O tamanho do desafio para alcançar o Desenvolvimento Sustentável

Os cidadãos angolanos perderam os benefícios do crescimento económico, particularmente o verificado após o fim da guerra civil, em 2002, durante a ‘mini era’ de ouro da economia, entre 2008 (5) e 2022. E uma das causas é o fraco investimento no seu capital humano, principalmente por meio da educação.

Cesaltina Abreu*

Os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) (ou Objectivos Mundiais para o Desenvolvimento Sustentável) são uma colecção de 17 metas globais, estabelecidas pela Assembleia Geral das Nações Unidas e são parte da Resolução 70/1 da Assembleia Geral das Nações Unidas “Transformando o nosso mundo: a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável” (1), que depois foi encurtado para Agenda 2030 (2). As metas são amplas e interdependentes, mas cada uma tem uma lista separada de metas a serem alcançadas, num total de 169. Os ODS abrangem questões de desenvolvimento social e económico, incluindo pobreza, fome, saúde, educação, aquecimento global, igualdade de género, água, saneamento, energia, urbanização, ambiente e justiça social (3)

Até 2030, os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável permearão as sociedades nos quatro cantos do globo, e se cumpridos de maneira efectiva e homogénea, serão eliminados subsídios que dão suporte a explorações predadoras, à agricultura insustentável e à sobrepesca (a actividade pesqueira que não permite a continuidade das espécies pescadas). A contribuição de acções coordenadas como estas, associadas a um movimento cada vez maior de reciclagem e reutilização de matéria-prima, são a aposta da comunidade internacional para que possamos ter perspectivas melhores para o futuro. 

Assim, a proposta da ONU é construir os ‘Pilares da Sustentabilidade’, a saber: 

→Vida próspera e formas de assegurar a subsistência humana (fim da pobreza, acesso à educação, emprego, saúde e informação); 

→Segurança alimentar sustentável (fim da fome, segurança na produção de alimentos, com consumo e distribuição sustentáveis); 

→Segurança sustentável da água (acesso universal à água potável e saneamento básico; eficiência na gestão dos recursos hidrominerais); 

→Energia limpa universal (aumentar o acesso universal à energia limpa, minimizando a poluição e o impacto à saúde, além de reduzir o impacto do aquecimento global); 

→Ecossistemas produtivos e saudáveis (assegurar os serviços ecossistémicos e da biodiversidade com uma melhor gestão, restauro e conservação do ambiente); 

→Governança para sociedades sustentáveis (transformar e adaptar instituições e políticas públicas para aplicar as outras cinco metas, constantes no gráfico acima). 

Angola em 2023 

A cerca de 7 anos da avaliação do que tiver sido alcançado relativamente ao que os governantes, em nome dos respectivos povos, aceitaram como os desafios a encarar e a vencer para o Desenvolvimento Sustentável e, acima de tudo, para uma resposta mais concertada aos desafios da Crise Ambiental e ao que ela significa para a continuidade da vida humana na Terra, como está Angola? 

Recorrendo a apenas alguns indicadores, será possível compreender a distância a que Angola se encontra, e o grau de dificuldade em dar uma resposta aceitável aos compromissos em seu nome assumidos. 

Pobreza – Dados do Afrobarómetro (Maio 2022), indicam que a pobreza extrema em Angola cresceu de 35 para 44 % entre 2019 e 2022, afectando quase metade da população; no meio rural, a pobreza extrema atinge 63% da população. Em Outubro de 2022, um estudo realizado pela ADRA destacava: O problema da pobreza extrema em Angola “vai além da realidade estatística” apresentada pelas autoridades. 

Educação, Saúde, Esperança de Vida e Rendimento – Índice de Desenvolvimento Humano 2022 (dados de 2021) – posição 148 entre 189 países, no Grupo de Países de Baixo Desenvolvimento Humano, com 0,586, baixando 0,004 relativamente a 2020, no grupo dos países de desenvolvimento humano médio). Ajustando este IDH na perspectiva da desigualdade (Índice de Desenvolvimento Humano Ajustado à Desigualdade 2022), o IDH sofre uma perda devido à desigualdade na distribuição dos indicadores do IDH (rendimento, acesso educação e à saúde, esperança de vida), descendo Angola para o grupo dos países de baixo desenvolvimento humano, conforme Mapa abaixo:

Escolaridade – Média de anos de escolaridade (IDH 2022) – Angola tem 5,4 anos de escolaridade, o que praticamente corresponde ao ensino primário;

