1º De Maio – Dia do Trabalhador

“O movimento estudantil em Angola foi muito forte naqueles anos, com embrião na Universidade de Luanda, mas alargando-se, depois do 25 de Abril, aos liceus. Houve de tudo, greves, manifestações, marchas, pancadaria, confrontos com a polícia, mas o movimento estudantil não pactuou com nenhum dos poderes, nem com o próprio MPLA, hoje no governo”.

Cesaltina Abreu*

O surgimento do Primeiro de Maio como Dia do Trabalhador tem origem nos protestos organizados pelos trabalhadores de Chicago em 18862. Estes protestos tinham por objectivo exigir melhores condições de trabalho (aumento dos salários baixos, melhores condições de salubridade e de segurança no local de trabalho), particularmente a duração da jornada laboral (na época e nos Estados Unidos, era de 12 horas e os trabalhadores exigiam que fosse reduzida para 8 horas, as actualmente em vigor, também aqui ‘oficialmente’) e a necessidade de períodos intercalares de descanso. A inspiração dos trabalhadores era: oito horas para trabalhar, oito horas para o lazer e oito horas para o sono. É uma homenagem internacional aos trabalhadores porque a data e a celebração foram adoptadas por muitos países e constam do calendário de Dias Internacionais3.

O 1º de Maio é celebrado em grande parte do mundo como o Dia Internacional do Trabalhador. Nesse dia, havendo ou não feriado decretado oficialmente, os trabalhadores em diferentes países organizam diversos eventos que combinam manifestações pela melhoria das condições de vida e actividades de lazer. A data apenas se tornou feriado em 1919, na França que, entretanto, havia adoptado a jornada de trabalho de 8 horas. 

O século XX foi o palco de processos como a urbanização, a industrialização, a formação e propagação do modelo de Estado-Nação, e a expansão do capitalismo, que transformaram radicalmente as formas pelas quais as pessoas se relacionavam, se percebiam e se constituíam enquanto sujeitos colectivos. As Leis trabalhistas que hoje temos, a duração da jornada de trabalho, o direito a lutar por melhores condições nos locais de trabalho, a possibilidade de as mulheres conciliarem trabalho e maternidade, as férias, o direito à greve, entre outras, resultaram de movimentos reivindicativos protagonizados por milhões de pessoas em todo o mundo, desde o final do século XIX e durante o século XX. O direito ao sufrágio universal e, dentro desta luta, o direito de voto às mulheres, foi igualmente conseguido na RUA, por movimentos sociais, em diversos espaços de luta. Em 1893, a Nova Zelândia tornou-se o primeiro país a garantir o sufrágio feminino, graças ao movimento liderado por Kate Sheppard. As mulheres suíças ganharam o direito de voto apenas em 1971. 

Lembrando, os Direitos Civis (séc. XVIII) contemplam os direitos individuais à vida, segurança, liberdade, igualdade, propriedade, ir e vir, etc. Os Direitos Políticos (séc. XIX), dizem respeito à liberdade de associação e reunião, de organização política e sindical, à participação política e eleitoral, ao sufrágio universal, etc. São direitos individuais exercidos colectivamente. 

Só no século XX, através de lutas dos movimentos sociais, feministas, operário/sindical e estudantis (lembrar a Greve Geral de Maio 1968 que paralisou a França) foram conquistados os direitos sociais, económicos, culturais (2ª geração de direitos), que representam o acesso aos meios de vida e ao bem-estar social. São estes direitos que tornam reais, que operacionalizam os direitos civis e políticos. Vale lembrar que, enquanto os direitos civis e políticos exigiriam, para sua plena realização, um Estado mínimo, os direitos de 2ª geração – direitos sociais, económicos e culturais – demandam a presença de um Estado forte para a sociedade, para serem realizados. Esta é a tensão que cabe à Cidadania ir gerindo com base no diálogo e na negociação. 

Por isso, eliminar a pobreza, erradicar as desigualdades sociais, ampliar a cidadania e fortalecer a acção colectiva para negociar novos contratos sociais – com base no acesso universal à educação, à saúde e à protecção social, ao trabalho para todos, a um ambiente saudável e boa habitação, todos direitos humanos fundamentais reconhecidos, – Novos Pactos trabalho-capital, incluindo a Economia do Cuidado, no âmbito do compromisso maior de um Pacto Universal pela Sustentabilidade, pelo Futuro e pela Vida, são os passos fundamentais para garantir a criação de condições de vida e de bem-estar social numa perspectiva universal, para todos. 

As mulheres trabalhadoras e as suas lutas 

A história da celebração do Dia Internacional da Mulher, em 8 de Março, costuma ser referenciada aos acontecimentos de 8 de Março de 1957, em Nova York, quando um incêndio intencional, numa fábrica têxtil, matou 129 operárias (a maioria imigrantes), numa que foi mais uma etapa na luta das mulheres trabalhadoras pela igualdade de género nas condições de trabalho e de vida, e pelo reconhecimento da possibilidade de serem Mães e Trabalhadoras, em simultâneo. Antes dessa data, houve outros. 

A luta das mulheres trabalhadoras por igualdade de condições e oportunidades nas diversas dimensões da vida pessoal/familiar, profissional e social, e pelo seu espaço na sociedade através do trabalho e das suas capacidades de gestão e de liderança, tem outro momento histórico em 1910, quando Clara Zetkin, uma feminista marxista alemã propôs, durante a II Conferência Internacional das Mulheres em Copenhague, Dinamarca, que as trabalhadoras de todos os países organizassem um dia especial das mulheres, cujo primeiro objectivo seria promover o direito ao voto feminino. 

