Ao suprimir a dissidência e a oposição, o governo aprofunda a desconfiança e o ressentimento entre os diferentes grupos. Isto pode levar a um novo conflito e instabilidade, desfazendo o progresso que foi feito na promoção da paz e da coexistência no país.
POR: ANASTÁCIO DANGEREUX
Angola tem uma história complexa de conflitos e confraternização entre diferentes grupos étnicos e facções políticas. O país passou por uma longa e devastadora guerra que durou entre 1961 e 2002 e foi caracterizada por violência, deslocamento e abusos dos direitos humanos. Primeiro, entre 1961 e 1974, entre os movimentos de libertação e o exército português, e entre os próprios movimentos de libertação que, por vezes, lutavam pela sua hegemonia e pelas tentativas de imposição da sua conduta; depois, entre os movimentos de libertação, com particular incidência entre 1975 e 2002. Entretanto, desde o fim da guerra, Angola deu passos significativos na construção da paz e na promoção da convivência entre os diferentes grupos. Entende-se facções políticas, como organizações políticas estruturadas e, por vezes, grupos políticos (estruturados) no interior daquelas organizações.
Para além do conflito contra o colonialismo português, a discórdia em Angola foi alimentada por profundas divisões políticas e étnicas. No cerne deste conflito esteve, principalmente, a luta pelo poder entre o MPLA, partido predominantemente composto por pessoas das etnias Mbundu e Kimbundu, e o grupo rebelde da UNITA, que obteve apoio principalmente da etnia Ovimbundu. O conflito foi ainda mais complicado pelo envolvimento de actores externos, com destaque para a África do Sul, Cuba e EUA.
A guerra civil em Angola durou 27 anos e resultou em cerca de 500.000 mortos e milhões de deslocados. O conflito foi caracterizado por violência generalizada, incluindo massacres, tortura e estupro. Tanto o governo do MPLA como os rebeldes da UNITA, foram acusados de cometer abusos dos direitos humanos e crimes de guerra.
Um dos principais impulsionadores do conflito foi a luta pelo controlo das vastas riquezas com particular incidência para o petróleo e diamantes. O petróleo representa mais de 95% das exportações de Angola e é a principal fonte de receita para o governo. Os recursos petrolíferos do país também atraíram o interesse de potências estrangeiras, que procuraram influenciar o conflito para a sua sustentação económica e estratégica.
Nos primeiros anos pós-independência, em Maio de 1977, estalou ainda um grande conflito no interior do MPLA, dando lugar a uma série de atropelos dos direitos humanos, tortura, desaparecimentos forçados e execuções extrajudiciais, com a liquidação de uma orientação de pensamento.
O conflito armado em Angola chegou ao fim em 2002, depois da morte do líder da UNITA, Jonas Savimbi, em confronto com as forças governamentais, do MPLA. O governo e a UNITA assinaram um acordo de paz, e a UNITA foi incorporada no governo como um partido político, o Governo de Unidade e Reconciliação Nacional (GURN). Desde então, Angola tem feito progressos na construção da paz e na promoção da convivência entre os diferentes grupos, desde que, com ganhos para o sistema instituído.
Um dos factores da promoção da paz e convivência em Angola tem sido o empenho na reconciliação nacional entre as forças beligerantes. O governo reconheceu a necessidade de reconciliação entre os dois grupos e tem vindo a tomar medidas para promover o diálogo e a cooperação, sempre com benefícios próprios, ou seja, sempre provocando mais conflitos.
Um exemplo disso é a criação da Comissão de Reconciliação Nacional, em 2002, para promover a cura e a reconciliação entre diferentes grupos. A comissão facilitou uma série de audiências públicas em todo o país, permitindo que as vítimas da guerra compartilhassem as suas histórias e procurassem a reparação pelos danos sofridos. A comissão também trabalhou para promover o diálogo entre diferentes grupos étnicos e políticos e abordar as causas profundas do conflito. Entretanto, tem-se negado a criar uma Comissão de Verdade e Reconciliação para tratar dos assuntos pendentes relativos aos acontecimentos do 27 de Maio de 1977, e tem defraudado os angolanos e a comunidade internacional com exumação de restos mortais, sem a participação de organismos internacionais independentes e sem a participação das vítimas das ocorrências deste infausto processo, ou de seus representantes. Pelo contrário, o governo está a utilizar uma entidade criada ao seu serviço, e que nada tem a ver com o 27 de Maio, embora se autointitule Fundação 27 de Maio. Esta entidade foi criada pelo regime e cumpre todos os seus anseios em troca de dinheiro, ou seja, corrupção.
