A candidata democrata à Presidência da República americana, Kamala Harris, ainda que tenha sido uma Vice-Presidente pouco interveniente no que diz respeito à Administração Biden, podendo assim de certa forma, distanciar-se dos vários erros por este cometidos, era, no entanto, uma interlocutora muito importante ao nível do Senado americano, onde tem a Presidência. A Vice-Presidente Kamala, tomou posse como Presidente do Senado (a cujas decisões o Presidente se submete) a 20 de Janeiro de 2021.
Sendo os EUA um país com pendor presidencialista, a possibilidade da acumulação dos dois cargos está plasmada na Constituição americana. A Presidente do Senado, empossa todos os outros senadores (2 por cada Estado, num total de 100). Nestas eleições, os republicanos tiveram uma dupla vitória, derrotando os democratas quer na Câmara dos Representantes, quer no Senado.
Com o controlo das duas câmaras e de “dois” cargos, já o Presidente Biden tinha facilitada a tarefa para aprovar os seus projectos, (nem sempre populares em termos económicos). O Presidente do Senado preside às sessões legislativas e pode ser substituído por um Presidente “pro tempore” (temporário), não eleito, mas só vota em caso de empate de votos (voto de Minerva).
Nessa base, não nos espantou a grande mobilização de apoios pela Vice-Presidente Kamala Harris em tempo record, (com o valor três vezes superior ao candidato Republicano), ainda que tenha substituído o Presidente Biden já a meio da corrida ao cargo de 47º. Presidente do seu país (por teimosia do primeiro, coartada pelos membros do seu partido).
A Vice-Presidente Kamala Harris, teve uma excelente campanha e um resultado espetacular, mas dificilmente conseguiria melhor resultado que o Presidente Trump, tendo em conta as principais motivações inerentes à cultura da maioria dos cidadãos americanos, dos mais variados extratos da sociedade, nomeadamente:
– Apesar do fetiche do “sonho americano”, a realidade é que os EUA tem 50 Estados (sem contar as colónias do Pacífico e Caribe, sem representação legislativa) e cerca de 335 milhões de habitantes, que precisam de trabalho com um salário condigno para subsistir. Ainda que a Administração Biden tenha inicialmente conseguido reduzir o índice de desemprego, como nesse país o trabalho é sazonal, geralmente sem contrato, houve a infelicidade de, no último trimestre, ter aumentado (ainda que por poucos pontos percentuais) a taxa de desemprego.
– Não foi a tempo, que o Presidente Biden em fim de mandato tenha acenado aos eleitores, a interessante ideia de aproveitar a oportunidade concedida pelo Governo angolano, da criação de mais postos de trabalho (MORE JOBS FOR AMERICANS).
Tem um enorme significado, qualquer exportação de produtos e de serviços americanos, mais ainda, tratando-se da aquisição pelo Estado angolano de carruagens de comboio, de aviões, de equipamento militar e prestação de serviços, por ajuste directo, acrescido do ganho de juros, pela intermediação nas operações de engenharia financeira, para o empréstimo (financiamento) a conceder a Angola. Note-se, que à semelhança do passado, o EXIMBANK americano, irá buscar meios financeiros aos bancos europeus (já assinou acordos com a Presidente da UE, Primeira Ministra da Itália, Chanceler alemão, por enquanto).
– A economia sempre foi o tema mais importante na América, inclusive para os emigrantes, que só por motivos económicos, que afectam a população dos seus países emigraram. Por essa razão, a maioria dos imigrantes votou no Presidente Trump, porque no seu primeiro mandato deixou a economia em alta e evitou despender os recursos internos já escassos em guerras.
Por outro lado, no primeiro mandato também não pôs em prática quase nada do que disse sobre a perseguição aos emigrantes, mostrando assim, que também sabe fazer política, dizendo o que os americanos desempregados da classe média baixa (maioria) querem “ouvir”. Esses, não gostam de trabalhos pesados aceites pelos emigrantes, mas queixam-se que os emigrantes roubam-lhe os empregos.
