(a propósito da ignorância e da vã glória do poder)
JAcQUEs TOU AQUI!

Esclarecendo: Considero-me um tipo de boa memória. Não obstante, volta e meia falham-me lembranças. Mais de nomes do que de factos. Hoje quero lembrar-me do nome de um alferes do exército português, esforço-me e desconsigo. Naquele tempo em que fiz tropa e o conheci, raramente se via um oficial negro entre os militares portugueses. Esse que tento identificar era branco, mas natural do Lobito. O suficiente para me parecer diferente dos outros. Comandou por curto tempo o pelotão do Cassai da 4ª. Companhia (VH) do Regimento de Infantaria de Luanda, sedeada na Lunda (Henrique de Carvalho). Ao lembrar o homem, recordo que utilizava bastante a expressão que faz a epígrafe deste artigo, um desabafo decente, não em linguagem boçal, como poderá parecer que fosse. Distante do vernáculo e com o devido respeito, também a utilizarei neste texto.
No caso do alferes, quando indignado ou sentindo-se enganado, chateado ao impingirem-lhe absurdos, a bronca saía-lhe naturalmente da boca, na versão mais pura. Não me copules, não me copulem, em qualquer tempo verbal, as palavras brotavam recorrentemente, evitando sempre o vergonhoso vernáculo.
Explicando: Ando há semanas pensando se devia ou não abordar aqui este delicado tema. Em consciência, concluo que sim, que devo fazê-lo agora em que chega ao fim a última etapa da outorga de medalhas com que muitos cidadãos foram ou serão agraciados pelo Governo angolano, por ocasião dos festejos dos 50 anos da Independência Nacional. Assim sendo, vou utilizar em expressões sinceras e espontâneas, tudo o que, entre erros e omissões e sem necessidade nenhuma, ensombrou a festa das condecorações, a manifestação que era suposto orgulhar todos os angolanos. Registo, assim, a minha visão sobre o acontecimento:
Não foi, em meu entender, a maneira mais elegante, aquela que os actos exigiam, o modo como foram anunciados ao público, os nomes das personalidades agraciadas com as condecorações. Relegando para plano secundário o estrito cumprimento, ou a falta dele, da Lei que rege estas inéditas condecorações, revelou, todavia, e desde a primeira ronda, entre o mais, uma falta de cuidado impressionante. Foram notados, nesse particular aspecto, vários atropelos e, decididamente, alguma falta de critério, total ausência de cuidado. Digamos mesmo que, em determinadas ocasiões, houve falta de respeito. Explico. Nas primeiras indicações, pareceu-me ter faltado o cuidado verificado nesta última comunicação ao público. Acomodar no mesmo lote, em lista única, os nomes de insignes figuras da política mundial exigia-se. Era necessário na verdade. Por isso, reconheço que se esteve bem, agora na derradeira convocatória.
Lamentavelmente, nas anteriores situações, a promiscuidade foi visível e dificultou até saber-se quem era quem o cidadão ou a entidade e por que razão teria sido distinguido (a). Demonstrarei o que afirmo, recorrendo a um exemplo vivo e indesmentível. Porque foi condecorado o cidadão Jacques Arlindo dos Santos e não a Associação Cultural e Recreativa Chá de Caxinde? Apesar de Jacques Arlindo dos Santos (que somos nós, como dizia alguém) ter desempenhado um papel importante, foi a agremiação que registou no seu currículo, e num período superior a trinta anos, um conjunto de actos importantíssimos no domínio da cultura nacional. Escuso de enumerá-los, por serem por demais conhecidos pela sociedade, portanto, difíceis de serem esquecidos. O cidadão (que somos nós) representava, isso sim, um universo de mais 800 cidadãos, associados efectivos, oriundos das mais variadas classes sociais da nossa sociedade e que, sob sua liderança, deram um valoroso contributo à cultura nacional, em actos como:
1) salvação da ruína de uma relíquia do património cultural, o Nacional Cine-Teatro; 2) determinante presença na transformação do Carnaval de Luanda; 3) realização do Primeiro – e até agora único – Encontro Nacional de Escritores Angolanos.
