No estilo e na forma inadequadas – do meu ponto de vista – de balancear a situação do país, o Presidente diz e perspectiva maravilhas para Angola. Mas para quando, e a que preço estamos a pagar essas promessas?
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Segui atentamente as eleições autárquicas realizadas em Portugal no último domingo. Não fosse a inesperada derrota do Chega, seriam consideradas normais. Mas surpreenderam, sobretudo, porque os especialistas – mais os mujimbeiros que os bons analistas – previa outra performance. Mas o que pareciam favas contadas, tornou-se um revés para os radicais portugueses. Tenho para mim que de nada lhes valerá manterem-se na onda de esquecimento da velha vocação emigrante do seu povo, apostando na patética cruzada contra os imigrantes. Presumo que venham a enfrentar novas dificuldades. Os tempos e as vontades mudam em todo o mundo, cada vez mais rapidamente. O que está contra hoje, pode tornar-se vento favorável amanhã.
A jornada serviu para observar como as tecnologias modernas facilitam o apuramento dos resultados da votação – uma realidade que tarda a chegar a Angola, mas que chegará um dia, sem dúvida – oferecendo créditos firmes à segurança das entidades, à verdade e à legalidade dos pleitos.
Viva a democracia! É o que me apraz dizer. É o que não deixa de clamar a maioria dos tugas. De facto, o poder local é uma bela realidade. Por via dela, o pequeno Portugal cresce, produz riqueza, os concelhos e os municípios desenvolvem-se, o turismo movimenta milhões de visitantes e desempenha papel fundamental na economia. As pessoas vivem melhor com os seus pobres, mas apesar das inúmeras dificuldades, os miseráveis, que também os há, são tratados com algum cuidado e humanismo.
Volto-me para Angola, onde a situação é diferente. Por tudo o que vivemos e conhecemos. As razões são de outro tipo, são de ordem política e estrutural. Uma fictícia democracia corre risco há anos, está praticamente amarrada e, aparentemente, sem meios para se desembaraçar das amarras que a prendem. Por arrasto, a Justiça não cumpre a sua importante missão e o Estado Democrático de Direito dilui-se, não obstante o palavreado demagogo dos que obstaculizam a sua instituição. Estamos em África! Infelizmente, distantes das boas práticas de outros Continentes.
Em Angola há muitos mais pobres, apesar da nossa imensa riqueza. Os miseráveis abundam, de Cabinda ao Cunene. E, no entanto, temos tudo para sermos felizes. Para, pelo menos, não se submeter a população à fome. Fica difícil entender a política e certos políticos.
Nesta semana que passou tive o prazer de apreciar um vídeo que mostra a quem tenha olhos de ver, coisas interessantes. Para além de um aspecto importante do desenvolvimento económico de Angola, divulga também o que se faz e pode ser feito pela cultura do nosso país. Realce para o projecto integrado de dois importantes terminais no Porto do Namibe e a recuperação de uma estrutura cultural de enorme impacto como é o “adormecido” Cine Estúdio da velha cidade. Aplauda-se o gesto patrocinador da gigante Toyota, que brilha numa atitude que deveria ser seguida por outros operadores do mercado económico de Angola.
Ainda nesta semana, o dr. António Costa Silva, um angolano que foi ministro da Economia do governo português de António Costa, concedeu uma bela entrevista ao jornal Expansão, realçando, mais uma vez, as imensas potencialidades do país onde, ao contrário do que se diz, o Governo angolano está a desenvolver trabalho de qualidade. É a mensagem que nos vai chegando e que é reforçada todos os anos quando o Chefe de Estado se dirige ao povo e fala sobre o Estado da Nação. Este ano não fugiu à regra. No estilo e na forma inadequadas – do meu ponto de vista – de balancear a situação do país, o Presidente diz e perspectiva maravilhas para Angola. Mas para quando, e a que preço estamos a pagar essas promessas? Porque se adiam tanto as medidas que vão melhorar, de facto, a vida das populações? Saúde, emprego, escola, o essencial, porque tardam a chegar?
A população exige e, por isso, não há como não se questionarem os seus longos e cansativos discursos marcados pela vaidade das grandes obras em curso. Como não são esses grandes e inacabáveis empreendimentos que darão hoje, agora, já, saúde e comida às pessoas, continuarão a ser questionados enquanto persistirem as dúvidas que nos assaltam acerca da bondade dessas políticas.
Estes factos levantam, entretanto, outras questões. No mau sentido, infelizmente. Por exemplo, a apetência que certas pessoas – especificamente figuras da alta hierarquia política e económica – têm pelo dinheiro. O dinheiro é uma exigência de todas as sociedades, sabemo-lo bem, mas, na nossa bwala as pessoas são capazes de tudo por dinheiro. Embora tenha noção de que essa inclinação não é exclusiva nem de hoje, é milenar, vejo a ânsia de ter dinheiro, de ser rico, a ganhar todos os dias diferentes contornos e a conduzir, cada vez mais, de um modo absurdo, obsessivo e vergonhoso, gente de todas as classes desta triste e confusa sociedade, que no exercício das suas funções e no âmago das suas desmedidas ambições, mostram ter do dinheiro – estou a referir-me àquele que ultrapassa, em quantidade, o que é minimamente necessário para se viver de forma digna – ideia igual a uma exigência enorme e próxima, passe o exagero da comparação, do ar que respiram.
Este é o lado mau do dinheiro. Provoca febres, atrai crises. O vil metal, no seu mais cruel desempenho, atinge a dignidade das pessoas, conduzindo-as a situações incontroláveis, levando-as até à corrupção, ao peculato, ao branqueamento de capitais, a esse conjunto de patifarias que entraram sem licença no léxico da criminologia angolana, do modo cruel que sabemos. No decurso das últimas décadas, obrigaram-nos a identificar à distância, uma classe de criminosos e bandidos que não magoa isoladamente. Mais do que isso, e sob o refúgio da teoria do mal da guerra, têm-se servido da obcecada intenção de serem milionários para tornarem bilionários os seus filhos, escravizando assim a maioria da população. Com os seus (suas) meninos (as) a aceitar risonhamente o desígnio do Destino e a herança de família, vão assassinando o futuro do país.
Um futuro que, na sua perspectiva ambiciosa, não pode acolher o poder local. Dizem não às autarquias. Só podem mandar os que se inscrevem no seu grupo. Não dão hipótese aos seus concidadãos de terem o privilégio de serem votados, escolhidos pelos seus conterrâneos para governar as suas províncias, municípios e comunas, como o fizeram aqui no domingo os portugueses com os seus distritos, concelhos e freguesias, as suas Juntas e Câmaras Municipais, sem que tenham de fugir da mudança como o diabo foge da cruz. Aceitando apenas a alternância promovida pela democracia.
Veremos o que nos trazem de novidades as próximas semanas. Enquanto isso, despeço-me dos meus leitores, amigos e companheiros de luta. Com um abraço, marco o próximo encontro para o domingo que vem, de manhã, à hora do matabicho.
Forte da Casa, Portugal, 19 de Outubro de 2025