HOJE, 22 DE ABRIL, É O DIA MUNDIAL DA TERRA

A construção de uma sociedade sustentável assenta no entendimento de um ambiente saudável como condição necessária para o nosso bem-estar, para o funcionamento da economia e para a sobrevivência da vida na terra.

CESALTINA ABREU

Independentemente “do dia”, todos os dias são dias de nos preocuparmos com o que de facto conta: Viver a Vida, e vivê-la da melhor maneira possível, de acordo com os critérios e estilos de vida de cada um, mas acredito que todos desejam uma ‘boa vida’.

Neste dia em particular, como acontece em relação a outras ‘datas consagradas’, preocupo-me em organizar, para partilhar, algumas reflexões sobre o tema. Assim, escrevo textos, seleciono imagens e partilho-os com família, amigos, colegas de trabalho, estudantes, etc.

Este ano, ainda no turpor da notícia que nos acordou ontem cedo: “Morreu Francisco, o Papa”, que entre outras referências e legados, não se cansava de chamar a atenção para a urgência de cuidarmos “da nossa casa comum” (“Laudato si”, 24 de Maio de 2015), eu comecei por reler todos os textos que já escrevi sobre este tema. Para não me repetir, embora este tema, como tantos outros, precisem de ser repetidos à exaustão no sentido de despertar as consciências dos decisores políticos, mas não só, sobre a urgência da tomada de medidas que reduzam os efeitos das alterações climáticas e que se assumam medidas de sustentabilidade, tão presente nos discursos, mas sem acções que permitam compreender o que é, e o que fazer para a alcançar.

“O ‘ambiente’ é onde nós vivemos;

‘desenvolvimento’ é o que todos nós fazemos na tentativa de melhorar a nossa quota-parte no âmbito dessa residência.

Os dois são inseparáveis.”

(adaptação livre do The Brundtland Commission report Our Common Future, 1987).

Segundo este Relatório, o desenvolvimento sustentável é concebido em 3 dimensões: ecológica, económica e sociopolítica. Uma análise crítica das 3 dimensões pode levar a uma definição operacional para os interesses de sociedades mais pobres no cenário geopolítico actual. Na dimensão sociopolítica há 2 tipos de poderes: (a) o poder de grupos e classes sociais em estabelecer relações de dominação, e (b) o poder sobre os recursos naturais e a relação entre conhecimento e poder sobre a natureza.

Essa distinção é importante devido às relações desiguais de dominação entre ricos e pobres, e aos conhecimentos que as populações “autóctones” têm sobre os “seus” recursos naturais. Compreender o poder sobre esse conhecimento pode ser a chave para um desenvolvimento realmente local e sustentável. Também porque o poder universal (do capitalismo e tecnológico) sempre gerou resistências e oposições que, ignoradas no passado, ressurgiram e confrontaram-se com o poder central e hegemónico. Isto revela uma oportunidade à participação da sociedade civil na busca de alternativas à globalização hegemónica e desigual.

O conhecimento das comunidades locais sobre a natureza tem sido ignorado pela hegemonia do conhecimento científico racional, universal e instrumental, mas a utilização desse conhecimento local é fundamental para a construção de um novo paradigma científico subjacente ao Desenvolvimento Endógeno. Para as sociedades africanas, tendo como referência o UBUNTU, o conceito de cultura inclui valores que enfatizam: 1) a importância da comunidade sobre o indivíduo; 2) uma visão cíclica e não unilinear de “desenvolvimento” (uma vida melhor); 3) as noções de “estar” e “ser”, em vez de, “ter” ou “fazer”; 4) uma noção de harmonia com, e não de dominação – ou destruição – da natureza.

Uma Estratégia de Desenvolvimento Sustentável assenta no princípio de garantir que as pessoas desenvolvam o conhecimento, os valores e as habilidades para participar das decisões sobre o que fazer e como fazer, individual e colectivamente, local e globalmente, para melhorar a qualidade de vida respeitando o Planeta, as demais formas de vida com as quais partilhamos “a nossa casa comum”, e sem comprometer o Futuro. Precisamos de uma Educação que equilibre o bem-estar humano com a economia, as tradições culturais e o respeito pelos recursos naturais da Terra; que adopte métodos e abordagens interdisciplinares para desenvolver uma ética de aprendizagem ao longo da vida, e para promover o respeito pelas necessidades humanas compatíveis com o uso sustentável dos recursos naturais e as possibilidades do Planeta. E, fundamental também, que contribua para a recriação de um sentimento de Solidariedade Universal.

Na encíclica já citada, o Papa dizia: “Lanço um convite urgente a renovar o diálogo sobre a maneira como estamos a construir o futuro do planeta. Precisamos de um debate que nos una a todos, porque o desafio ambiental, que vivemos, e as suas raízes humanas dizem respeito e têm impacto sobre todos nós. (…) Precisamos de nova solidariedade universal” (Laudato si, 2015).

Valorizar a interdisciplinaridade e a transversalidade, como eixos estruturantes dos programas curriculares e dos estudos e pesquisas, permitirá criar capacidades para identificar e abordar os temas a reflectir e debater, promovendo a inclusão do contraditório e o respeito pela diferença e pela diversidade.

A construção de uma sociedade sustentável assenta no entendimento de um ambiente saudável como condição necessária para o nosso bem-estar, para o funcionamento da economia e para a sobrevivência da vida na terra. Mas a nossa vida – individual e social – não se limita às funções biológicas e à relação produção-consumo. Como nos ensina o UBUNTU, precisamos de cooperação, de compaixão e de solidariedade, valores vitais para a sobrevivência e a qualidade de vida. Precisamos de participação consciente e activa nas decisões sobre a nossa própria vida e a vida colectiva, para dar sentido à ideia de Humanidade partilhada.

Acima de tudo, precisamos de um sistema político capaz de pensar, escutar, dialogar, planear, coordenar e orientar a acção dos milhares de agentes autónomos, conhecedores dos seus recursos, necessidades e possibilidades. E fazê-lo de uma maneira democrática e holística, no sentido nacional e supranacional. Um sistema político que valorize os conhecimentos autóctones, que dê espaço à inovação e à criatividade, que incentive o debate, a troca de experiências, o trabalho em equipa. Só assim será possível criar, e manter, as condições para a construção dos consensos necessários, e sempre em actualização, visando o fortalecimento da democracia na política, da equidade na sociedade, da eficiência na economia, da diversidade nas culturas, e da protecção e conservação no ambiente.

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