COMPANHIA DE DANÇA CONTEMPORÂNEA DE ANGOLA ENCENA NO MEMORIAL AGOSTINHO NETO A PEÇA “ONDE O VENTO NÃO SOPRA”

Na areia molhada lia-se, aos saltos, o retrato às ordens da lua (…) Sempre que o sol subia o chão era devolvido ao mar (F. Ningi)

A Companhia de Dança Contemporânea de Angola (CDC Angola) continuará a apresentar nos dias 4, 5, 6 e 7, no Memorial António Agostinho Neto, às 19h, a sua temporada artística de 2024 (segunda série), com a exibição da peça intitulada “Onde o Vento não Sopra”.

Com a duração aproximada de uma hora, o espectáculo intitulado Onde o Vento não Sopra, aborda os terrenos da emigração, onde o aumento da pobreza, as catástrofesnaturais e as guerras reais e eminentes obrigam milhares de pessoas a deslocaçõesmassivas à procura de melhores condições de vida.

De acordo com nota de imprensa dessa instituição, “foi com este espírito de inquietação e de solidariedade, acreditando na importância da intervenção e posicionamento dos artistas perante os acontecimentos políticos e sociais da sua actualidade que, este ano, nos dedicámos à criação de uma peça onde a emigração é o ponto fulcral para o questionamento sobre um conjunto de questões paralelas como a intolerância cultural, o racismo, o ódio ou a xenofobia”.

Com concepção e direcção artística de Ana Clara Guerra Marques, a peça integra 10 bailarinos da CDC Angola (7 residentes e 3 estagiários), designadamente, Afonso Feliciano, André Baptista, Andy Rodriguez, António Sande, David Daniel, Gabriel Lopes, Jéssica Sanga, José Ndumbu, Marcos Silva, Samuel Curti. A produção executiva é de Jorge António, e videografia de Rui Tavares.

Esta companhia, a qual se deve a grande transformação do panorama da dança em Angola, foi fundada em 1991, é membro do Conselho Internacional da Dança da UNESCO, possui um historial de centenas de espectáculos apresentados em Angola e no exterior, sendo hoje a referência da dança cénica angolana no mundo. Com 33 anos de existência, ocupa um lugar privilegiado na História de Angola, ao ter semeado o “novo” no vasto terreno da dança onde continua a desenvolver um trabalho artístico único e original.

Após os espectáculos no país, a CDC Angola tem em perspectiva o convite para a realização de uma tournée pela Europa, no mês de Novembro.

Causas e consequências desta “transfronteiridade”

Abordando os terrenos da emigração, a peça Onde o vento não sopra propõe-nos um olhar sobre a complexidade das conexões humanas na construção de uma teia que se entrelaça em diferentes direcções.

Segundo Ana Clara Guerra Marques, a peça é, no fundo, uma “viagem, a apropriação e a expropriação; a adaptação e a negociação entre as diferentes culturas, bem como a povoação de espaços geográficos e culturais comuns, geram novos processos identitários; e a casa como metáfora da intimidade e do porto seguro, mas em risco de desmoronamento permanente, tal como os projectos em tempo de guerra, onde a incerteza impõe a obrigação de viver um dia por dia”.

Recorrendo a um alfabeto de interpretações múltiplas e multiplicadas construído pelos próprios bailarinos, defende Ana Guerra Marques, “a peça conta as suas e as histórias de outros, narrando experiências por vezes únicas, por vezes partilhadas”.

O texto coreográfico, ressalta, “remete-nos para as imagens que, diariamente, nos franqueiam a porta e nos apresentam pessoas em trânsito constante, transportando em trouxas o sonho de uma vida perfeita ou a esperança de um regresso futuro”. Entradas, saídas, humilhações, fronteiras e perseguições são alternadas com longas pausas para contar as estrelas e pensar se a viagem terá um fim.

Enquanto fenómeno complexo que reflete, em simultâneo, as desigualdades e as interconexões globais, sustenta Ana Clara Guerra Marques, “a peça propõe a discussão sobre como a emigração conduz ao desafio de se encontrar um equilíbrio que harmonize a presença de outros universos com as sociedades de acolhimento, criando condições para uma coexistência harmoniosa e próspera”. Apesar dos diálogos frequentemente sobrepostos e das contradições geradas pela diferença, prossegue a directora artística da CDC Angola, há sempre uma letra comum que se repete em cada linguagem.

Se conseguirmos compreender as causas e respectivas consequências desta “transfronteiridade”, ressalta Ana Clara Guerra Marques, “estaremos aptos para integrar, para promover o desenvolvimento sustentável e como prática para construir o respeito pelos direitos humanos e pelas liberdades de todos”

“Imagens-chave”: expropriação, fronteira, individualidade, naufrágio, conflitos culturais, desprezo, acampamento, abandono, casa como referência, torre de Babel.

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