Se um jornalista é mau por fabricar informação de assassinato de carácter, ou por favorecer o poder trajando o fato da militância partidária, o jurista e ou advogado também é mau quando, nas mesmas condições colabora para tornar o Estado cada vez mais refém do MPLA e do Presidente João Lourenço.

O Presidente da República, João Lourenço, de leis, percebe tanto quanto eu. Pouco ou nada. Mas, também não é obrigado a dominar todas. O resultado da implementação delas é que conta. E a apreciação pode resultar das decisões tomadas quer na liderança do seu partido, quer ao nível da governação.
Embora em primeira instância o respeito seja sua obrigação e responsabilidade como mais alto guardião do Estado, ela é repartida com o grupo de auxiliares e assessoria que lhe serve de suporte. E quando esse resultado não é bom, mesmo na rectaguarda e pouco visível, esse grupo não está isento de culpas. Mas, muitas vezes, ficamos com a impressão que há juristas e advogados demasiado ardilosos e até perigosos para a harmonização do Estado, mas não respondem por nada, apesar de servirem para o bem, como para o mal. Perdem-se na falta de moral, da ética e até do comprometimento com a Pátria.
O maior exemplo do quanto mal causam ao Estado, são os erros e omissões que contém a nossa Constituição, feita, como um fato, à medida de quem o veste e não dos superiores interesses da estabilidade da Nação. Mas também as armadilhas contidas noutras, como o Regimento da Assembleia Nacional.
Foi recorrendo ao Artigo 40.º que o Bureau Político do MPLA, por proposta do seu presidente, João Lourenço, no quadro de iniciativa da conveniência do Presidente da República, João Lourenço, sendo o presidente do MPLA, interrompeu o mandato de Carolina Cerqueira, substituindo-a por Adão de Almeida. Ou seja: o poder que a Constituição não confere ao Presidente da República neste caso, relactivo a um órgão de soberania do Estado, encontra respaldo num Regimento que subalterniza o funcionamento desse órgão de soberania do Estado, aos interesses do partido com maior representação. E ninguém da sua assessoria teve ou tem coragem de dizer ao presidente do MPLA que também é da República, que esta sua decisão, embora não macule a legalidade, também não é uma via correcta que se deve seguir, mesmo fingindo haver separação dos três poderes. Porque fere a imagem do Estado de Direito e Democrático, porque periga a estabilidade e a harmonia política, económica e social. Logo, ela, a assessoria, torna-se cúmplice de uma má prática, porque não reza a história o registo de que alguém que se tenha demitido, demarcando-se dessas golpadas contra o Estado praticadas pelo presidente do partido, que é, também, Presidente da República. E a cada decisão semelhante, que afunda o país, são juristas e advogados os verdadeiros mentores ou arquitectos desse ardil político sob a capa da legalidade, porque eles é que esmiúçam as leis e regulamentos, para atender desejos ou apetites do Presidente, quer relativamente ao Estado, quer ao seu partido.
Mas, convenhamos, nalgum momento da nossa história, isso terá que parar. E bom seria se de forma mais séria e profunda, a classe de juristas e de advogados, pela mão da Ordem de Advogados, começasse por analisar, com frontalidade, o papel e o desempenho comprometido dessa classe com políticos, que tem sido profundamente prejudicial para o funcionamento do Estado. Aliás, essa questão foi reconhecida pelos juristas e advogados participantes no Congresso Nacional de Reconciliação, promovido recentemente pela CEAST. Porque é necessário saber diferenciar que uma coisa é a defesa do exercício da Justiça ‘justa’, como procedeu o Rei Salomão, recordado pelo Presidente da República, e outra, é a defesa do Rei Salomão (o próprio Presidente) para se manter no poder.
Face essas constatações, entendo que tal como deveria ter ocorrido no ‘combate’ à corrupção, o país ganharia muito se como medida de prevenção, para além de leis, se criasse um tribunal diferenciado, para julgar os casos de envolvimento de juristas e de advogados e não só, nesses esquemas de trambicagem contra o Estado. Deveria constituir também crime grave, a prática ou acertos esquemáticos para manutenção do poder fora do âmbito estabelecido pela CRA, ou ajuda na fabricação de omissões propositadas nas leis, aproveitadas depois por quem detém o poder, para amordaçar o Estado. Porque essa prática, que não está tipificada, mas é antiga, é de maior gravidade do que a suposta difamação (contra o Presidente da República), beira a postura ‘lesa-pátria’, constitui traição a ideais que pode conduzir o Estado à falência. Frustra as nossas esperanças, o nosso desejo de termos um país mais justo. Aumenta o poder de quem já tem até demais, a miséria da população e beneficia a gestão incompetente, de quem organiza festas esbanjando o nosso dinheiro.
Pelo nível de perigosidade dessa intervenção de servidores públicos e acertos com agentes da classe de juristas e de advogados, essa postura antiética e de quebra de compromisso e de juramento para defesa do Estado, deveria merecer julgamento judicial e condenação com pena de até prisão perpétua (e se fosse como na China, melhor). Por arrasto, também a perda de direitos de propriedade sobre todos os bens adquiridos, ao abrigo da prestação de qualquer serviço a entidades públicas que tenham atentado contra o bom funcionamento das instituições, incluindo os transferidos para a posse de familiares.