Outro factor chave na promoção da coexistência em Angola, têm sido os esforços do governo para promover o desenvolvimento económico e reduzir a pobreza. O governo começou por reconhecer que a pobreza e a desigualdade foram os principais motores do conflito, e tomou algumas medidas avulsas para resolver esses problemas. Infelizmente, sem medidas estruturais, a pobreza tem-se agravado, o que dificulta a convivência e acirra o conflito.
O governo investiu em infraestruturas, educação e saúde e fez progressos na melhoria dos padrões de vida para uma parte muito reduzida da população de Angola. Isto impossibilitou o senso de identidade nacional e promoveu algum conflito social.
Entretanto, apesar de alguns desenvolvimentos positivos, existem desafios para promover a convivência e construir uma sociedade mais pacífica em Angola, mesmo estando a agravar-se os conflitos e a promover-se a saída para a Europa de muitos angolanos. As divisões étnicas e políticas continuam a existir, e continua a haver relatos de abusos dos direitos humanos e muita repressão política nos últimos anos.
Um dos desafios para promover a convivência em Angola é o legado da guerra civil. Muitos angolanos continuam a guardar ressentimento e desconfiança em relação a membros de outros grupos étnicos ou facções políticas, o que leva a tensões e conflitos.
Outro desafio é a falta de transparência e prestação de contas do governo. A corrupção é um grande problema em Angola e tem havido preocupações sobre a forma como o governo lida com as receitas do petróleo e a sua incapacidade de lidar com a pobreza e a desigualdade generalizadas.
Há preocupações crescentes sobre o tratamento de opositores políticos e activistas da sociedade civil, apesar do compromisso do governo com a reconciliação nacional e a promoção da coexistência.
O governo foi acusado de suprimir a dissidência e reprimir a oposição política. Opositores políticos foram presos e detidos, e ainda há relatos de tortura e maus-tratos de detidos e presos. O governo também é acusado de usar o sistema judicial em benefício próprio, para silenciar os críticos e suprimir a dissidência.
Activistas da sociedade civil também são alvo do governo. Defensores de direitos humanos e jornalistas são perseguidos, intimidados e presos pelo seu trabalho. O governo é permanentemente acusado de restringir a liberdade de expressão e de imprensa, e há preocupações sobre a capacidade do governo de tolerar críticas e dissidências.
Estas questões são particularmente preocupantes, tendo em conta o historial de violência política e de violações dos direitos humanos em Angola. O país experimentou uma longa e devastadora guerra civil que durou 27 anos e resultou em centenas de mortes. E, infelizmente, estamos ainda muito longe da verdadeira reconciliação.
Sem um sistema político mais aberto, tolerante e inclusivo que respeite os direitos humanos, será difícil construir uma sociedade mais pacífica e justa em Angola.
Além disso, as acções do governo correm o risco de exacerbar as divisões políticas e étnicas existentes. Ao suprimir a dissidência e a oposição, o governo aprofunda a desconfiança e o ressentimento entre os diferentes grupos. Isto pode levar a um novo conflito e instabilidade, desfazendo o progresso que foi feito na promoção da paz e da coexistência no país.
Para abordar essas preocupações, o governo precisa de tomar medidas concretas para promover a democracia e os direitos humanos. Isto inclui garantir a liberdade de expressão e de imprensa, proteger os direitos da oposição política e dos activistas da sociedade civil e promover a prestação de contas e a transparência no governo.
É igualmente importante que a comunidade internacional continue a acompanhar a situação em Angola e a apoiar os esforços para promover os direitos humanos e a vulgocracia no país. A comunidade internacional tem um papel importante a desempenhar na promoção da paz e da estabilidade em Angola, e deve trabalhar com o governo e a sociedade civil para enfrentar os desafios que o país enfrenta.
A corrupção cresce, o executivo escolhe e nomeia o governo, nomeia os juízes, nomeia os órgãos provinciais e municipais, nomeia o governador do banco nacional, nomeia o Procurador-Geral da República, nomeia o titular do Tribunal de Contas, o Chefe do Estado Maior das Forças Armadas, escolhe os responsáveis pela comunicação social escrita, falada e televisionada, silencia o diminuto jornalismo existente…. Enfim, é um pequeno monarca de quem todos dependem. Para cada confraternização existe, pelo menos, um diferendo. Precisamos de uma revolução, a tal que o actual presidente um dia prometeu.