TRUMP AS TARIFAS ALFANDEGÁRIAS, A AGOA E OS FINANCIAMENTOS

É hora de a África acordar para a produção agroindustrial e, no caso de Angola, acabar com os monopólios e com os oligopólios, para que juntos, possamos ir ganhando uma pequena fatia do mercado americano, que derivará da redução das exportações dos parceiros asiáticos e latinos.

MARIA LUÍSA ABRANTES

Parece estranho, mas não raras vezes ouvimos líderes africanos a lamentarem-se, da exploração do Ocidente e a choramingarem de mão estendida, por novas ajudas externas, ou cortadas. Entretanto, para ir pedir, deslocam-se em aviões de topo de gama, com delegações que enchem duas a três aeronaves, hospedando-se em hotéis de 5 ou mais estrelas. Nos seus próprios países, mais do que conforto, não dispensam o maior luxo à custa dos cofres do Estado, suor dos contribuintes, quais monarcas sem coroa, sem herança e sem glória. 

Pior ainda, longe das câmaras de televisão são arrogantes, para esconder a sua incapacidade de gestão da “Res publica” e insegurança, porque não entendem o seu papel de servidores públicos. Por isso, receiam governar os seus países utilizando os seus melhores concidadãos (quadros), preferindo despender “rios de dinheiro” com consultores estrangeiros que mal conhecem o país, para elaboração de planos estratégicos, relatórios, pareceres, prestação de serviços, etc.. Enquanto isso, os países vão a “pique” em direção ao abismo e a maioria da sua população vive na indigência, ignorada, não conta das estatísticas, porque por falta de identificação não efectua o seu registo civil. 

Mais estranho ainda, é que os tais consultores estrangeiros e “lobbies” pagos por milhões de dólares/ano, são muitas vezes de qualidade medíocre, podendo com a sua inação causar prejuízos, em vez de vantagens. Por exemplo, ainda não li, nem ouvi nenhum líder africano a relembrar, que o prazo da AGOA – African Growrh Opportunity Act (Lei para o Crescimento e Oportunidades para África), que isenta de tarifas alfandegárias mais de 6.500 produtos, aos países africanos que não tenham ligações ao terrorismo e tenham boa governação, expira em Agosto de 2025. 

Por conseguinte, se essa Lei só terminaria depois das primeiras decisões do Presidente Trump, sobre a atribuição de tarifas alfandegárias mais elevadas aos países africanos, deveriam de imediato e antes ainda da suspensão por 90 dias, unir-se sob a liderança da OUA, para poder solicitar uma suspensão das tarifas aduaneiras, no mínimo até Junho do corrente ano. Enquanto isso, estudariam a estratégia de futura negociação e orientariam as respectivas Missões Diplomáticas a juntarem-se ao movimento pró-prorrogação da AGOA, que agora mais do que nunca, precisa dessa força e de unidade. 

Aliás, a AGOA, que foi promulgada em 2000 pelo Presidente Clinton, por um período de 10 anos e prorrogada pelo Presidente Obama, por um período de 15 anos, tinha a previsão de ser renovada por um período de mais 30 anos, a partir de Junho de 2025. O movimento para apoiar a prorrogação do AGOA (tarifas alfandegárias zero), não pode apenas funcionar no interior dos Estados Unidos como até agora. Teria de ser reforçado pelas Missões Diplomáticas africanas em Washington, D.C. Angola, infelizmente, sempre teve diplomatas muito fracos, sendo os principais postos em D.C., ocupados por quadros do SINSE. Os lobbies contratados não são melhores, sendo em parte o critério de escolha por recomendação de “amigos”. 

A autora, com o Senador Rangel, que teve a iniciativa de apresentar a proposta do AGOA no Congresso americano.

A AGOA, como a maioria de legislação que apoie o desenvolvimento a países estrangeiros, foi aprovada pelo Congresso americano. A AGOA foi iniciativa do Senador Democrata afro-americano Charles Rangel ao Congresso, a pedido e com o apoio das empresas americanas exportadoras de matérias-primas de África para os EUA, sociedade civil americana, africanos residentes e alguns Embaixadores africanos, nos EUA. A Embaixada de Angola não participou no grupo que teve a iniciativa propor a Lei. Apenas esteve presente como convidada, no acto de aprovação da mesma. Tive a subida honra de participar, como residente em nome individual, na preparação da 1.ª fase da aprovação da AGOA e da sua prorrogação, através do grupo “Coligação para as Importações” e estive presente no Capitólio e na Casa Branca, nos actos de aprovação e de comemoração da aprovação da lei. 

