Se o comandante do grupo Wagner, Eugénio Prigozine, tivesse sido um homem com tento na língua, jamais teria aberto a boca no passado dia 23 de Junho, nos arredores de Bakhmut, quando disse: “Agora, o ministério da Defesa tenta iludir o público, tenta iludir o presidente e conta a história de ter havido uma agressão insana pela Ucrânia, e que eles iriam atacar-nos com todo o bloco da OTAN. A operação especial iniciada a 24 de Fevereiro foi lançada por razões completamente diferentes. A guerra era necessária para que um monte de canalhas triunfasse e se promovesse, mostrando quão forte era o exército, para que Shoigu recebesse o grau de marechal.”
Já antes, conforme os seus mercenários, muitos deles saídos das prisões russas para servirem de carne de canhão nas estepes ensanguentadas do Dombass, iam avançando no terreno, Prigozine começou a sair da casca, assumindo o protagonismo de herói da conquista, em detrimento da máquina de guerra do Kremlin. Mesmo assim fora da casca, foi com certo espanto que o mundo assistiu às suas atoardas contra o ministério da Defesa russo, as quais não só vilipendiaram Sérgio Shoigu, mas atingiram o coração do czar Putin, o terrível, que sempre defendeu a legitimidade da invasão contra a Ucrânia.
Por via dessas aparições anti-Kremlin na mídia internacional, Prigozine estoirou nos céus de Moscovo no pretérito dia 24 de Agosto, e com ele a sua ambição. Com a morte do líder do grupo mercenário Wagner, nasce a questão crucial: a impressionante boca lançada por Prigozine, que contraria a versão legitimária de Putin sobre a guerra na Ucrânia é para levar em conta ou foi um mero relincho de cavalo de batalha utilizado para o pior e doloroso esforço de guerra da Rússia?
Enquanto se aguarda por uma resposta, vale realçar que os aviões têm a grande vantagem da rapidez na mobilidade pessoal, mas também são um meio de extinção de opositores e inimigos políticos, que deixa pouca margem de suspeita.
Pendente nos arquivos da ONU está a morte em 18 de Setembro de 1961, nos céus da ex-Rodésia do Norte (hoje Zâmbia) do então secretário-geral, Dag Hammarskjöld. Este seguia em missão de paz para o Congo (RDC), para negociar com os rebeldes do Katanga. O acidente está até hoje envolto em suposições.
Um outro caso envolveria dois presidentes, Juvenal Habyarimana, do Ruanda, e Cyprien Ntaryamira do Burundi, a caminho de Kigali, mortos na noite de 6 de Abril de 1994, quando o avião em que seguiam foi alvejado por um míssil. Até hoje, entre acusações e contra-acusações, não ficou estabelecida a autoria do disparo do míssil.
Quatro anos passados, o antigo representante especial do Secretário-Geral da ONU para Angola, Alioune Blondin Beye morreria num desastre aéreo, prestes a aterrar em Abidjan. O “mâitre” do Protocolo de Lusaka para a paz em Angola, dissolveu-se no ar, a 26 de Junho de 1998. Até hoje, ainda se especula sobre esse trágico acidente.
Agora, com a queda do jacto privado do oligarca russo e dono do grupo Wagner, tudo leva a crer que o espaço aéreo representa um bom álibi para crimes mais que perfeitos.