DIA INTERNACIONAL DA MULHER RURAL

Segundo o Censo 2014, 52% da população residente em Angola são mulheres, e elas são a grande maioria dos pobres, dos destituídos, dos discriminados, dos excluídos. Em 2024, Angola está na posição 113 entre 145 países, do Índice Global de Paridade do Género, do Fórum Económico Mundial (World Economic Forum, 2024).

CESALTINA ABREU

O Dia Internacional da Mulher Rural é celebrado anualmente a 15 de outubro para chamara a atenção para a importância que a mulher tem na comunidade e o seu papel essencial na actividade agrícola, no sustento familiar e na gestão dos recursos naturais. As mulheres representam uma proporção substancial da força de trabalho agrícola, sendo nelas que recai igualmente a responsabilidade do trabalho doméstico das famílias e dos agregados familiares nas zonas rurais.

Dados de 2018 que não consegui actualizar caracterizam a situação mundial das mulheres rurais como marcada pelas desigualdades de acesso a recursos e poder de decisão, além de serem afectadas de forma desproporcional pela pobreza e insegurança alimentar (1):

• Cerca de um terço das mulheres no mundo trabalha na agricultura, mas têm menos acesso à terra, finanças, equipamentos, mercados e poder de decisão;

• Apenas 15% das terras pertencem a mulheres;

• Em países em desenvolvimento, 43% dos trabalhadores agrícolas são mulheres, mas a esmagadora maioria não tem direito à terra, tem acesso limitado a água, sementes e fertilizantes, e praticamente nenhum acesso a crédito e a treinamento;

• As mulheres rurais são afectadas de forma desproporcional pelos desastres relacionados com as alterações climáticas; a situação de seca e de fome no Sul de Angola tem-nos mostrado tristes exemplos;

• As mulheres rurais apresentam indicadores piores do que os dos homens rurais ou as mulheres urbanas em quase todas as medidas de ‘desenvolvimento’.

Nascer menina e crescer mulher ainda constitui motivo para exclusão e marginalização décadas após o fim da guerra civil, quando a expectativa era a de, finalmente, termos a sociedade justa que a luta anticolonial e a guerra após a independência prometiam tornar possível. Apesar dos inegáveis ganhos sociais do fim da guerra-civil, a prevalência de uma economia “extractivista” e a ausência de políticas públicas de conciliação e de construção da nação, promotoras de confiança e de tolerância, e que criassem oportunidades para a participação – aos mais diversos níveis – nos processos de tomada de decisão sobre questões de interesse geral, e restituíssem a auto-estima ao povo, têm como resultado mais visível um défice de cidadania com um acentuado viés de género em resultado de distorções históricas que retiraram da mulher o exercício da cidadania e o desenvolvimento das suas potencialidades pela simples razão de terem nascido mulheres (‘Xé Minina num fala política’, Cesaltina Abreu, 2014).

Na sociedade angolana prevalece a noção de que “política” é uma atribuição exclusiva dos “políticos”, membros de partidos políticos, não cabendo ao cidadão comum – e muito menos às mulheres – pronunciar-se publicamente sobre questões de interesse geral ou de grupos específicos da população. A persistência desta noção na sociedade tem um papel inibidor do exercício da cidadania e da constituição de formas colectivas de intervenção pública na luta por uma sociedade mais justa em Angola.

Segundo o Censo 2014, 52% da população residente em Angola são mulheres, e elas são a grande maioria dos pobres, dos destituídos, dos discriminados, dos excluídos. Em 2024, Angola está na posição 113 entre 145 países, do Índice Global de Paridade do Género, do Fórum Económico Mundial (World Economic Forum, 2024).

A mudança desta situação passa, entre outras medidas, pelo investimento sério na educação como política pública, incluindo acção afirmativa para inclusão das mulheres e meninas, particularmente nas áreas rurais. A Educação é o caminho para mudar as pessoas, para interromper os ciclos de reprodução da pobreza e das desigualdades sociais. Durante os anos de trabalho no campo como agrónoma (1975-1983) e depois na Assistência Técnica e no acompanhamento de programas locais ou regionais, ainda na agricultura (até 1991), mais tarde no MINPLAN e, particularmente no FAS (1994 a 2000), eu aprendi que a Escola pode até existir, estar perto da casa, e pode até ter aulas à noite, mas a menina não irá à escola, ou irá desistir a meio do ano lectivo, e a mãe e as irmãs mais velhas, não irão à noite as aulas de alfabetização por alguma das seguintes razões, ou por elas todas /ou algumas combinadas:

As meninas:

a) Precisam cuidar dos mais novos, precisam ajudar as mães na venda, precisam ajudar a ‘cartar’ água e a lenha … isso aplica-se nas aldeias do meio rural e nas áreas periféricas (mas não só) das cidades;

b) As famílias cada vez mais empobrecidas, continuam a privilegiar a escola para os rapazes, seguindo a velha ideia de preparar o “provedor da família”;

As Mães e Irmãs mais velhas:

a) Têm de assegurar os cuidados – todos – com a família, desde a maternidade, ao cuidado dos menores, a educação e a saúde, a produção de alimentos no arimbo, para alimentar a família e para vender eventuais excedentes;

b) Têm de assegurar a água (até para o banho dos homens) e a lenha. São, ainda, quem está por perto quando é preciso acudir a emergências na aldeia ou no bairro. As distintas instâncias da socialização entre homens e mulheres em que estas dimensões se reflectem – família, escola, local de trabalho, estruturas comunitárias e associativas -, constituem desafios ainda mais acentuados no meio rural, sendo de destacar os seguintes:

  • Como enfrentar as estruturas patriarcais predominantes na família em África?
  • Como desconstruir as desigualdades de oportunidades das meninas em todos os domínios, incluindo no lazer?
  • Como acabar com todas as formas de opressão e de violência nos agregados?
  • Como reverter a situação dominante dos papéis de usuárias para as mulheres e de gestores para os homens?
  • Como alterar as formas de representação nas estruturas políticas formais dos distintos níveis de poder?

(1https://apolitical.co/solution-articles/pt/rural-mulheres-quarto-global-populacao-politica-ignoradahttps://unric.org/pt/dia-internacional-das-mulheres-rurais/

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