Não é novidade, que a implementação de qualquer projecto público ou privado, pequeno ou grande, depende essencialmente da sua viabilidade, que só será exitosa, se o estudo de mercado concluir que há bastantes consumidores, a localização é excelente e que a garantia para o colateral é óptima, (sobretudo se for garantia do Estado). Daí, parte-se para a elaboração do estudo de viabilidade técnico, económico, financeiro e ambiental.

O Presidente João Lourenço, acompanhado pelo empresário Pedro Godinho (ao centro) Presidente da AMCHAM e pelo então embaixador de Angola dos EUA, Espírito Santos, em Washington, D.C. para assinatura do primeiro protocolo

Existe uma certa confusão entre as ajudas cessantes a fundo perdido, como, por exemplo, da USAID, destinadas à África e a cooperação bilateral, entre os Estados Unidos e os países africanos. Não obstante Angola também tenha perdido os apoios da USAID, manter-se-a sempre, o interesse das empresas americanas em vender (exportar), os seus produtos e serviços, sempre e quando houver pagamentos garantidos, (especialmente se for com garantias soberanas). 

No caso de existência de projectos de grande envergadura, aumenta o interesse da Administração americana, em proteger as suas empresas nacionais privadas, para  acautelar o retorno por via do lucro e do respectivo pagamento de impostos, (sem escolha por amiguismo, como ocorre não raras vezes em Angola). Para a realização de tal desiderato, aumenta o interesse e empenho do EXIMBANK, em mobilizar financiamentos (que no caso de Angola não pretende despender), na União Europeia (acordo já efectuado) e em África (BAD), para implementação de projectos energéticos e/ou relacionados com o já existente Corredor do Lobito. 

A possibilidade de execução dos projectos energéticos e do Corredor do Lobito, seria um excelente exemplo da concretização das relações bilaterais “win win” (ambos ganhariam), entre os Estados Unidos e Angola. O trabalho de mobilização de parcerias privadas nos EUA para a viabilização dos  supramencionados projectos, foi por iniciativa de colaboração/cooperação voluntária e árdua  a custo zero, do maior “lobby” institucional americano, a Câmara do Comércio Americana (US/Africa Business Center) e da AMCHAM, (Representação daquela Câmara  em Angola). Só assim se entende, que os protocolos iniciais assinados  para a prossecução dos referidos projectos, tenham  sido celebrados antes das visitas quer do Presidente João Lourenço aos Estados Unidos, quer do Presidente Biden a Angola. 

A continuidade dessa cooperação, só poderia encontrar entraves durante a Administração Trump, caso este não obtenha êxito na sua estratégia já iniciada para pacificar a RDC. O estudo de viabilidade técnico-económico e financeiro (que será o único e irrisório financiamento a ser efectuado diretamente pelos americanos, através da USTDA, (Agência especializada na matéria), para além de incluir as cargas mais significativas a exportar a partir da Zâmbia (manganês, cobre, cobalto, grafite e lítio) para o Porto do Lobito, terá em conta, sobretudo, as principais cargas a exportar da RDC (ferro, lítio, coltan, cobalto, urânio,  terras raras como o  neodímio e disprosio). Com a instabilidade política, que ocasionou a guerra civil apoiada pelo Ruanda à RDC, este país deixaria de ser um bom mercado para investir e deixaria de haver produtos na quantidade necessária, para viabilizar financeiramente quer o projecto do CFB, quer o projecto do Porto do Lobito (ambos implicam cadeia logística).

Mais do que nunca está bastante claro, que enquanto as nossas representantes no exterior, ou têm muito pouca visão, ou relaxam, a Administração  Trump, porá  sempre o lucro das empresas americanas “first” e o emprego dos americanos “first” (primeiro) e os seus colaboradores, não vão perder a oportunidade nem tempo de incumbir o seu Embaixador e Adido Comercial em Angola, de não desistirem de encontrar mercado para todo o tipo de produtos e serviços possíveis. Esse interesse, incluirá o mercado para escoar (impingir), os desperdícios de frango (que eles nunca comeram, porque é considerado lixo), tal como pontas das asas de frango, parte da gordura do rabinho da galinha, patinhas de frango, pescocinhos e miudezas, como já tem lutado pelo mercado dos frangos congelados em todas as outras administrações. Sendo que o consumo americano é muito elevado, mas de qualidade, provindo daí grande parte do déficit americano, seria a hora de a África acordar para a produção agroindustrial e, no caso de Angola, acabar com os monopólios e com os oligopólios, para que juntos, possamos ir ganhando uma pequena fatia do mercado americano, que derivará da redução das exportações dos parceiros asiáticos e latinos.

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