ZOOM DA TUNDAVALA

Lembrar Novembro é recuar… recuar… cinquenta anos, para ouvir histórias vividas e nunca contadas, ou ditas e lembradas apenas em rodas de amigos. Histórias esquecidas no tempo, mas guardadas na memória de muitos jovens, os sobreviventes, os vivos, daquele Novembro, hoje todos com o cabelo pintado de branco, rosto enrugado pelo tempo da idade, exibindo as cicatrizes da vida.
Lembrar Novembro é, primeiro, e por dever moral, honrar a memória dos milhares de jovens anónimos, esquecidos das páginas da história e de histórias nunca contadas, que entregaram a vida por um ideal: a independência. É não esquecer os miúdos que ficaram pelo caminho em Ondjiva, na Cahama, em Catengue pela defesa de Benguela contra a invasão dos karkamanos, no Bocoio, no Balombo ou em qualquer outro lugar desta imensa Angola. Esquecidos na história, sem honrarias nem medalhas, mas presentes na memória de quem viveu os momentos tormentosos e turbulentos que antecederam a data. É lembrar aqueles dias infernais em que as balas cruzavam os céus em toda a parte deste imenso e belo país, porque ambições outras se cruzaram no caminho dos angolanos.
Lembrar Novembro é trazer à tona as promessas prometidas de liberdade. Sim, liberdade de escolha da camisola que cada um quisesse vestir mas, cujas cores foram, já nessa altura, e repetidas vezes ao longo do tempo, motivo para os angolanos se matarem. Por causa da cor da camisola. Famílias ficaram destroçadas porque as cores não condiziam. E foi assim que os angolanos se puseram uns contra os outros. Por causa da cor da camisola. Afinal eram ideologias diferentes, cujas diferenças geraram antagonismos, ódios, vinganças… morte e destruição. Criaram-se enredos para atacar uns e outros. Porque uns comiam criancinhas e outros até eram comunistas ou aliados disto e daquilo. “Legitimava-se” a ideia de que ser ideologicamente diferente, vestir camisola diferente, era perigoso, e os perigos tinham de ser combatidos, ainda que o preço a pagar fosse a eliminação do perigo, à bala.
Lembrar Novembro é também lembrar as vagas de refugiados que iam de um lado para o outro, em busca de tranquilidade, com medo da guerra. Zombies vivos. Muitos milhares foram levados para a “terra do colono” por uma ponte aérea nunca vista, que serviu para esvaziar o país, e tirar daqui homens e mulheres, quadros, empreendedores, que poderiam ter dado um contributo enorme e valioso ao país que estava para nascer. Uns voltaram, mesmo antes da independência ter sido proclamada, porque afinal só tinham ido para a “terra do colono” para fugir da morte, e o chamamento da Mãe Pátria os trouxe de volta. Porque sentiram e sabiam que faziam falta!
Lembrar Novembro, é lembrar as três proclamações da independência, porque Alvor tinha dito que os três deviam repartir o poder, e não disputá-lo à bala. Alvor que não foi cumprido e, apenas uma, a proclamada na capital, foi reconhecida pelo mundo, um processo que terminou um ano depois, com a admissão formal de Angola como membro das Nações Unidas.
Lembrar Novembro, é lembrar jovens que, à revelia dos pais, marcharam para assistir à proclamação, com o ideal da independência à frente, e agarrados a um sonho: ter País.
Lembrar Novembro é lembrar sonhos sonhados mas nunca concretizados, apenas presentes na memória de quem sente que já não tem tempo para sonhar!











