PRIMEIRO DE MAIO, HONRANDO AS LUTAS!

Novos Pactos trabalho-capital, são fundamentais para garantir a criação de condições de vida e de bem-estar social para todas e um Pacto de Compromisso com o Futuro, visando ampliar a satisfação das necessidades de hoje sem colocar em causa as necessidades de amanhã e em alinhamento com a Agenda 2063.

CESALTINA ABREU

Foi assinalado ontem mais um 1º de Maio. Por aqui, no rescaldo de dois eventos memoráveis: um promissor encontro sobre o estado do direito a ter direitos em Angola e estratégias para uma necessária concertação social, promovido pela Ordem dos Advogados de Angola, e o fim da 2ª fase da greve geral sem acordo à vista entre as centras sindicais e o governo, em que os trabalhadores se declaram prontos para encarar a 3ª etapa, no início de Junho, caso se mantenha o impasse.

“Fora de portas” a CSI (Confederação Sindical Internacional) declarou que “Não há democracia sem sindicatos” e lança uma campanha “Pela Democracia” (ver tradução do comunicado).

Um pouco de história

Os séculos XIX e XX foram palcos de eventos e processos como a urbanização, a industrialização, a formação e propagação pelo mundo do modelo de Estado-Nação ‘ocidental’, e a expansão do capitalismo, que transformaram radicalmente as formas pelas quais as pessoas se relacionavam, se percebiam e se constituíam enquanto sujeitos colectivos.

As datas de 8 de Março de 1857 e o 1º Maio de 1886, em New York e em Chicago respectivamente, recordam momentos históricos nas lutas dos/das trabalhadores/as por condições de vida e de trabalho dignas; em 8 de Março, a luta das mulheres trabalhadoras pela igualdade de género nas condições de trabalho e de vida, e pelo reconhecimento da condição de possibilidade de serem mães sem terem de deixar de ser trabalhadoras.

As leis trabalhistas que hoje temos, a duração da jornada de trabalho, o direito a melhores condições nos locais de trabalho, a possibilidade de as mulheres conciliarem trabalho e maternidade, as férias, entre outras causas, resultaram de movimentos que foram protagonizadas por centenas de milhares de pessoas em todo o mundo, durante o final do século XIX e o século XX.

Da mesma forma, o direito ao sufrágio universal e, dentro desta luta, o direito de voto às mulheres, foram igualmente conseguidos na RUA, por movimentos sociais.

Os Direitos Civis (séc. XVIII) contemplam os direitos individuais à vida, segurança, liberdade, igualdade, propriedade, ir e vir, etc. Os Direitos Políticos (séc. XIX), dizem respeito à liberdade de associação e reunião, de organização política e sindical, à participação política e eleitoral, ao sufrágio universal, etc. São direitos individuais exercidos colectivamente.

Só no século XX, através de lutas dos movimentos sociais, feministas, operário e sindical foram conquistados os direitos sociais, económicos, culturais (2ª geração de direitos), que representam o acesso aos meios de vida e ao bem-estar social. São estes direitos que tornam reais, possíveis, os direitos civis e políticos.

Vale lembrar que, enquanto os direitos civis e políticos exigiriam, para sua plena realização, um Estado mínimo, os direitos de 2ª geração – direitos sociais, económicos e culturais – demandam a presença de um Estado forte para serem realizados. Esta a tensão que cabe à cidadania ir gerindo com base no diálogo e na negociação. Daí a importância da institucionalização de instâncias de diálogo, de participação, de negociação entre as partes interessadas.

O que precisamos fazer para seguir em frente?

Eliminar a pobreza, erradicar as desigualdades sociais e expandir a cidadania, negociar as condições para garantir o acesso universal à educação, à saúde e à proteção social, a um ambiente saudável, à boa habitação, ao trabalho para todos, à redistribuição da riqueza gerada, como direitos humanos fundamentais, são condições necessárias para o fortalecimento da democracia.

Novos Pactos trabalho-capital, são fundamentais para garantir a criação de condições de vida e de bem-estar social para todas. Venho propondo que nos atribuamos a missão de lutar pela construção social de um Pacto de Compromisso com o Futuro, visando ampliar a satisfação das necessidades de hoje sem colocar em causa as necessidades de amanhã e em alinhamento com a Agenda 20631.

Na procura dos caminhos, desejavelmente novos, para a construção de um futuro para todos nós, que não deixe ninguém de fora nem para trás, inspiro-me em líderes africanos como Amílcar Cabral2, Nelson Mandela3, Thomas Sankara4, pela coragem em enfrentar o status quo e propor novas formas de pensar, estar e ser, em África e, a partir da África, na e com a Humanidade e no UBUNTU5.

