A semente do futuro
Os países que priorizam políticas públicas e investimentos sérios para manter as meninas na escola, geram benefícios duradouros para a saúde e o desenvolvimento integral dos indivíduos, das famílias e das comunidades.
Estudos realizados por agências das Nações Unidas e organismos internacionais em países de África, América Latina, Médio Oriente e Sudeste Asiático apontam para uma relação sólida e positiva entre um maior desempenho educacional das meninas e comportamentos sexuais e reprodutivos mais saudáveis, incluindo o uso correcto de contraceptivos.
A educação das meninas contribui para aumentar a equidade de gênero, incrementando a capacidade de participarem na tomada de decisões que envolvem as suas famílias e o desenvolvimento das comunidades em que estão inseridas.
Os benefícios da educação das meninas vão além das conquistas pessoais, influenciando também a economia doméstica. Em países organizados, para cada ano adicional de escolaridade, em média, um profissional pode beneficiar de aumentos salariais em torno dos 10%.
O acesso a serviços de saúde e educação de qualidade é fundamental para ajudar as meninas a evitar uma gravidez precoce e a concluir pelo menos o ensino médio, sem grandes constrangimentos e com uma sólida formação integral.
Mas existem alguns factores determinantes que não devem ser ignorados para que a educação e a saúde das meninas não estejam comprometidas logo à nascença:
1– Disponibilidade de água potável nas comunidades e nas escolas.
2– Aprovação de programas integrados de educação e saúde menstrual, particularmente nas periferias das grandes cidades e nas zonas rurais.
3– SUBVENÇÃO DOS ABSORVENTES (pensos higiénicos) para as meninas das famílias mais desfavorecidas.
A solução passa por uma nova abordagem do problema, sendo recomendável a adopção de um modelo de gestão dos sistemas de distribuição de água e do saneamento básico, incluindo a construção de lavabos apropriados e balneários públicos, lavandarias e cozinhas comunitárias, com base na partilha de responsabilidades entre a FAMÍLIA, a ESCOLA, a COMUNIDADE e a ADMINISTRAÇÃO.
Só assim será possível inverter, em tempo útil e de modo sustentável, o actual cenário nauseabundo e virulento que caracteriza as casas de banho das escolas públicas, facto que constitui um atentado inqualificável à saúde e à dignidade da pessoa humana.
As falhas crónicas no abastecimento de água e no saneamento básico afectam de forma avassaladora o funcionamento das unidades sanitárias das redes primária e secundária, com realce para os centros de saúde materno-infantil que atendem diariamente milhares de gestantes e recém-nascidos, muitas vezes em condições desumanas por falta de recursos essenciais.
A situação é por demais dramática nos bairros desordenados das periferias marginalizadas, onde reside a maioria da população com sérias dificuldades para obter água em condições minimamente aceitáveis, apesar das largas centenas de milhões de dólares gastos em projectos megalómanos que foram amplamente propagandeados e vergonhosamente abandonados, como o programa ÁGUA PARA TODOS. Lembram-se?!
O mesmo pode ser dito em relação aos incontáveis “modelos de limpeza” das cidades e arredores, adoptados a partir da década de 1990. Em boa verdade, tudo não passou de um estratagema que propiciou o surgimento de centenas de operadoras de limpeza que custaram aos cofres do Estado largos milhões de dólares, sem quaisquer melhorias no saneamento em todas as cidades, vilas e aldeias de Cabinda ao Cunene.
Como resultado, duas décadas depois da conquista da paz, a malária, as diarreias e as doenças respiratórias agudas continuam a liderar o ranking das principais causas de morte em Angola, atingindo particularmente as crianças, apesar dos incessantes “esforços” do Governo e das “generosas” contribuições da comunidade internacional.
Quase nunca são divulgados dados referentes às doenças urinárias por falta de higiene pessoal adequada. O gráfico das DST (Doenças Sexualmente Transmissíveis) mantém-se assustador devido à degradação das condições de vida da maioria das famílias, o que torna mais difícil uma boa educação das meninas, aumentando o risco de relações sexuais precoces. É por isso que a gravidez na adolescência, os partos prematuros e a transmissão do vírus da SIDA de mãe para filho deixaram de ser notícia.
Os números da desnutrição aguda abarcam cerca de 50% das crianças angolanas, muitas das quais não chegam aos cinco anos de vida. Aquelas que conseguem vingar crescem vulneráveis a todo o tipo de doenças infecciosas devido à escassez de nutrientes. A merenda escolar está longe de compensar a fraca dieta alimentar das famílias, na medida em que milhares de alunos em todo o país assistem as aulas com fome.
Esta situação torna-se mais grave com a falta de água e a deficiente (ou inexistente) higiene em grande parte das escolas, uma das causas dos níveis questionáveis de aproveitamento escolar. Para engordar e enfeitar as estatísticas, muitos alunos passam de classe mesmo sem aprenderem o essencial. O abandono escolar também se mantém em níveis preocupantes e as meninas são as mais prejudicadas.
Perante este quadro desolador, torna-se imperioso promover uma ampla campanha pela EDUCAÇÃO DAS MENINAS, criando um novo traço de união entre autoridades públicas, as organizações da sociedade civil, as associações empresariais, as igrejas e as agências internacionais.
Uma vez que não se pode dissociar a educação da saúde, higiene e nutrição, a campanha pela educação das meninas deve ter como ponto de partida, a criação de condições para assegurar a disponibilidade de água potável em todas as escolas.
Trata-se da condição sine qua non para a garantia de uma educação saudável, alicerçada em valores nobres, tendo como foco o bem-estar das crianças e, sobretudo, das jovens mulheres, as únicas geradoras do capital humano indispensável para salvar Angola e os angolanos.
P.S. – Sou pai de três meninas, tenho cinco irmãs e a minha querida MÃE é tão somente a matriarca de meia centena de cidadãos de quatro gerações e várias nacionalidades em três continentes.