Nem tudo está mal (parte II)

JAcQUEs TOU AQUI!

Jacques Arlindo dos Santos

“O homem faz o mal, porque não sabe o que é o bem”.

 Sócrates

Ponto prévio: O texto abaixo, não chegou ao conhecimento público, por decisão do autor, em virtude dos acontecimentos ocorridos na semana finda.

Em boa verdade, de um modo geral e pelo menos a meus olhos, nem tudo está mal por cá. Embora o estar bem ou mal seja relativo, o certo é que para aqueles que, apesar de todas as dificuldades que se sentem, vêm a vida em tons cor-de-rosa, ela vai muito bem, ao passo que aqueles que só têm o cinzento no horizonte (a grande maioria), vêm-na a andar quase sempre para trás, o que quer dizer, muito mal. Explicando-me melhor. 

Vejamos, por exemplo, o caso dos cidadãos que se acomodaram na vida, graças ao modo incrível como se “organizaram” na sociedade. Para essas pessoas, a vida tem estado “incrivelmente” muito boa. Olhando com cuidado para determinados casos, até apetece dizer que há coisas acontecidas aqui que parecem mágicas! “É a inveja a falar”, gritarão furiosos os visados, quase sempre os mesmos, a replicar quando se abordam as questões de dinheiro e modo da sua acumulação menos claro, artífice da boa vida dos fulanos em causa. 

Quem me conhece bem não apoiará esse pretexto, porque sabe que não sou cobiçoso faminto. Pugno pela decência e só pretendo mesmo o melhor para a nossa terra e para todos nós. Há muito que clamo por igualdade de oportunidades e a felicidade para quem trabalha e merece. 

Indo ao cerne da questão, direi que na sua heterogeneidade, no grupo dos “organizados” destacam-se os que agem como se o tempo tivesse parado aqui. Estando bem economicamente, essas pessoas nem sempre estão bem com a sua consciência. Não se importam e é assim que, sem maka e com o desplante conhecido, mostram o quanto são falhos de opinião e atitude  em relação à evidência da História que está a seguir o seu curso imparável; sem problemas, exibem, não raro, reportório deplorável lançado “através” e por causa de cargos que ocupam ou ocuparam, funções que exercem ou exerceram, influências de compadrios fortes, sólidas amizades, laços parentais ou militantes. Impressionam pela arrogância e utilização de narrativa bárbara, inapropriada, repleta de “nós” e “eles”, distinguindo chico-espertos e boelos quando não mais tragicamente, fazem declarações sobre a reconciliação nacional. Ela é, para os “organizados” e afinal de contas, uma autêntica falácia. Sem inteligência que lhes permita folhear bem as páginas dolorosas da história recente, não se incomodam nem estão aí para o que se venha a pensar deles, muito menos em saber se o resto da malta passa bem sem escola e trabalho e se em matéria de fome, nem por isso; se se está mal ou mais ou menos, em termos de saúde. O importante é que a si e aos seus não falte nada.

São cabeças formatadas para uma sociedade sui-generis, criada num modelo político para uma estranha forma de viver. Distantes dos “outros” habitam um mundo virtual de apartheid oficioso. Apesar da mudança dos tempos, não se apercebem dos novos rumos, nunca entenderão de uma forma humanista, o que se passa em seu redor. De per si ou em grupos, estão alheios às coisas simples, não entendem a vida e as suas crises, dificilmente incorporam no seu discurso igualdade, patriotismo, democracia, dignidade e unidade. Não compreendem que apesar das coisas boas que se vêem e das quais usufruem fartamente, há muitas outras que estão mal no nosso país, entre elas o cultivo exacerbado do ódio e da vingança. Vícios equiparados à ignorância pura e selvagem, ao alcoolismo e ao consumo de drogas, causadores naturais dos maiores prejuízos materiais e humanos sofridos pelo país. Não é exagerada a comparação, como não é pecado admitir-se essa cruel realidade.

Obviamente, admiram e realçam, tal como o faço agora, tudo o que se está a fazer de bom, aquilo que entendemos, eles e eu, que está bem feito. Nesse ponto, estamos plenamente de acordo. Olhamos e saudamos a edificação das importantes infra-estruturas nos sectores da saúde (mesmo viciadas pelo handicap dos recursos humanos), dos transportes e comunicações, da agricultura, da indústria têxtil e das várias fábricas, do comércio e das obras públicas (comércio de grande escala e obras majestosas que despoletam contestação e invejas, como é consabido) e algumas outras da grandeza do consórcio do corredor do Lobito, das barragens, das refinarias e das centrais de energia solar que se implantam e se projectam pelo país afora (estádios de futebol, aeroportos, recuperação de estruturas culturais e grandes estradas). Bravo! Tudo grandioso, à dimensão da portentosa Angola. 

Apesar da pandemia da Covid-19 e suas funestas consequências, o PIB (produto interno bruto) apresenta-se em ritmo crescente, satisfazendo cabalmente o desempenho da nossa economia. Oxalá se ajuste esse crescimento à redução das desigualdades na sociedade (um dos nossos maiores desafios e da própria economia mundial) e se atenda, assim, às inúmeras e elementares necessidades da população. 

Não nos esqueçamos, por isso, do quase vazio observado na educação (em primeiro lugar na pauta das grandes carências com destaque para a formação técnico-profissional) na segurança social, na cultura, no saneamento básico das grandes urbes, no emprego e na habitação, por exemplo. Não olvidando também que um país com melhor desporto (e onde há grande vocação para ele) é um país mais desenvolvido. E que devia ser hora da comunicação social estatal abrir portas ao civismo e aproximar-se da educação da população.

Fica claro, sem dúvidas, que governar não é tarefa fácil (quem desconhece isso?) e obriga a quem pretenda fazê-lo com responsabilidade (exigência da sociedade, que pede mais que o esforço e a sabedoria dos quadros de um só partido, humanamente incapazes de corresponder às necessidades da governança do país), a dar atenção e tratamento às inúmeras áreas do aparelho do Estado e estabelecer, sem complexos de qualquer espécie, alianças com a massa pensante do país (participação social na governação), no sentido da reformulação do que não está bem. E ter sempre presente que, por muito que se vá fazendo, é necessário, para além de competência e clareza na acção, mais empenho, adopção de métodos expeditos, forças da ordem disciplinadas, autoritárias e modernas, libertação de muitos mais recursos, menos esbanjamento em actos escusados e em áreas não prioritárias, algumas delas desnecessárias. 

Estas ideias não representam senão desabafos de um cidadão que observa os vazios que nos cercam e que, neste momento crucial da nossa existência, se acha no direito de as dividir com os seus conterrâneos. Fá-lo no exercício pleno da sua cidadania, convicto de que torna público o seu entendimento em benefício da sociedade angolana. Por haver ainda matéria, voltarei a este tema na próxima semana. Enquanto isso, despeço-me dos meus estimados leitores, companheiros de luta e amigos. Espero por todos, no próximo domingo, como sempre, à hora do matabicho.

Luanda, 16 de Julho de 2022 

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