ANGOLA, O REINO DAS RIQUEZAS INVISÍVEIS

SAMPAIO JÚNIOR*

Angola é, sem dúvida, um país abençoado pela natureza e amaldiçoado pela governação. Riquíssima em minerais diamantes, petróleo, ferro e ainda agraciada com depósitos de cobre, manganês, mica, fosfato, chumbo, estanho, ouro, prata e platina, parece ter tudo para ser uma potência. Porém, em cinquenta anos de independência, ninguém soube explorar tamanha fortuna com parcimónia ou decência. A natureza brindou o país, mas os homens encarregaram-se de a espoliar.

O país continua a viver com picos de pobreza vergonhosos, fruto de uma governação que parece ter aprendido economia nas páginas de um manual de ficção. Fala-se em “estratégias do sector mineiro” e “criação de mais-valias para os angolanos”, mas o povo, coitado, continua a viver ‘male’ e mal. O Capital Humano que devia ser a alma do progresso, foi relegada a nota de rodapé na história do MPLA, como se o desenvolvimento se fizesse com discursos e não com dignidade.

As causas da pobreza são de manual: corrupção endémica, ineficiência governamental e uma economia que gira ao ritmo dos barris de petróleo e dos caprichos de uma elite que vive entre Luanda e Lisboa. Enquanto isso, a agricultura outrora espinha dorsal da nação, foi transformada em passatempo de conferência. Os “iluminados” do sistema, com créditos generosos, preferiram erguer vivendas em condomínios de luxo ao invés de erguer celeiros.

O ministro dos Recursos Minerais, Petróleo e Gás, Diamantino Azevedo, inaugurou recentemente a Conferência Internacional de Minas de Angola (AIMC 2025), sob o lema: “Reforçar as Oportunidades de Investimento Mineiro a Nível Global em Angola”.

Tudo muito bonito parece até que vivemos na Suíça africana. O ministro assegurou que o Executivo está comprometido com um sector mineiro “sustentável, competitivo e internacionalmente referenciado”. Oxalá o compromisso não morra no papel, como tantos outros.

Desde 2020, anunciou-se um novo “Modelo de Governação do Sector Mineiro”, separando funções políticas, concessionárias e operacionais. Criou-se a Agência Nacional de Recursos Minerais, símbolo máximo da transparência prometida. Mas, na prática, as minas continuam a dar riqueza a uns poucos e miséria aos mesmos de sempre.

A teoria é luminosa a prática, uma mina de desilusões.

Em 2024, Angola atingiu um feito “histórico”: 14 milhões de quilates de diamantes brutos. As minas de Luele e Catoca brilham, mas só nos relatórios. Nas lundas, o povo vive na penumbra da pobreza. Os diamantes saem em jactos privados, e a miséria fica firme e reluzente. As multinacionais correm atrás do ouro e do cobre como moscas a volta do mel. A nova mina de Tetelo é o troféu da vez, 305 milhões de dólares investidos, 4 mil toneladas por dia, e uma promessa de desenvolvimento que há de chegar no próximo milénio.

Diz-se que 70% dos trabalhadores são angolanos. Esperemos que não sejam também 70% dos mal pagos. A região mineira, com história desde 1937, renasce com pompa e marketing afinal, é preciso que o mundo saiba que Angola está “aberta ao investimento”, ainda que continue fechada ao bem-estar do seu povo.

O ministro voltou ao púlpito para anunciar “valorização local dos minerais”, “produção de silício metálico” e “planos para o polissilício”. Tudo soa futurista, quase espacial. Fala-se até em fábricas de fertilizantes, projectos de joalharia e refinarias de ouro. Uma maravilha! Só falta resolver o detalhe de que, nas aldeias, falta água, luz e pão.

Na era da digitalização, foi criado o Cadastro Mineiro Digital de Angola (CMA) plataforma moderna que promete “eficiência e transparência”. Seria perfeito, se não estivéssemos habituados à transparência selectiva, transparente para investidores, opaco para o povo.

E assim se faz Angola moderna, um país de discursos dourados e realidades enferrujadas.

Enquanto os relatórios falam de quilates e milhões, as famílias falam de fome e desemprego. O petróleo continua a jorrar, mas só para os bolsos certos, pois as empresas estatais, Sonangol e Endiama, continuam a ser cofres de segredos e cabides de compadres.

O resto do país, esse, continua à espera que um dia as riquezas deixem de ser invisíveis para quem vive sobre elas.

Enquanto isso, o povo cava não para encontrar cobre, mas para enterrar a paciência. E, ao ritmo em que vão às coisas, o único minério que restará em abundância será o da resignação.

*Em Benguela

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