Um Pacto de Compromisso com o Futuro, como o que defendo como necessário para Angola, pode entender-se como um processo de amplos debates centrados na construção social e inclusiva da Nação e com orientações, objectivos estratégicos e compromissos imediatos, constituindo-se numa carta de referência para todos os angolanos e seus parceiros. Concebido e implementado, em geral, numa lógica de ‘geometria variável’, visaria alcançar entendimentos e acordos, os mais amplos possível, bem como a coordenação de esforços para o desenvolvimento sustentável de Angola.

1.05.2024

Primeiro de Maio de 2024 – Sindicatos pela Democracia

Tradução do comunicado da CSI

Não há democracia sem sindicatos: esta é a mensagem que o movimento sindical mundial quer transmitir neste Primeiro de Maio.

O objectivo da campanha “Pela Democracia” da CSI6 é que os sindicatos ajam agora para travar a deterioração alarmante da democracia e o aumento simultâneo dos ataques aos direitos dos trabalhadores.

O relatório sobre o Estado da Democracia Mundial 2023 revela que a democracia está em declínio em todas as regiões do mundo. Desde 2018, cada vez mais países estão a registar declínios em vez de melhorias nos processos democráticos todos os anos.

Esta tendência antidemocrática é acompanhada por ataques globais aos direitos sindicais. O Índice Global de Direitos da CSI tem vindo a acompanhar a deterioração da situação há mais de uma década. Em 2023, as violações de medidas fundamentais atingiram níveis sem precedentes: 87% dos países violaram o direito à greve, enquanto 79% violaram o direito à negociação colectiva.

O respeito pelos direitos dos trabalhadores, a elevada densidade sindical e a cobertura dos acordos colectivos conduzem a uma distribuição mais equitativa da riqueza e a uma maior confiança do público nas instituições democráticas. O Instituto V-Dem cita a Noruega, por exemplo, como um modelo notável de democracia deliberativa e equitativa devido à sua elevada densidade sindical e à cobertura da negociação colectiva.

O Secretário-Geral da CSI, Luc Triangle, afirmou: “Os sindicatos são o maior movimento social do mundo. Incorporamos e praticamos os valores democráticos todos os dias e é altura de reafirmarmos o nosso compromisso de defender e promover estes princípios a nível mundial. A democracia não é apenas um ideal político, mas uma realidade vivida, e os trabalhadores estão numa posição única para a defender e melhorar”.

“Neste Primeiro de Maio, recordemos o papel essencial que os sindicatos têm desempenhado na promoção da democracia e na mobilização para garantir e fazer avançar os valores democráticos para o futuro.”

A campanha “Pela Democracia” da CSI visa reforçar a democracia no trabalho, tanto a nível nacional como internacional, promovendo:

• Os direitos dos trabalhadores de se organizarem, fazerem greve e participarem na negociação colectiva no local de trabalho;

• A democracia na sociedade, em particular a liberdade de expressão, a liberdade de imprensa e a igualdade de género;

• A reforma democrática das instituições mundiais para colocar o bem-estar público e as normas laborais acima do lucro privado.

(tradução livre de Cesaltina Abreu, do comunicado CSI em espanhol, acessível em https://mail.google.com/mail/u/0/?ogbl#inbox/FMfcgzGxStwKgZFtlzhTRChNVtdJhWQd ).

29.04.2024

Bibliografia consultada:

1 AGENDA 2063. A África Que Queremos. Quadro estratégico comum para o crescimento inclusivo e o desenvolvimento sustentável. COMISSÃO DA UNIÃO AFRICANA, Junho 2015;

2 VOA, 22 Janeiro 2015, ‘Pensar pelas nossas cabeças é um dos grandes legados de Amílcar Cabral’, diz Iva Cabral;

3 Nelson Mandela: “Devemos promover a coragem onde há medo, promover o acordo onde existe conflito, e inspirar esperança onde há desespero”. No seu aniversário de 89 anos (20) https://www.pensador.com/frase/NTcwMzA0/;

4 Thomas Sankara, “Produzir em África, transformar em África e consumir em África”, discurso “Uma Frente Unida Contra a Dívida”, na 25.ª Conferência da Cimeira dos Países Membros da Organização de Unidade Africana (hoje União Africana), 29 de Julho, de 1987;

5 Entre outros, KI-ZERBO, Joseph. About Culture. Foundation for History and Endogenous Development in Africa, Ouagadougou, 2010.

6 A Confederação Sindical Internacional (CSI) representa 191 milhões de trabalhadores em 337 filiais nacionais em 167 países e territórios.

Curiosidade: Nos Estados Unidos da América, o berço de lutas trabalhistas referidas no texto, o Dia do Trabalhador não é celebrado em 1 de Maio como internacionalmente, mas sim em 1 de Setembro. E isso devido a uma legislação aprovada no Congresso em 1894, na sequência de uma série de incidentes sangrentos entre trabalhadores e autoridades (entenda-se polícia) em celebrações do dia 1 de Maio.

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