ZOOM DA TUNDAVALA
O que estará errado? Por que é que tais ideias luminosas nunca dão certo e, qual candeia sem azeite, se apagam sem sequer terem iluminado o que quer que seja? Há certamente algo de errado…
Há muito tempo, tanto quanto de independente tem o país, se fala da exclusão escolar. O fenómeno não é novo e, quem nunca ouviu falar dele, das duas, três: ou esteve sempre distraído, ou o assunto nunca lhe interessou. Desde os primórdios que o tema não perde actualidade e, na exacta medida em que se prolonga no tempo, cresce o número de crianças em situação de exclusão escolar, a tal ponto que, hoje em dia, o número anda pelos quatro milhões de crianças fora do sistema de ensino, a acreditar nos dados oficiais. Naquela altura, naqueles tempos primitivos do fenómeno, falava-se em qualquer coisa como sessenta mil crianças fora do sistema de ensino, e já era assustador. Hoje, o número de excluídos do sistema escolar é tão elevado que parece já não assustar ninguém. Pelo contrário, até dá a impressão de servir de “petisco” para satisfação de outros apetites.
Quanto mais tempo passa, maior será o número de afectados pela “doença”, qual pandemia sem fim à vista e, o número de excluídos pelo sistema, crescerá na mesma dimensão dos esquemas que vão continuar a alimentar soluções para “combater” a exclusão escolar.
Durante estes 50 anos, perdeu-se a conta das reuniões, fóruns, seminários, palestras, conferências, todas essas acções que mais não foram que motivos para juntar a malta à volta de beberetes no final de todos eles, enquanto os excluídos, a verdadeira origem das “patuscadas” foram sempre aumentando. De cada vez que se vai para uma dessas “farras”, os números estão sempre alterados para mais, evidentemente. Debatem-se novas soluções porque as anteriores não serviram, não resolveram o problema. A prova de que as soluções, sempre luminosas, gisadas em todos esses fóruns, falham redondamente, está no estrondoso aumento de crianças fora do sistema de ensino.
O que estará errado? Por que é que tais ideias luminosas nunca dão certo e, qual candeia sem azeite, se apagam sem sequer terem iluminado o que quer que seja? Há certamente algo de errado. Aparentemente, a causa de tantas e estrondosas falhas pode estar no facto de se pretender resolver o problema da exclusão escolar, isolando as muitas causas que a originam, em vez de serem tratadas de forma integral porque, na verdade, são muitas as variáveis a ter em conta.
Sem a pretensão “dar lições” a ninguém, e muito menos a “iluminados”, algumas pesquisas, e os conhecimentos adquiridos, afinal estão a ser 50 anos sempre a aprender, permitem saber que a exclusão escolar nada mais é do que afastamento de crianças e jovens do sistema de ensino, de forma temporária ou permanente, sendo o fenómeno ocasionado por diversos motivos, que podem estar relacionados com barreiras sociais, económicas, culturais, de saúde ou do próprio sistema se ensino.
Entre as principais causas da exclusão escolar, encontram-se: a probreza, logo, as condições económicas,geralmente associada à falta de recursos, que conduz à fome, o que leva muitas famílias a priorizarem o trabalho infantil à educação porque, mais duas ou mais mãos na enxada ou a pastar cabritos, por exemplo, acabará por ser mais vantajoso para a família.
As falhas no sistema de ensino, como a falta de escolas, ou escolas pouco funcionais, sem carteiras, p.ex., a falta de professores, ou ainda a localização das escolas que muitas vezes obriga as crianças a terem de percorrer longas distâncias, também podem levar ao abandono escolar.
Quando se aponta as falhas no sistema de ensino, fala-se obviamente de muitos aspectos envolvidos. Tem havido a construção de muitas escolas pelo país afora, sim, sem dúvida. Pode-se dizer que o investimento público nesse domínio tem sido grande, sem que seja significativo, no entanto. Porém, ao mesmo tempo que se constroem escolas novas, outras vão-se degradando e sendo votadas ao abandono, do que não faltam exemplos por todo o país, começando por escolas outrora importantes mesmo na capital, que hoje são verdadeiros “caganóis” a céu aberto, lixeiras, e antros de delinquência, das quais muito se tem falado e se têm exibido provas até nas redes sociais, fórum onde ainda é possível expôr estas situações com liberdade. No entanto, e apesar desse suposto investimento em novas escolas e consequente aumento de salas de aula, questões em torno do funcionamento delas têm sido trazidos à ribalta sem que as coisas aparentem sequer estar a melhorar e, ora se fala da falta de carteiras, ora do não funcionamento de casas de banho, a falta de água é endémica… e não faltam imagens, provas factuais, de crianças a ter aulas debaixo de árvores, sentadas em banquinhos de pele, pedras ou latas, ou em salas de aula improvisadas.
