A PROPÓSITO DA EXPORTAÇÃO DE ENERGIA PARA OS VIZINHOS A LESTE

A quantidade mirabolante de ‘projectos’ que nos são apresentados como sendo a solução para os tantos problemas básicos, de sobrevivência, que marcam o nosso quotidiano, e a sua frequência, parecem apontar para uma estratégia para nos entreter.

CESALTINA ABREU

Veiculada por vários meios de comunicação, entre os quais a RNA, o Novo Jornal, Sapo 24 e o Diário Económico, para além de diversas plataformas digitais, a notícia não tem, em si, nada de extraordinário.

Num texto de 9 de Junho de 2023, eu própria indagava, relembro: Em 6 de Junho ficámos a saber(1) que Angola está na lista dos 20 países com maior déficit de acesso à energia no mundo, com 18 milhões de pessoas sem eletricidade… e isto, apesar das grandes e caríssimas barragens: Kapanda (a maioria dos municípios de Malanje não tem energia eléctrica), Laúca e Caculo Cabaça… enfim… ah, e tem mais: esse excedente de produção, maioritariamente ‘energia limpa’, nem sequer é exportado para países vizinhos” 

Nesse mesmo texto, acrescentava: “Produz-se energia, mas não se mantêm nem se expandem os sistemas de distribuição existentes, não se interligam para fazer chegar a energia a todos…”.

Em seguida, referia-me ao Mapa de Angola com os sistemas actualmente existentes. Observem bem:

Chamava então a atenção para a brutal desigualdade que, também neste domínio do acesso à energia eléctrica, existe no acesso aos serviços básicos, sendo assustador o “vazio”, do Centro para o Leste, na cobertura das redes de serviços básicos que constituem direitos fundamentais…

Pela sua actualidade, partilho ideias do último parágrafo do meu texto de há 13 meses: Projectos, há muitos, inclusive de produção de energia fotovoltaica. Mas a realidade é esta. E este é mais um caso que alerta para a necessidade de “estarmos Juntos”, de facto, para lutarmos por uma sociedade com mais energia e mais iluminada! Porque, produzir energia, ter excedente, mas manter mais de 50% da população sem acesso à energia limpa é inaceitável e traduz o que temos noutros domínios da nossa vida individual, familiar e colectiva: descaso, omissão, desrespeito! E basta!”.

A quantidade mirabolante de ‘projectos’ que nos são apresentados como sendo a solução para os tantos problemas básicos, de sobrevivência, que marcam o nosso quotidiano, e a sua frequência, parecem apontar para uma estratégia para nos entreter. Mas, se pensarmos a sério no que vem acontecendo e se intensificando nos últimos tempos, parece tratar-se de uma estratégia para nos enlouquecer.

Às breves notícias abaixo sumariadas, juntemos as mais recentes: o NAIL (o aeroporto para 15 milhões de passageiros/anos); o turismo na lama, nos buracos e com a polícia a cobrar ‘gasosa’ e a impedir que se fotografe; o teleférico seguindo-se ao metro de superfície; os camelos no/do Namibe; as sucessivas propostas de divisão político-administrativa sem que se apresentem razões para abandonar, mas e adoptar outras; o programa de desenvolvimento de capital humano com acções a partir do ensino profissional, esquecendo que mais de metade das crianças em Angola já nasce em desvantagem de condições, e terá certamente menos oportunidades; a perspectiva de Angola com potencial para ser vector do desenvolvimento da África Austral; a agricultura, em particular a familiar, apontada como um pilar da economia não-petrolífera, sem os investimentos necessários, etc., etc.

A não aceitação da necessidade de uma visão socialmente construída, parece ser a causa desta sucessão de ideias sem fundamento, de projectos que não passam dos discursos desencontrados, sem sentido … Ah, mas todos caríssimos! Qual o custo social desta falta de visão

É urgente a construção colectiva de uma visão para a transformação social de um passado, e de um presente, em perpétua brutalização. O futuro tem sempre uma história! Uma visão para romper com os velhos padrões de exercício do poder, herdados do colonialismo, e reproduzidos pela governação da Angola independente. Uma construção colectiva como processo promotor de confiança e de solidariedade, e agregador em torno da necessidade de convivência pacífica e de crescimento equilibrado e equitativamente distribuído; uma visão como um compromisso político para a construção de um Contrato/Pacto Social que sirva ‘o todo’ e não se reduza à mera satisfação dos interesses predatórios das elites deste País.

1 Relatório do Progresso Energético das Nações Unidas, tornado público em 6 de Junho de 2023

2 Africa Energy Outlook 2019

05 Julho 2024

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