A INDEPENDÊNCIA ADIADA

A verdadeira Independência de Angola ainda não chegou para a maioria do povo angolano e em particular, para os pouquíssimos sobreviventes, que lutaram por ela contra o opressor, enfrentando o regime colonial no terreno, e não apenas nos gabinetes…

MARIA LUÍSA ABRANTES 

A Independência de Angola e das ex-colónias portuguesas, é o resultado da luta não só de negros (aqui incluo mestiços), mas também de muitos brancos em Portugal e nas colónias. Dos ex-presos políticos que não tiveram medo de enfrentar a PIDE no interior do país, fala-se e destaca-se apenas aqueles que eram provenientes da classe operária, (nos quais se inclui os enfermeiros) e os camponeses. 

Dos intelectuais, só se fala do grupo da Casa dos Estudantes de Império em Portugal, que fundaram o MPLA, e de Jonas Savimbi, que se lhes juntou para fundar o Partido que nós os caluandas, pusemos no poder. Não interessa falar do mentor do início da luta armada, o Cónego Manuel das Neves, nem do seu braço direito, Afonso Dias da Silva, por puro racismo porque eram mestiços.  

Menos ainda se fala de tantos outros intelectuais dentro de Angola, que nunca se acobardaram, mesmo vivendo bem e de jovens estudantes, alguns dos quais, que com apenas 17 anos (no fim do ciclo liceal), foram presos pela PIDE- DGS e só saíram depois do 25 de Abril. Um deles, um dos últimos sobreviventes brancos, foi a enterrar no mês passado. Chamava-se Rui Filipe Ramos. 

A primeira memória pôs independência só registou os documentos publicados que trabalharam nos gabinetes com os portugueses. 

Do grupo de jovens revolucionários, hoje septuagenários, poucos sobreviventes restaram poupados pelo regime (não deixam de merecer a minha vénia), como o Tininho (Alheiro Vaz da Conceição) e Bornito de Sousa, sobrevivendo por muita sorte (por sempre dizer o que pensa), para além de Caito Octávio, a quem afastaram como tantos outros “ab initio”, rotulando-o de RA (Revolta Activa). 

Com muitíssima tristeza, constato, que infelizmente, a Independência de Angola foi boa ou até excelente para muitíssimo poucos, grande parte dos quais passou pela JMPLA só a marchar no dia 11 de Novembro e 1⁰ de Maio. Faziam o mesmo com as crianças pioneiros da OPA. Os pioneiros não tinham qualquer actividade extracurricular, para além de acampar (alguns escolhidos) uma vez por ano e de marchar todos rotos e descalços, porque os seus responsáveis ficavam pelos gabinetes. Só saiam quando o Presidente da República (e do Partido) aparecia, para dar a cara ao Chefe e aparecer na televisão. Outros apareceram do nada, parecendo entrar pelo teto, alguns saídos da FNLA ou da UNITA, a quem traíram, para partilhar o poder e as migalhas da “dipanda” mais cedo, entraram de para-quedas. Outros, como nas guerras para alargar o reinado, receberam uma boa recompensa (financeira e política) a troco da rendição. 

Sem receio, posso afirmar que por me sentir tão envergonhada, enquanto quadro do Ministério da Indústria, trabalhei com os directores das unidades de produção de fardas, de quedes e de sandálias de borracha e de carteiras escolares e sugeri ao PR JES, que as fardas da escola fossem obrigatórias e doadas, e que fossem iguais ao fardamento da OPA, para que as crianças aparecessem vestidas condignamente, pelo menos nos feriados nacionais e que se fornecessem carteiras escolares às escolas. Podem crer, que os dirigentes da JMPLA responsáveis pela distribuição do calçado às crianças misturaram tudo, chegando a distribuir pares de quedes com números diferentes. Conclusão: os miúdos continuaram a marchar descalços.

A OMA, que esteve “de pé” (a música dizia “a OMA está de pé…”), nos tempos da Luisa Inglês, (de quem a própria irmã afastou-se, durante o processo do 27 de Maio que a sacrificou), da Arminda Faria e de Emília Abrantes, que participam na recepção das delegações do MPLA a 8 de Novembro de 1974 e a 4 de Fevereiro de 1975, na mobilização de mulheres para a festa da Independência e organizaram a OMA em Luanda.

Angola, País que tem tudo para dar certo, é hoje significado de luto, pelas famílias que choram os seus filhos fuzilados pelos seus próprios irmãos dos três (três) principais partidos que vieram da “mata” com sede de poder. A Independência de Angola não honra os seus filhos mortos em confrontos com o exército sul-africano, mortos pela opressão e pela miséria, ou os estropiados. 

A verdadeira Independência de Angola ainda não chegou para a maioria do povo angolano e em particular, para os pouquíssimos sobreviventes, que lutaram por ela contra o opressor, enfrentando o regime colonial no terreno, e não apenas nos gabinetes, (inclusive dos quartéis e na sede do partido no poder). A Independência ainda é uma miragem, protegida por cobardes e defendida por oportunistas sem qualquer empatia pela espécie humana. 

 A Independência de Angola, reconheçamos sem receio de errar, está adiada, porque foi só para alguns, que se apoderaram do que o colonizador deixou sem suar, tal como de parte do dinheiro da SONANGOL e das garantias bancárias do Estado (soberanas). 

Hoje, vendo o barco a afundar, pediram a alguns dos seus ocupantes que se “aliviassem” de algum peso a mais que tinham, resultando em 10% para os magistrados cobradores, e atiraram a Isabel dos Santos e o São Vicente pela borda. 

Só os sociopatas não têm empatia pelo próximo. Boa parte dos muito poucos que se sentem independentes hoje, são os que sempre estiveram no BP e/ou CC do MPLA e aliados, provenientes da UNITA e da FNLA, que foram capturados ou aliciados, com a única coisa porque sempre lutaram: – O poder e a riqueza.

Legenda: Maria Luísa Abrantes, Lucio Lara, Herminio Escórcio e mestre Geraldo, num acto de massas em Luanda, no período de grande euforia revolucionária dos calinadas em torno do MPLA.

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