Numa época em que as barreiras geográficas e culturais são superadas pelos recursos disponibilizados pelas novas tecnologias, estas, conjuntamente com outras linguagens, passaram a integrar o discurso artístico e estético da CDC de Angola, onde o corpo e o movimento constituem o elemento catalisador.
“O VENDEDOR DE INUTILIDADES“
A Companhia de Dança Contemporânea de Angola apresentará, nas semanas de 08 a 11 e de 14 a 18 do mês de Maio, na Sky Gallery (Edifício Escom), a sua Temporada de 2025. Com a duração aproximada de uma hora, o espectáculo intitulado “O Vendedor de Inutilidades”, questiona os limites entre o mundo físico e o virtual, propondo uma reflexão sobre a identidade na era digital.
De acordo com uma nota de imprensa distribuída pela sua área de comunicação e marketing, “o espetáculo mergulha num universo onde a tecnologia redefine a maneira como nos vemos e nos relacionamos”. Em cena, refere-se, “a fronteira entre a presença e a ausência é desfocada, expondo um conjunto de personagens que oscilam entre o tangível e o efémero, entre o humano e o sintético”.
Com coreografia de Andy Rodriguez, a peça integra os bailarinos Andy Rodriguez, António Sande, David Daniel, Gabriel Lopes, Jéssica Sanga, José Ndumbu, Marcos Silva e Samuel Curti da CDCA. A videografia é de Alexis Anastasiou e a produção executiva de Jorge António.
A luta do ser humano para não ser absorvido pelo mecânico
Questionando os limites entre o mundo físico e o virtual, a peça “O Vendedor de Inutilidades” propõe uma reflexão sobre a identidade na era digital.
No diálogo entre simulacro e essência, define-se a promessa de liberdade, enquanto um poder invisível se dissolve à medida que as escolhas parecem pré-definidas e moldadas por algoritmos que antecipam desejos antes mesmo que surjam. A atração pelo consumo, refere a argumentação da CDCA, “impõe-se como força dominante onde o novo, o instantâneo ou o descartável seduzem e envolvem, enquanto a identidade se dilui na repetição e na necessidade de actualização constante”.
De acordo com a CDCA, “a hiperconexão, em vez de unir, isola; vivemos agora na promessa utópica de um mundo sem limites onde as emoções, antes intensas, são programadas e repetitivas”. O corpo orgânico, na óptica da argumentação, “vai revelando a influência das redes sobre a sua autonomia. O desejo de pertença é confundido com a aceitação de um modelo imposto, onde a liberdade prometida se torna apenas uma ilusão bem construída”.
A CDCA sustenta que, “neste processo de adaptação ao caos, constrói-se uma tensão entre a resistência e a entrega à perfeição do artificial. O que antes parecia familiar dilui-se numa realidade abstrata, onde o ser humano luta para não ser absorvido pelo mecânico. Mas, no final, o palco da realidade esvazia-se e os corpos desintegram-se, como se restassem apenas vestígios de uma existência consumida pela lógica informática”.
“Num tempo em que tudo pode ser simulado, o que ainda será autêntico e nos torna únicos?” – questiona, finalmente, a CDCA. A resposta, poderá ser encontrada no desenrolar da peça que, como outras a que nos habituou esta companhia, conduz a assistência numa prazerosa viagem de análise, reflexão e interligação de dois mundos, o real e o virtual.
Sobre a CDCA
Fundada em 1991, pela coreógrafa Ana Clara Guerra Marques, a Companhia de Dança Contemporânea de Angola edificou, através de um percurso de inovação e singularidade, uma história exclusiva que faz dela um colectivo histórico e único, num contexto artístico que permanece frágil, conservador e fortemente cunhado pelas danças patrimoniais e recreativas urbanas e pela ausência de um movimento de criação de autor, no plano da dança.
Ao longo destes 33 anos de existência, esta companhia tem ocupado um lugar privilegiado na História de Angola, ao ter semeado o “novo” no vasto terreno da dança, onde continua a desenvolver um trabalho artístico único e original, provocando uma ruptura estética na cena da dança angolana, e com a intenção de deslocar a dança para fora dos palcos interiores dos teatros, introduzindo o público em diferentes formas e conceitos de espectáculo.
A partir de 2009, tornou-se numa companhia de Dança Inclusiva, inaugurando o regime de temporadas e criando uma linha de trabalho que, dispensando as narrativas de estruturação convencional, preferencia propostas que confrontam o público com as suas próprias histórias, aspectos do seu quotidiano, das suas realidades sociais, da sua condição de cidadãos de universos que se cruzam.
Numa época em que as barreiras geográficas e culturais são superadas pelos recursos disponibilizados pelas novas tecnologias, estas, conjuntamente com outras linguagens, passaram a integrar o discurso artístico e estético da CDC Angola, onde o corpo e o movimento constituem o elemento catalisador.
A utilização da dança como meio de intervenção social, expondo o Homem enquanto cidadão do mundo e protagonista da cena social angolana, é a marca desta companhia, galardoada, em 2017, com o Prémio Nacional de Cultura e Artes.
Do seu longo historial contam centenas de espectáculos apresentados em Angola e no exterior, sendo hoje a referência da dança cénica angolana no mundo, como revelado nas peças Mea Culpa (1992); Imagem & Movimento (1993), Palmas, por Favor! (1994); Neste País… (1995), Agora não dá! ‘Tou a Bumbar… (1998), Os Quadros do Verso Vetusto (1999), O Homem que chorava sumo de tomates (2011), Solos para um Dó Maior (2014), Ceci n’est pas une porte (2016), O monstro está em cena (2018), Isto é uma mulher? (2022), Onde o vento não sopra (2024) e, agora, O Vendedor de Inutilidades (2025). Mas também em Corpusnágua (1992); Solidão (1992); 1 Morto & os Vivos (1992), 5 Estátuas para Masongi (1993) Introversão versus Extroversão (1995) ou Ogros… da Oratura… e do Fantástico (2008).
Fonte: CDCA
Fotos: Rui Tavares