A falta de professores bem formados e motivados, é outro busílis do sector, que vive a braços com problemas de toda a ordem onde, a colocação de professores, muitas vezes em locais onde nem sequer o diabo imagina, sem transporte, tendo de alugar casa onde morar, tendo de suportar encargos dobrados porque a família, onde ficou, também tem de comer e ainda por cima é mal remunerado são, indubitavelmente, factores que contribuem para a falta de motivação destes profissionais, concorrendo também para a expansão do fenómeno.
A prometida gratuidade de livros escolares não passou de miragem e não vão ser as crianças em exclusão escolar que vão receber livros gratuitamente. É para esquecer.
Sem que sejam as únicas, acredita-se que deva ser em torno destas causas que muito se tem debatido, que muitas e variadas tenham sido as soluções ou os caminhos apontados para a desejada solução deste mal de que padece a sociedade.
Naquelas “discussões” certamente “acaloradas” e “entusiasmadas”, também se tem falado certamente que, o problema do abandono escolar, se calhar, se deve ao facto das crianças irem para a escola sem comer, com fome. Pronto, bastou alguém tocar no assunto e pimbas: “vamos lá resolver isto com um programa”. E como por cá, só se fazem coisas com programas, concebidos nos gabinetes da capital, lá saiu o da Merenda Escolar, muito bem pensado para atender a essa necessidade das criancinhas, só que todos se esqueceram do que viria a acontecer mais tarde: directores de escolas, das poucas contempladas pelo programa, começaram a levar o “lanche” das crianças para casa e as criancinhas continuaram sem merenda. Soaram os alarmes e: “temos que resolver este problema, o melhor é atribuirmos então a verba da merenda escolar a alguém de faça chegar o lanchinho diário às crianças”, ter-se-á equacionado depois de algumas outras soluções falhadas e, de carrinho, entregou-se o programa da merenda escolar a uma entidade com bom-nome e reputação. Mas, se andarmos aí pelas escolas do país, onde as crianças mais precisam, por aqueles lugares onde nem estrada há porque o caminho é mesmo feito a pé, (Sassa, Canjole, Epomba, Mussongo, Cuilo, Capele, Gando, Calonga, quem sabe onde ficam?) onde nem de carrinho o lanche chega, provavelmente se dirá que a verba não tem sido atribuída. Então se não tem verba não tem programa. Acabou.
Neste início de ano, fomos brindados através de uma das televisões públicas que passou uma entrevista, uma conversa, uma conferência de imprensa, sabe-se lá o que foi, de onde foi extraída esta imagem que circulou nas redes sociais, com a respectiva nota de rodapé que, tendo certamente merecido aplausos, despertou também, e muito naturalmente, outras curiosidades, não tanto pela notícia em si, mas pelas muitas interrogações que ela suscita.
Estará esta ideia luminosa e brilhante, relacionada de alguma forma com a exclusão escolar? Pelo menos é expectável que sim pois não é visível outra razão para um anúncio de tamanha importância. Basta ligar as pontas para presumir que assim seja.
Vamos lá ver então: segundo o Mi(ni)stério da Educação, “ALUNAS DO 1º CICLO VÃO RECEBER SUBSÍDIO ESCOLAR”. Assim mesmo, como documenta a imagem. E não podia ser melhor. A curiosidade matou o gato, e faz querer saber:
– Porquê as alunas e não os alunos, rapazes incluídos? Ou foi só mais um erro de legandagem?
– Quais os critérios de eligibilidade?
– Alunas de que escolas? Do país todo, ou só de algumas?
– O subsídio vai ser entregue aos pais das meninas, tipo “kwenda”, ou a elas mesmo?
– O subsídio vai ser em espécie, bufunfa na mão, ou vai assumir outra forma?
– O subsídio vai servir para quê? Para comprar livros que deviam ser gratuitos, ou para pagar a merenda escolar que elas não sabem sequer o que é?
– Qual vai ser o montante do subsídio?
– Qual será a periodicidade do subsídio? Mensal? Trimestral? Anual? Uma vez na vida? Ou só promessa?
– Qual será a duração do “programa”?
– Que garantias existem de que ninguém, além das próprias alunas, sairá a ganhar com este subsídio? Ou, por outras palavras, que garantias há de que o subsídio não vai ser um sucesso apenas para o Mi(ni)stério da Educação?
Respostas a estas e outras curiosidades, precisam-se mass, que sejam assentes em pressupostos válidos, credíveis, sólidos e convicentes para que não se pense que não esteja na forja mais um daqueles “programas”, muito bem elaborados mas que, à cabeça, tem muito para “desconfiar”. Gato escaldado…
Não há dúvidas de que o problema da exclusão escolar, do abandono escolar, seja lá o que for, preocupa governantes e governados e, sendo um um fenómeno muito relacionado com outros males da sociedade, é certo que as soluções deverão ser integradas, não se devendo isolar cada parte do fenómeno, sendo desejável que tais soluções sejam sérias, responsáveis, consistentes, exequíveis, e possam ser correcta e livremente escrutinadas, para que a sociedade possa aferir a execução, e permitir a verificação e mensuração dos resultados.