro. Estão a enganar os jovens, a atirá-los para o abismo.
Finalmente, a advertência ou aconselhamento, é que um jovem comprometido com a Nação, com a família, com foco e com boa formação/educação não rouba (nem usa drogas e feitiços). Honra o nome dos progenitores. Levanta-se cedo e dá no duro. Luta para vencer todas as adversidades, mesmo que, contra o poder, se concluir que ele é culpado das suas desgraças. Essa luta, que é geracional e incontornável, é que conduz a dignificação e formatação do homem jovem e novo, para a substituição deste homem mais-velho, muitos dos quais, responsáveis pelo descalabro que o país vive.
Tudo o resto, não passa de bazófia, de utopia cultivada e alimentada pelo sistema, tal como aquele sonho vendido por garimpeiros da fé, que dizem aos seus fiéis incautos, que a felicidade cai (ou está) do céu. É mentira! Do céu só cai chuva e mesmo ela quando não é devidamente aproveitada, nem a sede nem a cólera mata.