A enumeração destas três de inúmeras e importantes actividades realizadas no país, que contribuíram para enriquecer os feitos da Chá de Caxinde, num passado feito de transparência, dignidade e de amor à causa cultural angolana, não marcam por si só, um percurso repleto de dificuldades que ninguém conseguirá ofuscar, por maior que seja a força dos que tentam diminuir o valor da sua obra e o seu inegável e reconhecido prestígio. Nestas circunstâncias, e mesmo que seja certo o meu envolvimento pessoal em muito do que foi realizado, é mister que se questione. Quem deveria ser condecorado?
Na mesma linha de pensamento, menciono a ENSA, empresa que durante anos foi monopolista da actividade de seguros em Angola, uma entidade que ajudei a criar, integrado que estive numa das equipas que se encarregou do processo de reconversão do sector de seguros na altura da independência nacional. Importantíssima e honrosa tarefa se se tiver em conta a importância que os seguros têm em qualquer sociedade, e principalmente em sociedades como a nossa. Não questionando a sua importância na vida económica e social do país porque ela é por demais conhecida, não deixo de referir o facto de, ao lembrarem-se dos nomes dos que ergueram o país nos vários domínios, se ter olvidado, entre alguns outros, nacionais e portugueses, o de Leonel de Jesus Serra, o primeiro director-geral da ENSA, e também de Aleixo Augusto que o substituiu no cargo. Erro imperdoável, quanto a mim.
Volto à carga, perguntando. Afinal de contas, quais foram os critérios que presidiram a este como a outros casos que integram este incrível desfile de falhas e omissões? Só poderá ser desconhecimento ou então flagrante descuido. São, nalguns casos, de tal modo visíveis as lacunas da desorganização que chega, por vezes, a roçar a linha limite do aceitável.
Entre as críticas que justificadamente se fazem, realçam-se os nomes dos condecorados a título póstumo se misturarem com os de gente que ainda não morreu. Porquê? Custava alguma coisa separá-los em listas distintas, evitando, inclusivamente, a aproximação com alguma gente muita “viva” que conseguiu ser contemplada? Daquela que recebe medalha sem se saber porquê, por vezes e até, diz-se isso, a pedido de algumas famílias. Enfim, num processo em que os distinguidos são em grande número músicos, djs, agrupamentos musicais, dançarinos, chega-se à conclusão de que este é o país dos bons costumes. Da igualdade, da euforia e da alegria. Constatado o facto, e pedindo desculpa aos portadores de ouvidos mais sensíveis, grito bem alto, no mesmo jeito que o fazia o alferes natural do Lobito. “Não me copulem, meus senhores”!
Acrescentando ainda: Haja mais respeito pela memória dos que partiram, pela maioria dos medalhados e, sobretudo, pela Pátria Angolana!
Cumprimento os meus leitores, os amigos e companheiros de luta. Despeço-me de todos com o desejo de novo encontro no próximo domingo, à hora do matabicho.
Forte da Casa, Portugal, 2 de Novembro de 2025











Feliz Domingo Caro e Prezado Compatriota Jacques Arlindo dos Santos,
Desejo que esteja bem como Família também. Sou leitor de todas as pertinentes e transversais Reflexões que faz . E os exercícios de Memória são necessários ao Dever de Olhar a Nação que amamos. Em 37 milhões que somos de acordo com os últimos Censos, muitas pessoas e Instituições foram esquecidas . A legitimidade de Condecorar não deveria apagar tantas Mulheres, Homens e Jovens que deram e dão o seu contributo à Pátrias Amada. Recentemente a CEAST realizou em Luanda uma Conferência sobre a vital importância da Reconciliação Nacional. Uma importantíssima Reflexão. E o problema central é que não estamos Reconciliados e o Valor Sagrado da PAZ não é com pureza sentido. As divergências são profundas. A União é um vazio entre muitos Compatriotas. O
Diálogo necessário e emergente em todas as Latitudes não acontece dentro e fora do País entre as Comunidades Angolanas. Oxalá nasçam renovadas Acácias Rubras para que o Sonho da construção da Nação justa nasça e perdure no Tempo. Um Abraço e Feliz Domingo.