Em 25 de Março de 1911 ocorreu um incêndio na fábrica Triangle Shirtwaist, em Nova York, que matou 146 trabalhadores, dos quais 125 jovens mulheres, a maioria imigrantes. A tragédia fez crescer a luta das mulheres operárias americanas por condições de trabalho seguras e dignas, luta coordenada pelo sindicato International Ladies’ Garment Workers’ Union (União Internacional de Mulheres da Indústria Têxtil). 

No dia 8 de Março de 1917, sob o lema ‘Pão e Paz’, mulheres russas tecelãs, e familiares de soldados do exército, tomaram as ruas de Petrogrado (hoje São Petersburgo), indo de fábrica em fábrica e convocando os operários russos a mobilizarem-se contra a monarquia e a lutarem pelo fim da participação da Rússia na I Guerra Mundial. Em 1921, na Conferência Internacional das Mulheres Comunistas, o dia 8 de Março foi proposto, e aceite, como o dia oficial das lutas das Mulheres, em homenagem aos acontecimentos de 1917. A data foi reconhecida pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 1975. 

Todos estes eventos contribuíram não só para chamar a atenção para as lutas das mulheres trabalhadoras pelos seus direitos fundamentais, mas também para mostrar, pela prática, pela experiência vivida, a importância da acção colectiva para mudar o status quo no que se refere à luta contra a desigualdade de género, pelo bem-comum, no interesse de todas. 

Revisitando essas estórias também se aprende que o reconhecimento dos direitos e as mudanças nas legislações laborais aconteceram devido às lutas nas RUAS, o espaço público de todos, dada a inexistência das condições mais básicas para o diálogo e a negociação em espaços institucionais, nomeadamente a vontade política, o respeito e o reconhecimento. Simplesmente, porque nem governos nem patronato mostraram/mostram ter aprendido alguma coisa com mais de um século de lutas trabalhistas, contra as desigualdades de género, por estilos de vida, pelo ambiente, etc. 

Movimentos estudantis anteriores à independência de Angola 

Embora predomine a ideia de que os movimentos sociais juvenis começaram em Angola a partir de Março de 2011, importa lembrar que, não só em Luanda, milhares de estudantes estiveram envolvidos em manifestações, luto académico, greves gerais, ocupações nos Liceus e na Universidade de Luanda, etc. Em Maio de 1975, a greve geral na Universidade de Luanda teve a participação da Agronomia, curso sediado em Nova Lisboa; eu vim em representação dos meus colegas e, entre outros, conheci a Cristina Pinto e o pai do Luaty. 

Sobre este assunto, o livro Luanda 1974/1975: O Movimento Estudantil, da autoria de Leonor Figueiredo (ed. da autora, c/apoio do Instituto de História Contemporânea e da ACLUS, Associação de Cultura Lusófona), foi lançado em 12 de Maio de 2012. Em entrevista à Agência Lusa, a autora declarou: “O movimento estudantil em Angola foi muito forte naqueles anos, com embrião na Universidade de Luanda, mas alargando-se, depois do 25 de Abril, aos liceus. Houve de tudo, greves, manifestações, marchas, pancadaria, confrontos com a polícia, mas o movimento estudantil não pactuou com nenhum dos poderes, nem com o próprio MPLA, hoje no governo”. Para escrever o livro, a jornalista falou com antigos estudantes que vivem em Angola e em Portugal, enfrentando alguns obstáculos pois, segundo afirmou, ainda “há muita gente que não quer falar, que é presidente de conselhos de administração e tem outras posições importantes, e que ou fez um pacto de silêncio ou não quer recordar o passado, ou não quer ser relacionada/o com esse passado” (Agência Lusa, 28 Abril de 2012). 

Bibliografia de suporte

1 Texto adaptado de várias fontes, principalmente comunicações e matéria de aulas.

2 Os protestos foram realizados no dia 1º de Maio de 1886, a partir de uma greve dos trabalhadores, e mobilizaram milhares de pessoas que voltaram a protestar nos dias 3 e 4 de Maio. No dia 4 de Maio, os trabalhadores reuniram-se na Praça Haymarket e, durante o protesto que ocorria pacificamente, uma bomba explodiu matando e ferindo manifestantes e polícias. A reação policial foi violenta, os polícias presentes abriram fogo contra os manifestantes, o que resultou em dezenas de mortes (centenas segundo algumas fontes). Seguiu-se uma forte repressão contra as organizações de trabalhadores inspiradas em ideais anarcossindicalistas e socialistas e a prisão de todos os líderes anarcossindicalistas; foi realizado um julgamento que condenou 4 deles à morte, por causa da explosão, embora durante o julgamento não tenha sido provada a relação desses trabalhadores com o incidente.

Os “Dias Internacionais” visam sensibilizar o público em geral sobre temas de interesse e de bem-comum, como direitos humanos, desenvolvimento sustentável, educação, saúde, grupos com necessidades especiais, etc. Visam, igualmente, chamar a atenção dos meios de comunicação social e, especialmente, dos governos, para os tantos problemas não resolvidos que requerem a implementação de medidas políticas concretas e a denúncia dos incumprimentos. 

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