Defendo essas medidas, porque entendo que não devemos continuar a assistir tudo isso como um exercício normal de advocacia e assessoria jurídica, porque se trata de um grupo técnico-profissional profundamente esclarecido, com formação e com influência que pode alterar a segurança do Estado. Ele tem capacidade e obrigação de saber fazer a destrinça entre o bem e o mal para o país.
Esse grupo, perfeitamente identificado e estruturado, tem ajudado outro a condicionar o Estado de Direito e Democrático. Como consequência, hoje, já não temos tanto receio de um golpe perpetrado por militares, mas sim por via de decisões de políticos associados a juristas e advogados, que diariamente utilizam as leis para golpear o Estado. E utilizam os órgãos castrenses em proveito próprio para manutenção do poder. Tudo isso que é feito com base numa aparente legalidade, tem definição: golpe.
Como é óbvio, a manutenção do poder não pode nem deve valer tudo. E para mais, um poder matumbo, devorador de tudo e de todos, que mata e aprisiona a sua população. Que asfixia uma nação que tem tudo para dar certo, mas está condicionada à vontade castradora de um grupo de políticos, associados à profissionais de algumas classes que o assessora, como no caso, cíclico, dos juristas e de advogados. Porque se assemelham a mercenários, a traidores, a vendilhões da pátria. Sejam eles nacionais ou estrangeiros, são pagos para fazer mal ao Estado quando deveria ser o contrário. E, nalguns casos, também estão por trás dos principais roubos de recursos públicos.
No meio dessa gestão danosa, o Presidente é, sim, o principal culpado do que nos faz mal. Mas existem outros, cuja responsabilização não deve ser ignorada. E o seu julgamento não deve ficar somente pela história. Se um jornalista é mau por fabricar informação de assassinato de carácter, ou por favorecer o poder trajando o fato da militância partidária, o jurista ou o advogado também é mau quando, nas mesmas condições colabora para tornar o Estado cada vez mais refém do MPLA e do Presidente João Lourenço.
Terminado o seu mandato, o que o Presidente João Lourenço deve fazer mesmo, é arrumar as malas e sair. Já não deve ser sua responsabilidade, a eleição de quem o vai substituir, sobretudo na Presidência da República. Ao pretender assumir essa possibilidade, delegando ou influenciando a favor de “quem deve fazer igual, ou melhor” do que supõe que tenha feito, e com tanta certeza, também é a confirmação de que estamos diante de um ente que, politicamente, não é sério nem respeita a ética. E é suspeito da prática de um crime, o de fraude eleitoral, se esse processo beneficiar o seu delfim. Numa só definição, mais ou menos polido, será um golpista.
Pelos sinais que evidencia nas suas entrevistas, não se trata de presunção, mas de (quase) certeza e a máquina se afina para dar seguimento ao projecto golpista. Pena é que, tem muita gente que o rodeia que é menos séria ainda. Houvesse integridade, não contaria com apoio, mínimo que fosse. Mas, como sempre, os juristas e advogados estão na primeira fila para olear os carretos dessa máquina. E o coordenador do projecto, já está agora confortavelmente, acomodado na Assembleia Nacional.
À Carolina Cerqueira, pelo menos da nossa parte, não faltou o aviso oportuno para a necessidade da observância de humildade e respeito aos seus colegas, porque estávamos a ver o seu day after complicado, mesmo com a sua ascensão fulgurante apoiada pelo próprio Presidente da República. Subir mais, são outros quinhentos. E oxalá que seja verdade mesmo, a sua ida para os Estados Unidos da América, porque seria desprestigiante sentar-se agora no plenário, como subordinada do chefe da bancada do seu partido. Passar à reforma seria a melhor opção, mas o medo que se tem do Chefe e da eventual perda de privilégios ou de oportunidade para outra nomeação, é superior à defesa da dignidade. Aliás, a mudança não programada da casa de função lá na zona alta da cidade e a redução de benesses, já constituem grande revés. Mas, são os riscos decorrentes da falta de ética da nossa política, do excesso de poderes de quem chefia e da imprevisibilidade de quem a própria ofereceu serventia. A mesma que valeu para ascensão mediática, como para o rebaixamento com estrondo. Sem filtros.
Mas essa mudança na direcção da Assembleia Nacional, ainda nos trará momentos de grande êxtase. Sobretudo, porque quem na qualidade de ministro de Estado e Chefe da Casa Civil do Presidente da República, se dirigiu aos deputados, os da oposição, como é lógico, com exagerada altivez de jovem bangão ‘bem doptado de intelecto’, como se estivesse diante de alunos ignorantes, vai ter agora que os ‘suportar’ como colegas. E como vai, porque nenhuma das partes se subordinará, embora seja obrigatório o respeito e a elevação institucional, porque na Assembleia Nacional, o Presidente não é Chefe de coisa nenhuma.
Não menos aproposito, recordei-me daquele provérbio: “Deus escreve certo por linhas tortas”.










