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Morreu Luís Alberto Ferreira, o decano do jornalismo angolano. O Reginaldo deu-me a notícia em primeira mão, e o Artur Queiroz, logo a seguir, fez circular um texto que, lamentando a ocorrência, recordou, em traços largos, o seu digno e invejável percurso. Falou de coisas que eu não sabia e não deixou de mencionar o livro sobre Nino Vieira, a que LAF se dedicara intensamente (revelou-me isso o finado, em dado momento da nossa convivência).
O retrato tirado por Queiroz revelou que era o nosso mais antigo profissional em actividade. Sem dúvida, fez uma foto bonita. Em bom plano, apanhou aquele que foi superior oficial da boa escrita jornalística, o enorme repórter que tive a felicidade de conhecer e me deu a subida honra de com ele lidar. Aquele a quem tive o gosto de, em vários momentos, testemunhar a minha enorme admiração. Informando-o de que ela vinha dos tempos em que eu, jovem viciado na leitura das notícias desportivas, sem conhecimentos que valessem, já o considerava um mestre da elegância da escrita. Lembro-me ainda duma entrevista feita ao craque Jorge Mendonça, um luandense que brilhava no futebol espanhol, primeiro no Atlético de Madrid, tornando-se mais tarde estrela no Barcelona.
LAF era uma espécie de Petróneo que, não sendo romano, era ilustre filho dos Coqueiros, adepto do Escola, feito um centurião do exército dos melhores da crónica e reportagem desportiva dos anos sessenta, na Península Ibérica.
Orgulho-me de ter conseguido – não consigo recordar como o fiz – a colaboração do autor de “As Subesferas”, título genérico de uma crónica regular que assinava no Jornal de Angola, a colaborar no meu sonho de jornal cultural. Os leitores de “O Chá”, lembrar-se-ão certamente da sua passagem pelo mensário que criei, onde emprestou, nos poucos números que deram curta vida ao sonho, o perfume da sua prosa sem igual.
Perdi-lhe o rasto sem explicação. Deixou de atender o telefone. Senti-me desanimado com a sua ausência. Talvez não tenha feito o suficiente para o encontrar. Fica-me agora o desgosto que já nada vale. Apenas a lembrança, quando olho para a pequena caixa de charutos havanos prometida quando da minha última viagem a Cuba, de onde regressei precisamente no dia em que faleceu Fidel Castro. Guardarei a caixa para lembrar-me sempre do amigo e mestre em que se tornou o Luís Alberto, e imaginar o que me diria ao almoço que marcaria o nosso reencontro (comia sempre salmão grelhado e não perdia a oportunidade de lembrar Nicole Kidman, a sua actriz de eleição, expressão do seu fino gosto). Aqui fica o meu tributo nestas simples palavras, plenas de significado. Até sempre, querido amigo!
E porque Queiroz, lembrando LAF no seu escrito, fez desfilar na minha memória uma plêiade rara de jornalistas angolanos, não posso deixar de pensar, com algum desânimo, no actual momento do jornalismo angolano. Refiro-me ao chamado jornalismo oficial. Onde o nome de Luís Alberto dificilmente será referido porque não têm referências dele nem de muitos outros que fizeram e ainda fazem escola. Nas suas bancas não se criticam atoardas dos que mandam e dá-se primazia a notícias esquisitas. “Funcionários públicos vão passar a ser avaliados duas vezes ao ano”. Avaliados por quem? Os Ministros serão avaliados por quem?
É difícil o momento que os angolanos vivem. Não podem deixar de ser recordados os recentes episódios protagonizados pelos que se resguardam da mentira, protegendo-se por via de notícias recheadas de falsidades. São raras as que conformam a realidade da vida que os angolanos vivem.
Sou obrigado a aceitar que onde não abundam as boas novas, vive-se com a sensação de que as notícias nos chegam sempre com uma mostra do seu lado mais trágico. Resultado da onda de violência que vai assolando o nosso país, os muitos que, como eu, se encontram distantes, vivem essa terrível angústia. Andamos com o coração nas mãos à espera do melhor, mas esperando sempre o pior. Com os mais crentes a aceitar de ânimo igual tudo o que Deus quiser (tal como o expressava o jornalista João Charulla de Azevedo no cabeçalho da capa do “Notícia” do outro tempo).
E no meio dessas notícias, das que correm sem licença e das que buscam a verdade no fácil acesso dos celulares e de todos os meios de comunicação que temos à disposição, surgem os impactos que causam males à nossa saúde mental. Mas vão caindo com peso estrondoso as que não deixam dúvidas sobre as causas que fazem a vida e a morte das pessoas em Angola.
Os angolanos, cada vez mais experimentam essas tenebrosas sensações. Aguardam ansiosamente, as notícias. Anseiam pelas melhores, caiem-lhes constantemente as piores. Que nos levam a pensar se estaremos no culminar de desgraças há muito anunciadas.
E no meio dessa angústia multifacetada, lembro-me uma vez mais do Luís Alberto Ferreira. Não tenho possibilidade de ir ao seu funeral. Falei com a sua sobrinha Graça a quem manifestei o meu pesar. Pedi que desse cumprimentos à família, especialmente à filha. Até sempre, estimado amigo!
Despeço-me dos meus leitores. Estaremos juntos no próximo domingo, à hora do matabicho.
Fernão Ferro, Portugal, 3 de Agosto de 2025
Very interesting subject, appreciate it for putting up.