– Quase todos os comentadores portugueses, sobretudo os que gostariam de ver uma Democrata na Casa Branca, tendem a afirmar que ela não foi eleita por ser mulher, pondo em evidência o machismo dos homens americanos. Não corroboramos com tal opinião, pois somos do parecer, pelo conhecimento ainda que parcial da cultura americana, que os negros americanos (afro-americanos), não nutrem nenhuma empatia pelos emigrantes em geral, pelo motivo atrás referido. Porém, é pior no caso dos negros africanos, a quem eles acusam abertamente, como sendo os culpados por eles carregarem o estigma de serem descendentes de escravos e, por considerarem que os africanos continuam atrasados , no sentido de ignorantes.
– Mesmo o Presidente Obama, que actualmente ainda é considerado o Presidente americano mais popular ao nível interno e externo, teve sérias dificuldades para vencer inicialmente as eleições presidenciais, porque sendo o seu pai negro africano, os negros americanos, liderados pelos congressistas afro americanos democratas, preferiram declarar oficialmente o seu voto a favor de Hilary Clinton, em seu detrimento. Os, afro americanos, também não viam com bons olhos o facto de Obama ser filho de uma americana branca.
Foi necessário, que Hilary Clinton fosse derrotada dentro do seu Partido pela maioria branca, que votou no Obama, para que esta, a pedido do Partido Democrata, após negociar com ele o cargo de Secretária de Estado (Ministra das Relações Exteriores) , com o apoio do marido (Presidente Bill Clinton), convencesse o Cáucaso afro americano democrata, a apoiar o Presidente Barack Obama na segunda volta.
Por essa razão não estranhamos, o facto do casal Obama, provavelmente por influência da mulher, não terem apoiada logo de início Kamala Harris. De recordar, que a esposa de Obama, Michelle, durante uma entrevista com a Oprah, antes do mesmo se candidatar, quando esta lhe perguntou se o seu marido iria candidatar-se à Presidência dos Estados Unidos, respondeu com uma gargalhada sarcástica e com a seguinte frase:
– “Só acredito, quando ele deixar de fumar”. Ela mostrou que não acreditava nas convicções dele, nem que ele deixasse de fumar. Todavia, Obama ganhou as eleições e disse em jeito de piada, que deixou de fumar já após ter ganho e não antes, porque tinha prometido a mulher.
– Os eleitores americanos, também não se esqueceram que Trump começou por acabar com os acordos tarifários celebrados com países asiáticos pela Administração Obama, e subiu as taxas de importação de determinados produtos desses países, para criar mais empregos para os americanos. Contudo, como homem de negócios experimentado e bem-sucedido, soube retroceder no caso da China, quando Xi Jim Ping ameaçou fazer o mesmo, ainda que com o país bastante afectado (queda do PIB).
– O Presidente Trump, para além de ser um cidadão assumidamente da direita, que a comunidade internacional considera radical e por vezes com dificuldade em moderar a sua linguagem, (o que agrada à classe média/baixa que o elegeu), no seu mandato anterior surpreendeu a todos, dialogando por várias vezes com o Presidente da Coreia, um esquerdista radical, e com o regime iraniano, não esquecendo as boas relações, (de interesse puramente económico), que mantém com o Presidente Putin. Estamos em crer, que para ele, Vladimir Putin, será sempre e apenas, um concorrente económico e militar do povo americano a submeter, sempre e quando for necessário e possível.
Biden será ainda assim muito bem-vindo a Angola, país que sempre foi muito importante para os Estados Unidos, do ponto de vista económico e estratégico, mas ainda não é prioritário. Entre a visita à Alemanha e à Angola antes das eleições, o Presidente Biden priorizou a primeira. Não obstante, não nos esqueçamos, que a economia americana chegou a depender de 8% do petróleo angolano. Por isso, a indústria petrolífera americana nunca abandonou o país, mesmo durante o período mais difícil da guerra.
Mais do que uma visita em tempo de reforma, Angola precisa de investimento directo (de facto) americano e não apenas de financiamento caro, porque vem por vias indiretas de financiamento. O IDE só não vai acontecer, porque quem produz quer produzir barato e vender para ter lucro e sobretudo, quer escoar primeiramente os seus produtos e serviços.
Por desgraça, em termo dos diferentes critérios necessários para melhorar o ambiente de negócios, visando a atração de investimento privado para Angola, só existe um único aspecto excelente para os estrangeiros, que é o facto da legislação permitir, que venham de “mãos a abanar”, podendo aceder ao crédito interno e exportar dividendos, ainda antes de produzir nada. Os investidores “estrangeiros”, quando não são eles próprios (DTT), são os seus “testas de ferro”.