Ontem, sábado, 29 de Abril, houve “poda” nas árvores que ficam defronte do edifício em que resido, na Che Guevara, Maculusso.
Isto não seria motivo para escrever estas notas se não fosse o facto de as árvores terem tido as suas copas ‘esquartejadas’, os seus tecidos ‘esgaçados’, não só “pelo que foi feito”, mas também “como foi feito”.
Eu sou engenheira agrónoma, e durante anos orientei este trabalho essencial a manter as árvores em bom estado, tanto as de fruto quanto as das ‘sebes vivas’, as de ornamentação, entre outras. Mas mesmo antes de ter estudado o que é a poda, para que serve e como deve ser feita, eu tinha aprendido o que era e quais os seus benefícios, pela sua prática nas casas onde morei na minha meninice e juventude, na então Nova Lisboa. Em todos os nossos quintais havia sebes e árvores de fruto diversas, todas elas cuidadas e todas elas oferecendo-nos os seus muitos benefícios, incluindo a possibilidade de improvisar “uma casa na árvore”.
Muito sumariamente, a poda consiste em eliminar ramos/galhos das plantas em crescimento, ou em árvores já adultas, com diversos fins. A poda de formação para, como o nome diz, ‘dar forma’ mais desejada às futuras árvores, pratica-se nas primeiras fases de crescimento da planta e tanto se usa para árvores de fruto quanto para árvores de ornamentação em jardins, parques ou nas vias urbanas. A poda de limpeza, aquela mais comum e mais frequente, consiste em limpar os galhos/ramos secos das árvores ou, também, a cortar alguns ramos que estejam em excesso. A poda de frutificação, também designada ‘de floração’, é a poda que tem por objectivo optimizar a produtividade das fruteiras, procurando direccionar a seiva para os ramos de floração/frutificação e dar origem a uma maior qualidade dos frutos, tendo ainda efeitos na sazonalidade da(s) colheita(s).
Existe, ainda, a poda de rejuvenescimento ou de recuperação, no caso de árvores que durante algum tempo tenham sido desprovidas de cuidados, ou mesmo abandonadas por qualquer razão, e que se pretenda recuperá-las. Consistirá na retirada de ramos secos, quebrados, ou afectados por pragas ou doenças, e também procurará redefinir a copa de acordo com a espécie da árvore e o projecto em que esteja inserida.
Em todos os casos, quem realiza a poda precisa saber, exactamente, quais são os ramos que devem ser cortados e aqueles que devem ser preservados, inclusive durante a operação. É também necessário conhecer o calendário mais adequado à realização de cada tipo de poda, o equipamento necessário para facilitar o trabalho dos ‘podadores’ – por exemplo escadas de vários tipos -, e os instrumentos de corte que os mesmos deverão usar de acordo com o tipo de poda a praticar e com a espécie e a idade da planta a podar. Em muitos casos, usam-se produtos para colocar nas áreas de corte de maneira a evitar a entrada, e acção, de agentes infecciosos que possam afectar a saúde das árvores.
Mas, infelizmente, há um outro tipo de poda, que nós aprendemos, não na escola, mas na vida urbana, pela observação: trata-se da “poda camarária ou poda sem hipótese”. Esta é a poda realizada nos jardins, parques e ruas/avenidas das cidades e caracteriza- se, em geral, por excessos: de falta de conhecimento, de práticas incorrectas, de descuido, de falta de sensibilidade para com as árvores que nos dão tantos benefícios, por serem ‘os pulmões’ das cidades tornando o ar de que necessitamos respirável, por darem sombra, frutos e matérias primas, pela sua acção na retenção de solos e prevenção da erosão, na retenção da água no solo bem como a despoluição das águas, etc. Em troca, são tão mal-tratadas!
Dói ver como a poda é mal-executada, por pessoal não preparado, e sem os equipamentos e instrumentos adequados para estas operações que, aparentemente, não são devidamente preparadas. Dá para sentir o sofrimento das árvores ao terem os seus tecidos esgaçados, os seus ramos cortados à catanada, as feridas abertas não tratadas, enfim… E, para piorar, o resultado é, a todos os títulos, desolador: copas esteticamente deformadas, áreas de sombra eliminadas, e a vida das árvores – e a nossa, em consequência – ameaçada.
Ontem senti o “choro” das árvores daqui da minha rua, em frente do edifício. As fotos, que partilho, não conseguiram captar o tamanho da desgraça, nem as feridas expostas. Quando será que teremos serviços públicos de qualidade, servindo realmente as necessidades e os interesses dos cidadãos, entre os quais uma poda decente das árvores – cada vez em menor número – que nos protegem nas nossas ruas?
Luanda 30 Abril 2023
Vivo na cidade do Huambo onde são abundantes as árvores tanto ornamentais como fruteiras, tal como referiu a autora do artigo. É também na periferia desta cidade onde está estabelecida e a funcionar a Faculdade de Ciências Agrárias (FCA) onde são formados seja Engenheiros Agrónomos seja Engenheiros Florestais. Para além disso, temos como Administrador Municipal um licenciado por essa Unidade Orgânica, e isto pela segunda vez. Mesmo assim, tem sido recorrente assistir-se às ditas podas “camarárias” que, tal como aconteceu na rua da Doutora Cesaltina Abreu, também têm deixado mal tratadas as árvores ornamentais das ruas desta bela e pacata cidade, que carinhosamente chamamos de Huambo – cidade vida. Também por cá as árvores choram!