Índice de Capital Humano – Entre 157 países, Angola tem um dos índices mais baixos do Mundo, 0,36%. Isto significa que uma criança nascida hoje em Angola só conseguirá alcançar 36% de todo o seu potencial produtivo quando crescer;

Desigualdade – O Coeficiente de Gini – uma medida de desigualdade utilizada para medir o nível de desigualdade na distribuição de rendimentos num país ou numa região, coloca Angola na posição 143 entre 153 países, com um coeficiente de 0, 513, o que indica que uma pequena percentagem da sociedade concentra a maior quantidade de rendimentos e da riqueza produzida no país, e que não existem políticas redistributivas para corrigir essa desigual distribuição. 

Fome – Situação de Fome em 2022 – Angola figura na 98.ª posição, com 25,9 pontos, uma situação considerada Grave

Democracia4 – Índice de Democracia 2022 – a pontuação de Angola foi de 3,96 encabeçando a lista dos ‘Regimes Autoritários’. 

Liberdade – Mapa da Liberdade: elaborado anualmente pela Freedom House sobre direitos políticos e liberdades civis em todo o Mundo, Angola, a maior economia dos PALOPs e o 2.º maior produtor de petróleo da África subsaariana, está classificada como Não Livre, com 30 pontos, menos um do que no ano passado. 

Corrupção – Índice de Percepção da Corrupção, elaborado pela Transparência Internacional: Angola teve 33, um só ponto acima da pior média – a da região subsaariana, 32 -, ficando na 116.ª posição, 4 acima da classificação de 2021. 

Inclusão Digital – Mapa-múndi da economia das plataformas digitais, Angola encontra-se nos amplos “vazios geográficos da economia digital” do sul global (apesar do satélite!). 

Esses indicadores mostram claramente que os cidadãos angolanos perderam os benefícios do crescimento económico, particularmente o verificado após o fim da guerra civil, em 2002 durante a ‘mini era’ de ouro da economia, entre 2022 e 20085. E uma das causas é o fraco investimento no seu capital humano, principalmente por meio da educação. Para uma sociedade se tornar mais equitativa e justa, precisa transformar o crescimento económico – qualquer que ele seja – em progresso social e desenvolvimento sustentável. 

Criar as condições para alcançar esses objectivos implica aplicar à Nação, respeitando as devidas proporções, o provérbio africano que diz que ‘para educar uma criança é preciso uma aldeia inteira’6. E para não ficar “ninguém para trás”, a construção deste caminho deve ser plural, abrangente, inclusiva e solidária. 

O princípio 10 da Declaração do Rio (1992) (7) lembra que “A melhor maneira de tratar as questões do ambiente é assegurar a participação de todos os cidadãos interessados, no nível apropriado …”. Isso implica promover um Projecto de Nação ancorado na universalidade, na criatividade e na coragem inovadora de procurar o seu próprio caminho. 

10 Março 2023

1 http://www.un.org/ga/search/view_doc.asp?symbol=A/RES/70/1&Lang=E

2 «Transforming our world: the 2030 Agenda for Sustainable Development».United Nations – Sustainable Development knowledge platform. Consultado em 23 de agosto de 2015 

3 «Transforming our world: the 2030 Agenda for Sustainable Development».United Nations – Sustainable Development knowledge platform. Consultado em 23 de agosto de 2015 

4A democracia e a democratização tanto do processo político convencional como dos centros de decisão económica, previamente despolitizados, constituem um elemento essencial de uma política de ambiente sustentada. Jürgen Habermas (1987), Ulrick Beck (1992; 1997)
5 http://www.ceic-ucan.org/?page_id=91 

6 https://www.pensador.com/frase/MjU1NTgzNw/

7 https://artigo19.org/2014/05/06/o-que-e-o-principio-10/

Sobre a autora:

*Cesaltina Abreu é cientista social. Graduada em Agronomia, com Especialização em Botânica e Protecção de Plantas pelo IAC (International Agricultural Centre), Wageningen, Holanda (1975), detém vários títulos académicos com uma investigação conduzida na intersecção entre a Sociologia Política e Desenvolvimento Sustentável, na Universidade de Newcastle, no Reino Unido, com o tema “Contribuição das Ciências Sociais para os programas de doutoramento do CESSAF (Centro de Excelência em Ciências para a Sustentabilidade em África)”.Fez mestrado e doutoramento em Sociologia, pelo IUPERJ – Rio de Janeiro, Brasil.

Deixe uma resposta

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

PROCURAR