A CORAGEM DE ABRIR O DEBATE SOBRE A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL EM ANGOLA

Dedicado a um amigo talentoso jornalista, cuja inquietação crítica é, em si, uma forma de resistência e de esperança.

POR LAZARO CARDENAS

Há momentos em que o discurso público precisa de alguém que, com sensatez e coragem, inaugure uma conversa essencial para o tempo em que vivemos. A recente intervenção do Reginaldo Silva, intitulada “Eu tenho medo da Inteligência Artificial”, realizada a convite do jornal Expansão, é um desses momentos. Pela primeira vez, o jornalista, analista e pensador angolano levou ao espaço público, uma reflexão directa sobre os desafios e as implicações da Inteligência Artificial (IA) no contexto nacional — uma conversa que o mundo já vem travando, mas que em Angola ainda dá os primeiros passos.

Atitude de coragem intelectual

Falar sobre IA diante de um público atento e diversificado é, antes de tudo, uma atitude de ousadia. Porque o tema, está envolto em mitos, tecnicismos e inquietações, exige não apenas informação, mas também sensibilidade para dialogar com as ansiedades do público. E o Reginaldo fez isso com honestidade — assumindo o medo como ponto de partida. Essa postura aproxima o orador das pessoas, torna o discurso humano, emocional e acessível, sem se perder na abstracção técnica que muitas vezes domina o debate sobre tecnologia.

O “medo” como ponto de partida

Ao dizer “tenho medo da Inteligência Artificial”, o Reginaldo não adopta um tom derrotista; antes, revela uma preocupação lúcida e ética. O medo, neste caso, é o reconhecimento dos riscos que acompanham qualquer revolução tecnológica: o desemprego estrutural, a manipulação informacional, a perda de privacidade, a substituição de competências humanas por algoritmos. Mas o medo, quando bem canalizado, também é motor de vigilância e de responsabilidade. Ele obriga-nos a questionar: quem controla a IA? A serviço de quem ela trabalha? Que tipo de sociedade queremos construir com ela?

A relevância do contexto angolano

O mérito maior da intervenção está, talvez, em situar a questão no contexto angolano. Angola, como muitos países africanos, enfrenta o duplo desafio de incorporar as novas tecnologias enquanto ainda luta por universalizar o acesso à educação digital e à infraestrutura tecnológica. Debater IA num país aonde parte significativa da população ainda está a entrar no século digital, é um ato político e cultural.

O Reginaldo entende isso — e, ao trazer o tema ao público da Expansão e da Rádio Ecclésia, cria uma ponte entre o jornalismo tradicional e o futuro tecnológico. Coloca a IA não como um luxo de países desenvolvidos, mas como uma realidade que também moldará o trabalho, a comunicação e a democracia em Angola.

O papel do jornalismo nesta transição

Como jornalista experiente, o Reginaldo toca num ponto crucial: a relação entre a IA e o jornalismo. Hoje, algoritmos já escrevem notícias, seleccionam conteúdos e moldam a opinião pública. As redacções enfrentam o dilema entre eficiência e veracidade, entre velocidade e ética. Trazer essa reflexão ao público é um serviço de esclarecimento e uma advertência à própria classe jornalística.

A Inteligência Artificial não é somente uma ferramenta — é um novo actor no ecossistema da informação. E se os jornalistas não compreenderem o seu funcionamento, acabarão por ser conduzidos por ela.

Entre o alerta e a esperança

Ainda que o discurso tenha um tom de alerta, contém em si, uma semente de esperança: a de que Angola use a IA para o desenvolvimento social e humano, não somente como importadora de tecnologias, mas como produtora de conhecimento e de pensamento crítico. O medo, nesse sentido, é pedagógico: desperta o cuidado e a consciência ética necessários para o país avançar com prudência e soberania digital.

Considerações finais

A fala do Reginaldo não é somente um testemunho pessoal — é um convite à reflexão colectiva. O que ele fez foi abrir a primeira porta de um debate que Angola precisa travar urgentemente. Agradecer ao Expansão e ao seu director João Armando por essa iniciativa, é reconhecer que a imprensa ainda é o espaço natural da discussão pública e do pensamento livre.

Num tempo em que a Inteligência Artificial avança mais rápido que a nossa capacidade de compreendê-la, vozes como a do Reginaldo tornam-se indispensáveis. Ele lembra que o jornalismo, quando é feito com lucidez e coragem, continua a ser uma das mais poderosas formas de inteligência humana.

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